Um gene fez você “nascer para ser solteiro”? É bobagem

Será verdade? Se você não encontra uma cara-metade, ou está indisposto para tanto, a culpa é da genética? Não é o caso.

Uma notícia publicada esta semana pelo site A Capa diz que, segundo um estudo científico, “tem gente que nasce para ser solteira”. Será verdade? Se você não encontra uma cara-metade, ou está indisposto para tanto, a culpa é da genética?

Não é o caso. O artigo em questão, publicado pela revista Scientific Reports, foi considerado “um forte candidato a pior estudo genético a ganhar manchetes em 2014” – sim, ele é de dois anos atrás.

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A hipótese do estudo, liderado por Jinting Liu da Universidade de Pequim, é que uma versão do gene 5-HT1A deixaria a pessoa menos confortável para aproveitar a companhia íntima de um parceiro – assim, a chance de se tornar solteira seria maior.

No entanto, como explica a geneticista Silvia Paracchini, a maioria dos estudos feitos para testar se um único gene está associado a uma característica específica “levam a muitos falsos positivos, e raramente podem ser replicados”.

Ou seja, seria grande a chance de encontrar uma conexão que não existe entre dois fatores – por exemplo, ter uma variante do gene 5-HT1A e estar solteiro.

Pior: o próprio estudo descobriu uma associação muito fraca (1,4%) entre o gene 5-HT1A e o status de relacionamento. E este ainda poderia ser um falso positivo, dado que o estudo não foi reproduzido de forma independente com outros voluntários.

Paracchini explica que o gene 5-HT1A é um receptor da serotonina, neurotransmissor associado à regulação do humor e ao desenvolvimento da depressão. Só que seu status de relacionamento é afetado por muitos fatores ambientais e sociais; “não há nenhuma evidência para crer que a capacidade de um indivíduo manter um relacionamento pode ser determinada por um fator genético específico”, ela diz.

O estudo foi duramente criticado até mesmo por Paul de Bakker, professor de epidemiologia genética que fazia parte do conselho editorial da Scientific Reports na época. “Deveríamos investigar como este estudo passou pelo processo editorial. Isso pede por uma revisão nos critérios internos”, disse ele no Twitter.

Isso não impediu diversos veículos da mídia de divulgarem os resultados do estudo, já que eles se encaixam em uma narrativa simples e atraente – “você está solteiro por causa da genética”. Ele deu as caras no Daily Mail, The Guardian, O Globo e Marie Claire em 2014; e, esta semana, no site A Capa.

“Este é um exemplo típico de um estudo inconclusivo que chama atenção da mídia por causa de uma história chamativa que pode ser contada em torno dele, e não porque ele tem mérito na ciência”, conclui Paracchini.

Imagem via Pixabay

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