Mais do que tudo, a Sony perdeu o espírito: gastou muito tempo dizendo que ela é a melhor empresa de eletrônicos do mundo, mas sem mostrar isso pra gente.
Formatos proprietários
O último grande formato proprietário bem-suceedido da Sony foi um produto chamado "Compact Disc". Você deve ter ouvido falar dele. Uma rodinha de plástico que gira, com ranhuras na parte de baixo? Que são lidas por lasers? Co-desenvolvida com a Philips?
Demorou alguns anos até que os CDs dessem certo, mas quando deram, choveu dinheiro pra Sony. Não apenas por vender CD players, mas por fabricar CDs para eles e para outros. Isso faz parte do negócio deles até hoje: a Sony DADC produz não apenas CDs, como DVDs, Blu-rays e discos para PlayStation em fábricas ao redor do mundo.
A Sony ficou mimada. Por décadas, um sucesso em um novo formato de mídia significava que a Sony poderia conseguir ganhar dinheiro vendendo a mídia em si. Nos anos 80 e 90, eles tenderam cada vez mais a não dividir o mercado. A Sony desenvolveu o drive de disquete de 3,5" para computadores, que teve adoção ampla porque disquetes vazios eram disponibilizados por várias fabricantes. Depois veio o MiniDisc, mas com menos sucesso. Em 1998, quando o mercado de memória flash começou a se aquecer, a Sony apresentou o Memory Stick, que acabou se tornando uma família completa de formatos de memória flash que não eram compatíveis com dispositivos de nenhuma outra fabricante.
E não se esqueça da guerra Blu-ray vs. HD-DVD. A Sony acabou ganhado esta, mas a batalha se seguiu por tanto tempo porque nenhum dos dois consórcios queria perder espaço no mercado de produção de mídia física para consumidores — consumidores que já estavam obtendo conteúdo online.
Reparou no problema? Mais de uma vez, a Sony pegou uma solução criada de forma excelente e a segurou firme, para extrair muito lucro. Mas a cada geração, a cada iteração, a necessidade da Sony de controlar o formato de tornou cada vez mais um problema. Mesmo consumidores leais da Sony sentiam que os formatos proprietários eram sacanagem, erodindo a alegria deles com um produto da Sony toda vez que tinham que gastar dinheiro a mais para comprar uma mídia física autorizada pela Sony.
Relutância em escolher
A Sony é cheia de boas ideias. Mas, com medo de confiar completamente em cada uma, a Sony lança um número ridículo de produtos, tentando ver qual vai dar certo, fazendo muitos deles parecerem estranhezas nas quais nem a Sony acredita.
Veja por exemplo o Bravia Link, o módulo de streaming de vídeo que a Sony decidiu vender como uma opção de 200 dólares para os televisores da marca, enquanto a concorrência integrava os mesmos serviços nas próprias TVs. Pior, a Sony vende o PlayStation 3 — por que não integrar o serviço de streaming nele, criando valor para o PS3 e ganhando apoio dos consumidores?
E o Party-shot Automatic Photographer? Este dock tira fotos e compõe retratos automaticamente de quem vai a festas. É uma ótima ideia. Mas ele funciona só com dois modelos de câmeras point-and-shoot da Sony — por que não integrar isto em toda câmera que a Sony faz?
A Nintendo ganhou bastante espaço da Sony com o Wii — então a Sony vai fazer um clone do Wiimote para o PS3.
Netbooks eram o gadget do momento, então a Sony resolveu fazer um netbook duas vezes mais caro e com pouca diferença em performance, depois o deixaram desaparecer no mercado, depois de gastarem milhões na campanha de lançamento.
A Sony lançou o primeiro leitor de e-book com e-ink anos antes do Kindle, apenas no Japão. Só que era quase impossível colocar conteúdo nele. Levou anos para que ele tivesse uma boa biblioteca e loja online. De acordo com estimativas da Forrester Research, a Sony só vendeu cerca de 50.000 de Readers antes da entrada da Amazon com o Kindle. Precisou chegar um concorrente com um produto melhor para convencer os consumidores de que era hora de se importar com e-readers e e-ink. Isso, e a vantagem não-estratégica de que o Reader era o único e-reader vendido em lojas físicas, fizeram a Sony ser a segunda colocada em participação de mercado de e-readers.
A Apple anunciou o iPad, então a Sony disse: o mercado de tablets é um "espaço no qual queremos ser um participante ativo". Eu já estou lamentando, por antecipação, o hipotético e belo slate preto que a Sony vai lançar em 2011 e depois deixar de lado. Enquanto isso, a Sony vai lançar o Dash, um dispositivo baseado no Chumby — ou, como você talvez o conheça, um tablet de 13 cm de espessura com touchscreen que você precisa deixar plugado na tomada.
Por algum tempo, os notebooks Vaio da Sony eram um dos mais belos e coloridos que existiam. Mas não demorou muito para que os grandes concorrentes da Sony, como a HP, investissem mais no design — enquanto a Sony continuava cobrando a mais pelos laptops "bonitos" deles. A analista da Gartner, Leslie Fiering, colocou isso de uma forma muito boa: "Eles foram o status quo por tanto tempo que fica difícil ver sinais de mudança. Se eles continuarem no caminho onde estão, eles vão continuar a ser coisa do passado".
Assim é a Sony hoje: uma coisa do passado que quer respeito de líder de mercado.
Como lição de casa, a Sony poderia começar por estes três estudos da Faculdade de Administração da Universidade Stanford: "Muitas escolhas podem prejudicar o desempenho de marcas"; "Pedir a consumidores que comparem pode ter resultados não-intencionais"; e "Para consumidores, mais escolha significa mais qualidade".
Este último parece estimular o plano de marketing da Sony, até você ler este aviso: "Em um estudo, por exemplo, os consumidores deram notas altas para um restaurante que oferecia uma grande variedade de pratos em uma categoria — comida tailandesa. Mas quando o restaurante era retratado como oferecendo não só comida tailandesa, mas também comida de outras categorias, as notas dos consumidores caíram. ‘Em alguns casos, ter muitas opções não-relacionadas é um sinal para o consumidor de que a marca não é focada, e portanto que não pode ser muito boa.’ "
Arrogância
Não há exemplo melhor da arrogância da Sony de hoje que o lançamento do PlayStation 3. Ele foi o último da geração atual de consoles de videogame a chegar ao mercado. Ele custava mais que seus concorrentes. Kaz Hirai, então presidente e CEO da Sony Computer Entertainment America (SCEA) e agora presidente da Sony toda, disse as infames palavras: "A próxima geração não começa até nós dissermos que começou".
As pessoas já estavam revirando os olhos para a Sony mesmo antes de Hirai e a equipe de executivos dele fizeram essas afirmações soberbas — mas, depois que a Sony passou os próximos três anos lutando em um mercado que eles antes dominavam, nós reviramos tanto os olhos que eles viraram para dentro do crânio.
O porquê de a Sony exibir essa imagem metida ao mundo é algo impossível de entender, até você perceber que esse é o tipo de papo que alguém em delírio fala, antes mesmo de o jogo começar, mesmo sendo uma equipe que não ganha há anos.
Isso fica claro no marketing e nas relações públicas deles também. A Sony é rápida para fazer uma festa enorme, lançar um laptop com um evento bobo como um desfile de moda, ou fornecer unidades de teste para revistas de estilo de vida, em vez de revistas técnicas.
Depois do sucesso acidental de um produto menos técnico, o Walkman, a Sony acha que todo produto que eles lançam é estiloso — quando na verdade o Walkman se tornou um ícone de estilo apesar do visual espalhafatoso ou sem inspiração dele.
Se você acha que estamos avaliando a Sony de forma muito pesada, pense em quantos produtos da Sony acabaram na nossa lista de 50 Piores Gadgets da Década. Quase todos eles cometeram os mesmos erros acima, e mais — como o player de MiniDisc de 1.900 dólares acima: um produto da linha de luxo Qualia, que durou pouco tempo, é a encarnação dos três erros.
Eu acredito que a Sony tem a audácia de fazer algo além de produtos que são cópia de outros já existentes — eles são capazes de fazer produtos que expandem mercados e que são reconhecidos por muitos. Mas enquanto eles não olharem para si mesmos com honestidade, a Sony vai continuar a passar vergonha, sendo a empresa que nos diz trazer o futuro — e que depois vende produtos nos quais nem eles acreditam.
– Com reportagem de Brian Barrett e Don Nguyen