Ciência

Cientistas brasileiros querem usar CRISPR para evitar avanço da doença de Chagas

Pela 1ª vez, pesquisadores utilizaram edição de genes por CRISPR para alterar características do bicho barbeiro, vetor da doença de Chagas
Inseto: Wikimedia Commons/ Reprodução

Vetor da doença de Chagas, o bicho barbeiro é o principal alvo para controlar a disseminação da condição. Além dos métodos tradicionais, como uso de inseticidas e repelentes, pesquisadores acreditam que a edição genética com método CRISPR pode facilitar o combate ao inseto.

Dessa forma, uma equipe de cientistas do INCT-EM (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Entomologia Molecular) passou os últimos anos buscando maneiras de fazer isso. E, ao que tudo indica, conseguiram.

Em novo estudo publicado na revista The CRISPR Journal, os pesquisadores demonstraram que é possível fazer alterações genéticas no vetor da doença de Chagas, ainda que as mudanças testadas não tenham propriamente o objetivo de combate do inseto – por enquanto.

“Nós somos o primeiro laboratório no mundo que consegue editar o barbeiro. Mas a gente teve que se preparar bastante, aprender várias coisas sobre o inseto para tentar chegar nesse ponto”, explica a doutora em biofísica Helena Araujo, do INCT-EM, que coordenou o estudo.

O trabalho brasileiro

Como reconhecer a edição gênica é difícil, entre as etapas da pesquisa, os cientistas brasileiros se dedicaram na identificação de genes que, quando alterados, causam mudanças visuais notáveis.

“Nós identificamos os genes que fazem um inseto ter olhos vermelhos ou brancos em vez de ter olhos pretos e a cutícula mais clara. Então nós identificamos o gene que a gente tinha como reconhecer”, conta Araujo.

Esse processo foi longo e publicado em diversos artigos ao decorrer dos anos da pesquisa. No entanto, mesmo quando chegaram à resposta, os cientistas brasileiros ainda encontraram dificuldade em implementar o método CRISPR no bicho barbeiro.

Geralmente, a edição de genes é feita por meio de microinjeções com o material CRISPR diretamente nos embriões. Contudo, os ovos do bicho barbeiro são duros para perfurar. Foi neste quesito que o grupo brasileiro contou com a colaboração de Jason Rasgon, da Universidade da Pensilvânia.

“Nos encontramos em um congresso e conversamos sobre o assunto. E aí ele nos forneceu essa ferramenta, funcionou super bem”, explica a coordenadora da pesquisa.

Colaborações internacionais

De acordo com Jason Rasgon, métodos tradicionais de edição genética são muito difíceis de aplicar nos bichos barbeiros. Então, ele desenvolveu uma ferramenta  chamada Transdução de Ovário Mediada por Receptor de Carga ou ‘ReMOT Control. 

Ela consiste em injetar os materiais diretamente no sistema circulatório da mãe e guiar esse material para os ovos em desenvolvimento. “Nossa tecnologia tem o potencial de tornar a edição de genes mais eficiente, mais fácil e mais barata em uma ampla gama de animais”, afirma Rasgon.

No teste do método em bichos barbeiros, eles tentaram alterar os genes associados à cor dos olhos e da cutícula. Então, eles injetaram o CRISPR para edições genéticas na fêmea do inseto e, por fim, observaram que sua prole tinha as alterações desejadas. 

Além desta colaboração internacional, o estudo contou também com a participação de um grupo de pesquisa coordenado por Ethan Bier, do Tata Institute for Genetics and Society, Universidade da Califórnia, em San Diego.

Eles auxiliaram Araujo e outros pesquisadores a encontrar as melhores formas de sequenciar o genoma do Rhodnius prolixus. Ao fim da pesquisa, os três dos quatro bichos barbeiros testados tiveram alterações de cor nas cutículas e olhos.

Avanço na ciência

De acordo com os pesquisadores, o avanço permite que a comunidade científica passe a conversar sobre a edição genética com CRISPR para o controle da doença de Chagas

No total, há mais de 100 espécies do bicho barbeiro que se infectam com o Trypanosoma cruzi, responsável pela condição, e o Rhodnius prolixus é um modelo de vários deles. Assim, o método utilizado para edição genética no estudo recente pode permitir alterações que inibam a infecção pelo protozoário.

Bárbara Giovani

Bárbara Giovani

Jornalista de ciência que também ama música e cinema. Já publicou na Agência Bori e participa do podcast Prato de Ciência.

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