Pela primeira vez, geólogos usaram um drone aéreo para mapear o interior de uma cratera gigante, do tipo que apareceu com regularidade crescente na Sibéria. O modelo 3D resultante, junto com outros dados coletados durante a pesquisa, está reforçando a teoria predominante que liga esses buracos bizarros na tundra ao aumento das temperaturas.
“Ao longo dos anos, ganhamos muita experiência com drones de vigilância, mas esta pesquisa aérea subterrânea da cratera C17 foi a tarefa mais difícil que já enfrentei, tendo que me deitar na borda de uma cratera de 10 andares de profundidade e balançar meus braços para controlar o drone”, disse Igor Bogoyavlensky, geólogo do Instituto de Pesquisa de Petróleo e Gás da Academia Russa de Ciências, em um comunicado.
Bogoyavlensky disse que esteve perto de perder o drone em três ocasiões, mas “conseguiu obter os dados para o modelo 3D”, cujos detalhes foram publicados na revista Geosciences.
Andrey Umnikov, coautor do estudo e diretor do Centro Russo de Desenvolvimento do Ártico, foi o primeiro a localizar o C17 de um helicóptero em julho de 2020. O buraco de 30 metros de profundidade está localizado na Península Yamal, no noroeste da Sibéria, e está situado perto de três outras crateras, incluindo a cratera Yamal, cujo aparecimento repentino alertou o mundo para este estranho fenômeno em 2014. O buraco que os pesquisadores estudam surgiu no ano passado em meio a um calor recorde na região.
A teoria por trás dessas crateras, das quais 20 são conhecidas, é que elas são o resultado do derretimento do permafrost (também chamado de pergelissolo). Conforme o Ártico se aquece, o gás, principalmente o metano, se acumula dentro das cavidades localizadas na camada superior do permafrost. Eventualmente, o solo não é mais capaz de conter essa pressão e emite um poderoso arroto na forma de uma explosão de gás, jogando fora o material (ejetado) e formando uma cratera, conforme visto nas imagens. Os orifícios de explosão não duram muito, pois rapidamente se enchem de água e se transformam em lagos.
Daí a urgência de se organizar uma expedição para estudar detalhadamente o C17 o mais rápido possível após sua descoberta. A equipe, que incluía especialistas do Instituto de Ciência e Tecnologia Skolkovo, visitou o buraco em 26 de agosto de 2020 – aproximadamente 40 dias depois de ter sido localizado pela primeira vez.
Ao chegar, a equipe percebeu que o buraco havia aumentado ligeiramente de tamanho, resultado do derretimento e colapso da rocha. As medições mostraram que a profundidade da cratera não era uniforme, variando entre 29 a 33 metros.
“A nova cratera é impressionante em seu estado ideal de preservação, principalmente o topo em forma de cone de onde o material ejetado foi lançado, as partes externas do monte que precipitou a cratera, as paredes da própria cratera que estão incrivelmente bem preservadas e, é claro, a cavidade de gás no fundo de gelo da cratera”, disse Evgeny Chuvilin, coautor do estudo e cientista do Skoltech Center for Hydrocarbon Recovery.
Pedaços de material ejetado foram vistos a até 220 metros da cratera, destacando a força da explosão.
É importante ressaltar que a equipe chegou a tempo de encontrar o buraco em “estado quase puro” e “sem água para enchê-lo”, disse o coautor do estudo, Vasily Bogoyavlensky. Ao mesmo tempo, a cúpula gelada permaneceu praticamente intacta. Antes da explosão, a cavidade continha uma cúpula circular com fundo elíptico, explicou Bogoyavlensky, ao qual acrescentou: “Pelo que sabemos, podemos dizer que a cratera C17 está ligada a…falha profunda [tectônica] e um fluxo anômalo de calor terrestre.”
Igor Bogoyavlensky pilotou o drone aéreo, marcando a primeira vez que um drone foi usado para estudar uma cratera do tipo. Foi também a primeira oportunidade para os cientistas estudarem uma cratera relativamente nova que não entrou em colapso ou se encheu de água. (Cientistas já escalaram dentro dessas coisas antes, mas só depois de estarem cheias de água.) O drone, que atingiu a profundidade de 15 metros, coletou dados valiosos, permitindo à equipe construir um modelo 3D do interior da cratera. Os pesquisadores também documentaram características não visíveis da superfície, como grutas e uma suspeita caverna no fundo.
De acordo com o modelo 3D, a cratera tem um diâmetro de cerca de 25 metros, enquanto a cavidade de gás na parte inferior mede entre 13 a 15 metros de largura. O pedaço gigantesco do solo de gelo na cratera mede 23 metros de espessura em alguns lugares. O volume total do espaço subterrâneo é estimado em 9.910 metros cúbicos, incluindo cerca de 7.500 metros cúbicos de gelo.
A equipe também analisou dados de sensoriamento remoto coletados por helicópteros e satélites, os últimos dos quais mostraram que o buraco C17 se formou em algum momento entre 15 de maio e 9 de junho do ano passado. Uma pesquisa publicada no início deste mês usou satélites para descobrir ainda mais buracos na tundra.
Juntas, essas observações fortalecem a teoria sobre como esses buracos são criados: O acúmulo constante de gás dentro de uma cavidade subterrânea leva a pressões tremendas, resultando na formação de um “monte de elevação perene”, ou PHM, de acordo com o estudo. Se o crescimento de um PHM atingir um limite crítico, ocorre uma explosão semelhante a uma vulcânica, formando uma grande cratera.
“A forma específica da cavidade subterrânea no gelo maciço, cuja estrutura é representada por um modelo digital 3D, é de grande importância para a confirmação factual do modelo de formação da cavidade”, escreveram os autores no artigo. “Isso prova o modelo de sua formação no solo de gelo massivo, o mecanismo gás-dinâmico da formação do PHM e a poderosa explosão de gás com a destruição da parte do arco da cavidade subterrânea e do próprio PHM.”
No futuro, os cientistas esperam aprender mais sobre o gás e de onde ele vem, como ele se acumula nas cavidades e como isso pode resultar em uma explosão tão poderosa. A equipe espera revisitar a cratera C17 no final deste ano para continuar a investigação deste curioso fenômeno natural com um pouco de interferência humana.