Mini-system sem o “system” é o futuro

Ano passado nós havíamos visto o estranho e incrível Soundsphere MCI900, um mini-system de mil Euros que acabou nunca desembarcando no Brasil. Na semana passada a Philips mostrou uma evolução do conceito: eles pegaram as mesmas caixas com o som sensacional e tiraram basicamente todos os circuitos. O que sobrou foi o Fidelio Soundsphere, o primeiro grande amigo […]

Ano passado nós havíamos visto o estranho e incrível Soundsphere MCI900, um mini-system de mil Euros que acabou nunca desembarcando no Brasil. Na semana passada a Philips mostrou uma evolução do conceito: eles pegaram as mesmas caixas com o som sensacional e tiraram basicamente todos os circuitos. O que sobrou foi o Fidelio Soundsphere, o primeiro grande amigo do AirPlay da Apple, que representa o que eu acho que seja o futuro dos sistemas de áudio, ao menos os Hi-fi.

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Não sei quanto a vocês, mas há muito tempo meu som fica permanentemente no “Aux-in”, com alguma coisa conectada, seja o Zune, iPad, TV ou notebook. Basicamente porque a música não está mais no som, e por mais bonitinhas que sejam as interfaces dos novos modelos, com entrada USB (alguns têm tela com touchscreen e tudo), eles nunca vão rivalizar com os tocadores portáties mais modernos. A crescente popularidade das docks com caixas integradas para iPods mostra que os consumidores estão atrás, na verdade, de amplificadores para suas coleções. Mas até agora tínhamos que deixar o arquivo das nossas MP3 presos às caixas – fisicamente ou através de fios – para ouvir a música. E isso é incômodo.

O tecnologia AirPlay da Apple basicamente permite que você mande as músicas diretamente do seu iCoisa para o som via a rede wireless, instantaneamente e sem perda de qualidade. Na semana passada, quase simultaneamente, a Philips e a JBL (que tem alguns docks bem populares), lançaram seus modelos de caixas com AirPlay, e muitos outros virão ainda. A bem da verdade, aparelhos de som que usam o sistema da Apple não são algo muito revolucionário, se você pensar. Há tecnologias que fazem coisa parecida, como o próprio app Remote e o AirPlay em conjunto com o “Airport”, o roteador da Apple. No Android, o Twonky, ou os sistemas de áudio mais modernos com a ajuda do DLNA permitem que o conteúdo que está no telefone vá sem fios para o som. Mas tudo isso – se não é uma gambiarra – é apenas uma opção. O que os sistemas da Philips e JBL mudam é o paradigma.

Nos Fidelio Soundsphere da Philips que testamos há três opções de entrada: o dock, uma entrada RCA (ou P2, a padrão de headphones) ou o AirPlay. Não há aquela caixa no meio com CD e equalizador que ninguém usa, e mesmo as entradas são “opcionais”, um plano B. A ideia é que o som esteja no seu iCoisa. Mais precisamente, longe das caixas e do dock. Como os engenheiros da Philips deixaram claro, ele será vendido quase como um “produto Apple”, com a “mágica” da transmissão de música sem fio dando aquele ar de coisa “do futuro”.

Então os novos sistemas são importantes por apontarem este caminho: a música estará com você. O som, em qualquer lugar. Eu já fui a algumas festinhas com docks para iCoisas, ou o fio largado lá para os “DJs” irem se revezando. O próximo passo disso é chegar a uma festa e mandar um “escuta isso” em uma conversa com os amigos, clicar no álbum e ouví-lo em alto e bom som. Faz muito mais sentido. E certamente será o caminho padrão dos aparelhos de som do futuro – espero que com suporte a outros protocolos que não seja exclusivamente o da Apple. Android ou (e especialmente) o Zune da Microsoft têm sistemas de gerenciamento de listas de reprodução melhores. Seria bom que eles falassem a mesma língua das caixas de som, e esperamos que Microsoft e Google dêem uma resposta ao AirPlay.

Mas voltemos ao “alto e bom som”. Isso é importante. O Fidelio Soundsphere tem uma qualidade de som incrível, que eu poderia passar horas usando adjetivos de pessoas chatas em áudio (algo como os enólogos que percebem “notas de couro” em um vinho) para tentar descrever, mas obviamente é preciso ouvir para crer. Em resumo, é algo próximo do que você ouve naquelas caixas monitores de estúdio, só que mais “quentes”, com reforços no médio (para a voz, cristalina, se destacar) e agudos abertos, e grave onde é possível distinguir a nota. O acabamento é impecável: são várias camadas de madeira, e há aquele tweeter/antena que possibilita uma maior dispersão do som, o que faz com que mesmo ouvindo a música “de lado”, o detalhe e a qualidade são incríveis. As caixas em si ficaram mais de sete anos sendo desenvolvidas e só foram liberadas para produção quando testes cegos de especialistas deram nota melhor para ele do que os concorrentes de mesmo preço. Conversamos horas com os engenheiros, apaixonados pela criação, e parece que eles deram bastante atenção às caixinhas.

E, por isso mesmo, o Fidelio Soundsphere, como produto hi-fi que é, é uma aposta bastante ousada também no preço. Ele custará 799 Euros (R$ 1.887) e chegará às lojas europeias em maio, e no Brasil, por um valor ainda não decidido, provavelmente no primeiro semestre. Aí vai a pergunta: quem pagará pelo menos R$ 2 mil em um par de caixas para ouvir com seu iPhone/iPod/iPad? Até ontem, os docks eram equipamentos de som “secundários”, para ficar no quarto, na sala ou serem levados na mala para uma viagem. Mas agora a Philips está dizendo que o sistema principal de som de uma sala não terá aquela caixa central e entrada de som. Nem será aquele home-theater-tudo-em-um com 5 caixinhas que saiu barato em uma promoção da Fast Shop. Fará sentido?

Talvez faça para uma raça em extinção: a das pessoas que prezam muito pela qualidade de áudio, e sabem discernir caixas com som nítido e limpo daquelas horrorosas e coloridas com 80 mols de Watts PMPO, que chacoalham os móveis dos vizinhos. Não à toa, a campanha da Philips para a série de produtos que o Fidelio Soundsphere faz parte chama “Obsessed with sound“. Eles querem resgatar as pessoas que gostam de áudio, que estão cada vez mais marginalizadas das marcas “mainstream” (para quem, R$ 2 mil é um investimento pequeno até), e atrair mais gente disposta a ouvir uma música mais ou menos da forma que o artista a concebeu. No evento em Barcelona, conversamos com Steve Lillywhite, um produtor lendário do rock, que produziu algumas obras-primas. Ele contou uma historinha: “Semana passada eu estava gravando uma orquestra no estúdio com Bono e The Edge do U2, em Nova York. Quando eu saí da sala da orquestra e fechei a porta do estúdio, ali na frente, já havia algo perdido na alma do som. Quando fechamos o arquivo de áudio, perdemos mais um pouco. Quando você ouve no som da casa, com caixas não muito boas, está perdendo mais. Nos headphones, em MP3 com qualidade ruim, mais ainda.” O engenheiro da Philips interrompeu pra dizer que o objetivo da empresa é “diminuir a perda”. ” Nunca vai ser igual. Mas queremos que fique parecido com o que o músico tocou no estúdio.” Parece um objetivo interessante.

Caixas de som boas, com mini-system sem o “system”. Acho que este é o futuro do áudio doméstico. Só espero que ele não custe tão caro quanto isso.

* O Gizmodo Brasil viajou para o Barcelona Media Summit 2011 a convite da Philips. E andou um bocado de bicicleta por lá.

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