Giz entrevista Eduardo Azeredo sobre cibercrimes e liberdade na internet

O senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) é talvez a figura mais odiada da blogosfera brasileira. Dizem que ele é "o autor daquela lei que coloca quem troca música na cadeia" ou "que quer vigiar todo mundo na internet". O motivo desse ódio é que o texto da lei inicialmente tinha um texto bem esquisito, que permitia as mais malucas interpretações - inclusive a criminalização de tias que passavam Powerpoint com vírus ou pessoas que indicavam links para baixar músicas. Mas a versão final da PL 89/2003, aprovada no Senado e que está tramitando na Câmara, parece, no fim das contas, inofensiva para o usuário de internet comum.  A tal Lei Azeredo é na verdade um apanhado de projetos de lei (alguns que alteram o código penal, a constituição ou o código militar) que quer criar crimes e penas para coisas que são, afinal, crimes, mas não estão devidamente previstos em lei, como fraudes, phishing, disseminação de vírus e etc. Parece um motivo nobre. Então Azeredo é herói, vilão, ou nenhum dos dois? Veja na entrevista exclusiva que eu fiz com ele esta semana.

A tal Lei Azeredo é na verdade um apanhado de projetos de lei (alguns que alteram o código penal, a constituição ou o código militar) que quer criar crimes e penas para coisas que são, afinal, crimes, mas não estão devidamente previstos em lei, como fraudes, phishing, disseminação de vírus e etc. Parece um motivo nobre. Então Azeredo é herói, vilão, ou nenhum dos dois? Veja na entrevista exclusiva que eu fiz com ele esta semana.

Por que você acredita que precisamos da lei agora?
Estamos cada vez mais precisando dessa lei. Há cada vez mais crimes na área bancária, casos de pornografia infantil e atentados contra a honra na internet.

Muita gente diz que a lei restringe os direitos individuais ou criaria um estado de vigilância. Seria um efeito colateral da lei?
Não é verdade. Quem não deve não teme. Ou seja: quem não usa a internet para o mal, não tem o que temer. O objetivo da lei é colocar regras mínimas para a penalização de novos crimes. A internet não pode ser terra de ninguém.

Você defende que o Brasil está apenas se adequando a acordos internacionais, como a Convenção de Budapeste. Como é a experiência dos outros países que adotaram a resolução?
A nossa lei foi escrita em conformidade com a convenção. Vários países como Japão, EUA, África do Sul e Canadá já o fizeram. O relatório que tivemos em uma reunião na França, com 70 países, é que a situação está ficando cada vez mais difícil. Na Itália a lei é mais rigorosa. Lá eles não permitem que as pessoas usem cybercafé sem identificação. 

Comenta-se que por trás da lei estaria a vontade dos bancos, cansados de pagar indenizações por fraudes.
Essa é a argumentação de quem não lê a lei ou pensa pequeno. Evidente que os bancos estão cobrando dos clientes o custo das fraudes, seja em cima dos tomadores de empréstimo ou nas taxas. Quem está pagando as fraudes bancárias somos nós todos. Isso é repartido. Os bancos têm interesse, é claro, mas é um interesse sadio.

O registro dos logs de todos os usuários por três anos não seria muito custoso para os provedores?
O que tem de ser guardado é apenas a identificação do computador – é só isso que o projeto prevê. Há sistemas de compactação e miniaturização para isso, não acredito que seja tão custoso. 

E as críticas de que a legislação seria inócua, já que há muitas maneiras de burlar a coisa, como usando provedores fora do Brasil?
A legislação é positiva. Mas é só um dos itens. É preciso educação e prevenção. É um ponto muito importante para começar, mas ela sozinha não resume tudo. 

Por que o projeto de lei se arrastou por tanto tempo em tramitação?
O projeto original é de 1999. O que fiz foi a fusão de vários projetos da Câmara, Senado, com outras modificações. As alterações eram necessárias porque o phishing, por exemplo, não existia no projeto original. 

Mas e os vírus passados sem querer, com máquinas zumbi e os powerpoints aparentemente inofensivos?
Como todo crime, há o julgamento do juiz, que vai verificar o dolo. Um vírus que a pessoa passar inadvertidamente passa para a frente não é crime. Não tem dolo. Essa confusão acontece porque as pessoas não lêem, não têm o mínimo de conhecimento legal para criticar. Nós tivemos o suporte muito importante do Francisco Botelho, membro do CNJ, que fez a assessoria. 

E a criminalização da troca de arquivos, o peer-to-peer? Quem baixa música corre o risco de ser preso?
A lei não toca nisso. É um outro assunto. O Brasil já tem uma lei sobre o assunto, a antipirataria. 

Alguns críticos, como o professor Ronaldo Lemos, da FGV, dizem que é preciso regular a internet como um todo, definir o que é o que antes de aprovar leis como essa.
É uma crítica de teóricos. Na prática a justiça quer que tenhamos essa lei. A quem interessa realmente esse problema é a lei. Alguns teóricos ficam com essa conversa de que precisa antes um marco regulatório… É uma forma de protelar a aplicação da lei. 

Por que você não compareceu ao debate sobre a Lei Azeredo na Campus Party?
Não fui convidado. Eu compareceria se fosse. Já fui a vários lugares defender a lei, essa é uma missão que acabou nas minhas mãos. 

E nesses lugares, mesmo hostis a sua presença, você consegue convencer as pessoas do seu ponto de vista?
Quando as pessoas têm as informações, elas se convencem. Você pode ter alguma discussão ainda de semântica. O termo tem de ser esse ou aquele. Isso ainda está em aberto, a Câmara pode fazer alterações. Mas basicamente as pessoas vêem porque tudo tem sua justificativa. Hoje não vejo nada mais significativo que esteja amarrando a aprovação. A Câmara está demorando. O Ministério da Justiça quer algumas alterações. O absurdo é não querer estabelecer regras. 

Como está o andamento do projeto de lei na Câmara?
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) já aprovou. O Ministério da Justiça (MJ) levantou algumas sugestões adicionais, apertando ainda mais a legislação. O MJ quer que a preservação das informações dos usuários seja independente de decisão judicial. A polícia pede que ela mesma possa autorizar a preservação de conteúdo de site ou dado de usuário [PB: na prática, a polícia poderia ordenar a sites e provedores a preservação de páginas e conteúdos, mesmo que depois fossem apagados pelo usuário]

Isso não poderia gerar abusos, como no caso dos grampos telefônicos?
Sim, por isso sou contra. Deixaria como está na lei neste momento. Quando a polícia tiver suspeita, ela deve requisitar que fique guardada a informação no provedor, para ter acesso. A guarda deveria depender de autorização judicial, não policial. É a defesa do estado do direito. Por isso a cautela.

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