Ciência

Dengue: 8 perguntas e respostas sobre o que tomar, o que evitar e a hora certa de ir ao hospital em caso de suspeita

Saiba detectar sintomas, quais remédios são realmente indicados e contraindicados e quando procurar ajuda médica imediata
Imagem: Fiocruz/Divulgação

Reportagem: Camila Neumam/Instituto Butantan

“Este medicamento é contraindicado em caso de suspeita de dengue. Ao persistirem os sintomas, um médico deverá ser consultado.” A frase citada há anos em propagandas de analgésicos e anti-inflamatórios precisa ser sempre lembrada, principalmente na atual epidemia de dengue.

Febre, dores no corpo, na cabeça e atrás dos olhos, além de fadiga, são os primeiros sintomas da dengue, e costumam ser tratados com estas medicações. Porém, algumas delas (veja os exemplos abaixo) podem agravar os sintomas da doença, caso se confirme o diagnóstico. Sendo assim, é importante saber detectar uma suspeita de dengue, que envolve notar se há outros casos em pessoas próximas ou na vizinhança, além de observar atentamente o conjunto de sintomas.

Outro ponto importante é entender que frutas cítricas, vegetais, chá de folhas e suplementos vitamínicos não são capazes de tratar ou curar a dengue. O motivo? Porque não há comprovação científica sobre isso.

“Não existe nenhum tratamento específico que aborde o vírus dengue e seus quatro subtipos, que diminua a intensidade dos sintomas, que evite a progressão da forma mais grave e a morte pela doença”, afirma o infectologista e gestor médico de Desenvolvimento Clínico do Butantan, Erique Miranda.

“Tomar uma medicação não indicada, além de não ter eficácia, pode retardar a procura pelo serviço de saúde e arriscar sua vida”, ressalta.

A melhor forma de prevenir a doença é a vacinação. O Butantan desenvolve uma candidata vacinal contra dengue, a Butantan-DV, que está em fase final de ensaios clínicos. Sua fórmula com os quatro vírus da dengue atenuados, de dose única, demonstrou uma eficácia média de 80% em artigo publicado na revista The New England Journal of Medicine. O estudo está previsto para ser finalizado em junho de 2024.

1- Por que ivermectina não cura a dengue?

A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde não incorporaram a ivermectina em seus protocolos contra a dengue. Sendo assim, não há recomendação do uso da ivermectina para evitar e tratar a doença.

A ivermectina é uma medicação vermífuga que chegou a ser avaliada em pesquisas básicas e estudo clínicos com amostragens pequenas, por conta do seu potencial de medicação antiviral, mas sem sucesso. Nenhum destes estudos demonstrou resposta clínica contra a dengue, ou seja, algum benefício para a saúde de quem estava com a infecção. Embora a medicação tenha mostrado algum efeito em diminuir a carga viral, não resultou em redução do tempo de sintomas e das complicações graves causadas pela doença. Em suma, os estudos mostram alguma atividade antiviral, porém não relacionada a benefício clínico contra a dengue.

2- Existe algum alimento que pode prevenir ou curar a dengue?

Não há comprovação científica de que o consumo de alimentos, como frutas, legumes e verduras, ou qualquer outro tipo, seja eficaz na prevenção da dengue ou na redução de seus sintomas. Faltam estudos clínicos que estabeleçam uma quantidade segura ou a restrição alimentar para pessoas com quadro de dengue clássica (sem gravidade), com sinais de alerta ou dengue grave.

Os resultados inconclusivos abrem espaço para “opinião de especialista”, sem rigor científico. Em resumo: se te disserem que suco de limão, própolis, chás ou outros alimentos evitam ou curam a dengue sem afirmar a quantidade ideal de consumo e nem de onde vem essa informação, questione.

3- O consumo de vitaminas pode prevenir a dengue? 

Falta literatura suficiente que ligue a eficácia do consumo de micronutrientes, como vitaminas, no combate à infecção pelo vírus da dengue ou como repelente do vetor. Os estudos revisados têm limitações significativas, incluindo amostras pequenas, e não trazem detalhes de qual seria a dose de suplementação ou restrição adequada. Por isso, o consumo de vitaminas não pode ser considerado um método preventivo. Neste caso, deve-se considerar o uso de repelentes aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para prevenir picadas do mosquito Aedes aegypti, principal vetor dos quatro sorotipos da dengue.

4- Quais medicamentos podem ser usados em caso de suspeita ou diagnóstico de dengue? 

O principal tratamento da dengue clássica envolve tomar bastante líquido (de 60 a 80 ml por kg de peso) porque uma das características do vírus é retirar líquidos dos vasos sanguíneos. Para combater as dores no corpo e a febre, dois medicamentos são indicados: paracetamol e dipirona.

Se surgirem outros sintomas, como dores abdominais intensas, vômitos excessivos que impedem a hidratação e a alimentação, hipotensão, diminuição da quantidade de urina e sangramentos nasais e gengivais, é imprescindível procurar atendimento médico imediato. Estes sintomas indicam que a doença está se agravando.

No hospital será possível avaliar a possibilidade do diagnóstico de dengue ou de outras infecções virais semelhantes, bem como avaliar a gravidade da doença com a prova do laço (exame que testa a fragilidade dos vasos sanguíneos) e exames de sangue do tipo NS1, RT-PCR e IgM e IgG. Quanto antes o tratamento for iniciado, melhor.

Se o paciente tiver condições de ir de alta, deve receber orientações da hidratação (60-80mL/kg), além dos remédios para conter os sintomas e informações acerca dos sinais de agravamento da doença, que podem ocorrer entre o terceiro e o quinto dia de doença.

5- Em caso de confirmação de dengue, quais medicamentos devem ser evitados? 

No tratamento da dengue clássica devem ser evitados os anti-inflamatórios não esteroidais (ibuprofeno, diclofenaco, ácido acetilsalicílico, ácido salicílico, diflunisal, salicilato de sódio, metilsalicilato) e os corticoides.

6- Por que estes remédios podem trazer malefícios?

Os anti-inflamatórios não esteroidais podem favorecer sangramentos e o aumento da acidez no sangue (acidose). Isso acontece porque eles reduzem a agregação das plaquetas, responsáveis pela coagulação do sangue, e costumam ser recomendados para pacientes cardíacos ou pós-acidente vascular cerebral para “afinar o sangue”. Porém, em pacientes com dengue que apresentem fragilidade dos vasos sanguíneos, tomar anticoagulantes pode acelerar o surgimento de hemorragias.

Pacientes que usam anticoagulantes regularmente devem consultar um médico imediatamente em caso de suspeita de dengue. 

O uso do ácido acetilsalicílico, além de afinar o sangue, pode também alterar o seu pH em doses mais altas, deixando-o mais ácido. Associada à redução abrupta dos líquidos dos vasos sanguíneos, que também modifica a acidez do sangue, essa alteração pode causar a acidose metabólica, que pode levar à insuficiência em vários órgãos e até à morte por choque e sangramentos.

Já o uso de corticoide tem a tendência de reduzir a resposta imunológica do organismo e também de aumentar o risco de sangramentos. Para pacientes com dengue, este é mais um fator de risco para o agravamento da doença.

7- Como diferenciar os sintomas da dengue clássica da dengue com sinais de alarme e dengue grave?

Dengue clássica: consiste em um conjunto de sintomas entre os quais se destacam a febre, geralmente alta (39°C a 40°C), de início abrupto, associada à cefaleia, fraqueza muscular, dor muscular, nas articulações e atrás dos olhos, com presença ou não de manchas vermelhas na pele. Podem ocorrer náuseas, vômitos e diarreia entre dois a seis dias.

Dengue com sinais de alarme: entre o terceiro e quinto dia, podem surgir sintomas mais preocupantes. Nesta fase, a febre cede e pode ocorrer dor abdominal intensa, vômitos, queda brusca da pressão arterial, hepatite viral, diminuição da urina, queda abrupta na quantidade de plaquetas, sangramento de mucosas e de outras partes do corpo, como nariz, útero e gengivas. Algumas vezes vômitos excessivos impedem a alimentação, particularmente em quadros mais graves de dengue. Portanto, a baixa aceitação alimentar é um sinal de gravidade.

Dengue grave: esta nomenclatura está associada à fase mais crítica da doença. É quando ocorre o extravasamento do plasma sanguíneo, que causa hemorragias severas e pode acarretar o comprometimento de órgãos, evoluindo para um quadro de choque e até levar a óbito.

8- Qual o momento certo para procurar atendimento médico?

É fundamental buscar atendimento médico para o tratamento adequado quando se notar a presença de febre acima de 38°C, sobretudo se estiver associada a dor de cabeça, dor no corpo e nas articulações, mal-estar, fadiga, perda de apetite, náuseas, vômitos e manchas vermelhas pelo corpo. A doença pode ser confundida com outras arboviroses, como chikungunya e zika, o que torna mais difícil o diagnóstico. Quando se notam sinais de alarme, a procura por atendimento deve ser imediata.

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