Made in Brazil Em defesa do computador que dá pau
A história é a seguinte: eu quero um computador novo. Já encomendei um processador Core i7 que virá com uma amiga dos EUA. Por aqui tudo relacionado ao novo e matador chip da Intel é impraticável em termos de preço. Então vai demorar pra conseguir dinheiro para mudar tudo que quero, Mas quando ele estiver funcionando, vou fazer com que esse meu computador atual seja uma espécie de servidor de torrents multimídia da casa, pra ficar no andar de baixo, junto da TV. Mas como dar uma sobrevida a ele? A maneira mais barata que eu achei: mudar o processador e colocar mais 1 GB de RAM.*
Segunda-feira ensolarada, fiz um demorado passeio à Sta. Ifigênia, a meca dos eletrônicos do Brasil. Antes, muita leitura. É importante você ter idéia do que vai comprar porque 99% dos vendedores de informática não entendem do assunto. O teste: “ei, senhor vendedor, o que é melhor? Um processador de 4 núcleos ou um bom, mais moderno, de 2?” “Um de quatro, sempre.” Essa era a resposta padrão. E é bobagem. Depende da tarefa, sistema operacional, placa-mãe, e um monte de coisa. Saí de lá com um bom custo-benefício pra dar uma sobrevida ao meu futuro media center. Mas caí na besteira de confiar em um vendedor. “É compatível com sua mobo sim! É só atualizar a bios!”
Sei. Atualiza o bios, espeto o novo processador, o computador liga e desliga logo depois. Mal conectado, talvez? Quando tento ajeitar o bicho, amasso um dos conectores. Tento desamassar, e amasso outros, e um deles se solta. Notebook ligado, olho em fóruns. “Pode ser um ‘dummy connector’, ainda pode funcionar”. De qualquer forma a placa não é compatível. E como eu quero reduzir o tamanho do meu bicho, vou atrás de uma plava micro-ATX para fazer com que ele caiba numa caixinha. Quem sabe um casemod bacana depois, nintendinho-style?
Compro uma “mobo” baratinha, que faz o feijão-com-arroz, pra continuar o meu experimento. Conectar tudo, do zero, em uma placa-mãe é uma coisa meio sacal. Ver o mapa de onde vão os leds que indicam quando o bicho tá ligado, os switches, etc… Aparafusar tudo, apertar um conector de energia… Ligo de novo e, bem, o meu processador realmente morreu. Moro bem perto de um outro centro de contrabandistas chineses-coreanos de produtos eletrônicos e compro o mesmo processador. Agora com todo o cuidado, espeto e tudo funciona. O computador ainda tá aqui aberto, esperando mais mexidas (um cooler a mais, porque ele é bem amigável a overclock), mas tudo funciona. Estou rodando o Windows 7 e ele reconheceu instantaneamente todos os drivers. Roda lindo. O Geekbench mostra que só com o novo conjunto placa + processador (R$ 420), a performance mais que dobrou. Sem os tweakes que eu tenho pra fazer ainda.
Depois de toda a saga com final relativamente feliz, conversei com um amigo meu, que é um desses defensores ávidos do Mac. “Ei, cara, tive uma experiência que vocês donos de Mac NUNCA vão ter”. E contei a história, rimos juntos. E é mais ou menos verdade. Isso quer dizer que os micros da Apple são mais “plug n play”, sem estresses e tudo? Na maior parte do tempo, sim. Mas isso é só metade da história.
Eu acho que hoje as pessoas sabem cada vez menos como funcionam as coisas que utilizam. Quando tinha meu Escort 89 e seu bravo motor CHT, eu tentava uma meia-dúzia de coisas com o capô aberto quando o carro parava, antes de chamar o mecânico. Hoje é tudo eletrônico, e o motor só é decifrável em uma autorizada. Hoje, se der um problema no seu iPod, você provavelmente vai falar “é, morreu”, e comprar outro. Abrir pra fazer o quê? Boa parte dos donos de PCs, pelo menos da minha geração, bem ou mal se acostumaram a abrir o micro para colocar uma nova placa, formatar e reinstalar coisas, resolver conflitos, observar o log de inicialização com o hijack this, acompanhar fóruns, ver comparativos no Tom’s Hardware… E isso traz uma cultura tecnologica interessante – que pode ter como resultado ser consultado por tias toda vez que o cabo de força se desliga, mas também traz um conhecimento melhor de como funciona a computação. E, para pessoas que trabalham 12 horas na frente do micro, saber o que os Oompa Loompas fazem dentro do case me parece bom. Não sei o quanto que é útil, e certamente não faz os donos de PC mais inteligentes, mas dão um conhecimento de mundo tecnológico mais interessante. Mesmo quando não dá problema – meu micro ficou esses quase 3 anos sem vírus, sem reformats e sem upgrades, dá um conforto. E quando aparentemente dá tudo errado, como nesse feriado, pelo menos você se diverte e aprende pra quê serve aquele pedaço da placa-mãe.
E, pelo sucesso de coisas como a Make, o crescimento do Etsy, os mashups do Google e as milhares de leituras dos nossos Giz Explica, o mundo também está se ligando que entender como o mundo funciona, das leis à sua placa-mãe, é o primeiro passo para mudá-lo.
* Para os curiosos. O processador que comprei foi um Athlon 64 X2 7750 (Black Edition). Comprei meu micro há 3 anos, na época em que a AMD era um custo-benefício levemente superior para jogos, e como queria aproveitar a placa-mãe, continuei na arquitetura. Preferi esse ao invés dos Phenom X3 ou X4 (essa nova série na verdade é um Phenom partido ao meio) porque, além de bem mais barato, a maioria das tarefas que quero executar nele não se valem muito de muitos núcleos. Consultei todas as tabelas possíveis do Tom’s Hardware. Nos testes deles, por exemplo, o melhor tocador de Blu-Ray é um Core 2 Duo (o E8600, caríssimo, mas é Duo). E, por enquanto, o novo bicho tá mandando bem. Arrecomendo.