por Bruno Izidro
Quando o brasileiro Keoma Pacheco participou do Capcom Cup no fim do ano passado, tão importante quanto estar nas finais do torneio oficial de Ultra Street Fighter IV, era ter a oportunidade de conhecer um dos maiores ídolos da cena de jogos de luta: Daigo Umehara. O japonês é o jogador mais famoso de Street Fighter, mas para Keoma ele também é uma das razões para ter se apaixonado pelo jogo da Capcom.
Assim como muitos adolescentes no início dos anos 2000, Keoma passava horas nos fliperamas jogando games de luta, não tanto Street Fighter – como poderia se pensar – e sim jogos da SNK, principalmente King of Fighters 99. “No [KoF] 99 foi onde eu comecei a criar um gosto [por jogos de luta]”, conta Keoma ao Gizmodo Brasil.
A coisa mudou de figura quando ele assistiu ao famoso vídeo do EVO Moment 37, onde Daigo, controlando Ken, executa a mais emblemática (e difícil) sequência de defesa da história dos jogos de luta.
“O vídeo do Daigo foi um negócio que me fez prestar muito mais a atenção em Street Fighter e jogos de luta de um modo geral, porque eu não tinha conhecimento do alto nível da modalidade, sabe?” A gente sabe, Keoma, a gente sabe.
Na Capcom Cup, o brasileiro tinha esperanças não só de falar pessoalmente com o ídolo como também, quem sabe, “tirar um contra” com ele. “Era tudo que eu queria [jogar com o Daigo], mas não aconteceu”, fala Keoma, meio decepcionado. “O Daigo ficou ocupado o tempo todo com entrevistas, então o máximo que eu consegui foi tirar uma foto”.
Se o encontro com Daigo não foi tão legal quanto poderia ser para Keoma, a participação dele no Capcom Cup foi, e muito. O torneio reuniu os melhores jogadores de Ultra Street Fighter IV de 2015 e, além de Daigo, outros nomes fortes estavam presentes, como Infiltration, Tokido e Momochi (campeão de 2014), mas ninguém ali conhecia Keoma, que tinha conquistado a vaga ao ganhar a etapa brasileira da Capcom Pro Tour, que aconteceu na Brasil Games Show.
O brasileiro foi lá e surpreendeu. Controlando o personagem Abel que muitos ali pensaram ser de outro mundo, ele venceu jogadores do calibre de Snake Eyez e GamerBee, terminou no Top 8 e só não foi mais adiante por pequenas falhas que cometeu em algumas partidas. “Não foi exatamente nervosismo ou falta de concentração, foi simplesmente por ter tomado algumas decisões erradas”. Ainda assim, o brasileiro já estava entre os oito melhores jogadores de Street Fighter do mundo.
Nas duas últimas edições da Capcom Cup o Brasil esteve presente. Se em 2015 foi Keoma, no ano anterior foi Chuchu que participou das finais do torneio. Isso significa que o cenário de competição no país está bem, certo? Para Keoma, nem tanto assim. “Desde quando o Breno Fighters venceu o Tokido na competição de 25 anos de Street Fighter [em 2012] todo mundo fala: ‘o Brasil tem nível’”, fala. “Não, [o Brasil] não tem nível”.
Keoma é bem crítico quanto à cena competitiva local e diz que o que falta para muitos jogadores por aqui é reconhecer, mesmo com as adversidades, que eles podem chegar em um nível bom para competir fora. “A comunidade cresce à medida que a gente tem um número maior de jogadores focados e aprendendo juntos, se estimulando”, argumenta. “Se não mudar isso, vai continuar só cinco ou seis pessoas jogando a nível internacional no país inteiro”.
Keoma com certeza é um deles e com o reconhecimento lá fora, agora ele conseguiu o que muitos somente sonham por aqui: se tornar jogador profissional de Street Fighter e ganhando dinheiro com isso. Depois da Capcom Cup ele foi contratado como atleta da Team Innova, focada só em eSports. Por falar nisso, era inevitável tocar no assunto de eSports com ele.
Jogo de luta é eSports?
A comunidade de jogos de luta nunca gostou muito do rótulo de eSports. Assim como Ryu, que sai na porrada só para ir em busca do mais forte, muitos jogadores – mesmo profissionais – tem uma visão quase, digamos, romantizada de competir mais pelo prazer de jogar contra os melhores, e também se superar para jogar melhor, do que para ganhar dinheiro.
Não é a toa que as premiações dos torneios de jogos de luta são bem inferiores se comparado a competições de League of Legends, Counter-Strike ou Starcraft. Porém, nos últimos anos o principal torneio de jogos de lutas, o Evolution (EVO), tem atraído mais e mais público e mudanças começam a acontecer. Um exemplo disso é que nesse ano o EVO vai ser realizado no Centro de Convenções em Las Vegas, com as finais na arena Mandalay Bay, também em Vegas, onde acontecem lutas de boxe e MMA.
E para o Keoma, jogo de luta é eSports? “Eu trato como eSports”, responde. “Mas a gente ainda tá alguns passos atrás para se tornar um”. Mudanças como a do EVO 2016 são vistos por ele como parte desse caminho rumo a algo mais profissional. “Isso vai aumentar a visibilidade e vai fazer com que os jogos de luta tenham cada vez mais o seu espaço merecido”, comenta.
A própria Capcom também já enxerga isso com a criação do Capcom Pro Tour e do Capcom Cup nos últimos anos. “E com o Street Fighter V sendo um jogo desenvolvido com base no cenário competitivo e acessível aos jogadores casuais, tá chegando cada vez mais perto”. Opa, essa é a deixa para o próximo assunto da conversa.
Here Comes a New Game
A Capcom Cup que Keoma participou marcou também meio que a despedida de Street Fighter IV. Depois de oito anos e quatro versões, é hora de deixar o quarto jogo no passado e agora todos estão de olho em Street Fighter V, que será lançado ainda em fevereiro.
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Keoma conseguiu jogar bastante do novo jogo, com os quatros betas e mais presencialmente em eventos como a Brasil Game Show e PlayStation Experience. Ele fala o que acha do jogo até aqui. “A primeira coisa que tenho pra dizer é que o jogador de Street Fighter IV vai ter momentos difíceis tentando aprender o V se não mudar a mentalidade do que é necessário pra vencer”, começa. “Tem que ser criativo ou bastante inconsequente em alguns momentos e é justamente essa coragem que é preciso ter pra algumas jogadas”.
Ok, parece que pra cena competitiva ele terá um grande impacto, mas e quem, assim como eu e muitos por aí, só quer tirar um contra de vez em quando e se divertir? “Pro saudosista é um bom jogo, pro entusiasta é um bom jogo, pro competidor é um bom jogo”, responde. “[O jogo] tem personagens mais antigos e tem aquele sentimento de Street Fighter clássico, se encaixa mais nos jogos dos anos 90, como o [Street Fighter III] Third Strike ou mesmo o Street Fighter II em alguns aspectos”. Com a aprovação de um dos melhores jogadores do mundo, o hype pelo Street Fighter V fica ainda maior.
Quando Street Fighter V sair no dia 16 de fevereiro para PS4 e PC, Keoma já vai estar lá com os seus Charlie/Nash, Karin ou Laura (os “bonecos” com os quais mais jogou até agora), Afinal ele vai precisar treinar o quanto pode para se preparar para o EVO 2016.
O brasileiro nunca foi para o maior torneio de luta e vai corrigir este problema nesse ano. Mesmo que não consiga se qualificar para competir, vai nem que seja pra treinar mais uma vez com os melhores do mundo. Além de, claro, tentar mais uma vez jogar com Daigo. “Na próxima oportunidade eu não vou deixar passar”, fala Keoma, confiante, porque pra ele não importa perder ou ganhar do maior de todos os tempos. Só fazer aquilo que é sua paixão ao lado do ídolo que o motivou já é o suficiente.