Com bolsas de doutorado insuficientes, instituição britânica recomenda que estudantes vendam Avon
Pesquisadores britânicos receberam um conselho bastante inusitado após reclamarem dos valores baixos das bolsas de doutorado oferecidas no projeto ARIES Doctoral Training Partnership. Em comunicado, membros do programa recomendaram que os cientistas comecem a vender produtos Avon para complementar a renda.
Outras atividades também foram sugeridas, como o oferecimento de passeio para cães ou mesmo a participação em ensaios clínicos remunerados. Tudo isso sob a justificativa de que os alunos não podem encontrar outros trabalhos que tomem mais de seis horas diárias, pois isso atrapalharia seu desempenho acadêmico.
Os pesquisadores da Universidade de East Anglia, na Inglaterra, descreveram a carta como “terrível”, “ridícula” e “inacreditável”. Para ter uma ideia, os estudantes do programa de doutorado recebem o valor de £ 15.600 por ano (cerca de R$ 101,4 mil). A quantia fica abaixo do salário mínimo anual do Reino Unido, estabelecido em £ 17.390 (cerca de R$ 113,07 mil).
O ocorrido está sendo revisado pelo UK Research and Innovation (UKRI), o principal programa de financiamento científico do país. Jenni Barclay, diretora do projeto de pós responsável pela carta, disse que o objetivo do comunicado era fornecer conselhos práticos como medida provisória enquanto as autoridades tentam melhorar a resposta global a esse problema para os alunos.
Bolsas de doutorado no Brasil
Esse não é um problema exclusivo dos cientistas europeus. No Brasil, é possível obter bolsas de pós-graduação através do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), mas o valor deixa a desejar.
Os alunos de doutorado recebem mensalmente uma remuneração de R$ 2.200. O auxílio não sofre reajustes desde 2013, o que desincentiva os universitários a seguir na carreira acadêmica após o final da graduação.
Mestrado e doutorado no Brasil é a forma de desvalorização do trabalhador mais efetiva já pensada. É só chamar de estudante e dar uma bolsa acima do salário mínimo. Pronto. A pessoa até esquece o que é um direito trabalhista.
— Cientista mal pago pelo CNPq (@cientistayag) July 25, 2022
A preocupação com desenvolvimento tecnológico e científico no Brasil é zero. Acreditem… a bolsa de mestrado (1.500 reais) e doutorado (2.200 reais) não tem reajuste há 9 anos e pasmem, é dedicação exclusiva. Inflação já subiu mais de 70%, cientistas no Brasil ainda sobrevivem?
— Maria 🇫🇷 (@eumafee) July 19, 2022
Sinceramente to cansada de me dividir entre trabalho freela e doutorado porque a minha bolsa não me permite viver com tranquilidade no Brasil 2022. E por outro lado, zero concursos que possa fazer porque não terminei o doutorado ainda.
— Nathana G. (@NathanaGarcez) June 30, 2022
No início de 2022, foi proposto o Projeto de Lei 4144/21, que determina a correção monetária dos valores das bolsas de estudo e dos auxílios destinados à pós-graduação e à pesquisa científica, no máximo a cada dois anos e de acordo com o índice oficial de inflação (IPCA).
Paulo Teixeira, autor do texto e deputado pelo PT, disse em nota que “a política de bolsas de estudo e auxílios é essencial para consolidação da ciência nacional, que necessita recompor-se das sérias ameaças às quais foi submetida nos últimos anos”. O projeto segue em tramitação.