Como está o saneamento básico no Complexo de favelas da Maré, bairro com mais de 140 mil habitantes na capital do Rio de Janeiro? É exatamente isso que o Cocôzap quer saber.
A iniciativa criada em 2018 é um projeto do laboratório de dados Data_labe para estimular o mapeamento e participação popular da situação do esgoto, água e lixo nas favelas.
Tudo funciona pelo celular. Com um número e uma conta no WhatsApp, o Cocôzap abriu um canal para que a comunidade enviasse denúncias e propostas a fim de melhorar o saneamento básico, abastecimento de água e coleta de lixo na região.
O app facilita o acesso. Ali, a população pode enviar fotos, vídeos e informações sobre o que veem de lixo e esgoto, além de falta de água e possíveis vetores de doenças transmissíveis, como ratos e insetos.
O laboratório, então, usa o que foi enviado para criar uma base de dados. A ideia é identificar possíveis diagnósticos de como anda o saneamento na comunidade.
Em agosto, a iniciativa lançou o relatório “Cocôzap: Sistematizando dados e formulando políticas”. O texto aponta 120 queixas de moradores sobre esgoto só entre janeiro e abril de 2021. Dessas, 70 denunciam esgoto a céu aberto.
Dados vida real
Em seu site, o Cocôzap explica que esses dados são complementares aos indicadores usados como oficiais – que estão longe de serem completos.
O Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2010 apontou que somente 25% dos domicílios da Maré tinham esgoto a céu aberto em seu entorno.
Mas a realidade é bem diferente, como mostra uma reportagem produzida pelo site Maré de Notícias e Cocôzap, publicada em 14 de setembro. “Basta caminhar pelo conjunto de favelas para perceber que o esgoto a céu aberto é um problema grave em diferentes localidades”, diz o texto.
Uma reportagem de 2018 do Data_labe mostra como é complexo até mesmo saber quem é o responsável pelo fornecimento de água nas favelas da Maré. Além disso, as estações construídas e reformadas até hoje tratam um volume muito limitado de esgoto.
“Os dados oficiais de saneamento não conseguem dar conta da realidade da favela”, disse o cofundador do Data_labe, Gilberto Vieira, para reportagem do site UOL. “Aqui no Rio de Janeiro, por exemplo, a maioria dos dados indica que a cobertura da coleta seletiva chega a 90% em todo o estado. Basta andar cinco minutos numa favela para você ver que isso não é verdade”.
Geração cidadã de dados
A tecnologia virou ferramenta de impulso para iniciativas de fomento à cidadania na Maré. Em seu site, o Cocôzap diz que quer continuar o debate sobre saneamento básico e, assim, pressionar por políticas e soluções baseadas na vida real da comunidade.
Além da base de dados, a iniciativa também articula reuniões mensais com moradores e entidades locais. O objetivo é difundir o canal e manter vivo o debate sobre as questões sanitárias da região.
Depois do Cocôzap, surgiram outras iniciativas pioneiras na geração cidadã de dados dentro das favelas. Um exemplo é o Censo Maré, que já entrevistou quase 129 mil mareenses e produziu o Guia de Ruas da Maré (2014), Censo de Empreendimento Maré (2014) e Censo Populacional da Maré (2019).
“A Maré é exemplo de como a participação social é importante para gerar transformação”, disse Gilmar Gomes, presidente da Associação de Moradores da favela Rubens Vaz, à reportagem do Data_labe. “A gente nada no esgoto e se não tiver um planejamento não vai sair disso para dar uma qualidade na vida do morador”.