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A morte lhe cai bem: Bloodborne, Final Fantasy Type-0 HD e as abordagens diferentes do fim da vida

Dois lançamentos recentes, Bloodborne e Final Fantasy Type-0 HD falam da morte de maneiras diferentes.

A morte é a única certeza na vida, diz um ditado popular. O fato de um dia perecermos pode ser um pensamento tão angustiante quanto reflexivo. Por isso, não é à toa que o tema é fonte para inúmeras produções artísticas, seja literária, cinematográfica e, claro, de jogos eletrônicos.

Assim como Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, trata o tema da morte de um modo mais leve ou um filme como No Limite do Amanhã (Edge of Tomorrow) a usa como mecanismo de narrativa, nos jogos o ato de morrer é utilizado de várias maneiras.

A morte em um jogo pode ser uma ferramenta para se ultrapassar um obstáculo, como sacrificar o Yoshi para pular mais alto em Super Mario World (admita, todos já fizemos isso uma vez) ou para causar um impacto e mudar todo o clima do jogo, como a morte de Aeris em Final Fantasy VII.

Mais recentemente, dois grandes lançamentos, Bloodborne e Final Fantasy Type-0 HD, apesar não possuírem tantas características em comum, têm na morte um elemento bem importante para a construção de suas identidades e cada um aborda isso de uma maneira diferente.

“Morreu”

Morrer é a experiência que você mais terá em Bloodborne. Talvez até a única, o que faz muitos se afastarem dele. Não é exagero dizer que a morte é essencial na jogabilidade do jogo da From Software e, assim como os demais títulos da série (Demon’s e Dark Souls), é o que o define.

Tanto que o jogador enfrenta o primeiro inimigo em Bloodborne, uma espécie de lobo gigante, quando ainda não está preparado para enfrentar ninguém, sem armas e causando danos que são cócegas para ele. Esse primeiro encontro é feito justamente para ensinar como é a morte no jogo.

A primeira morte em Bloodborne é proposital, mas será a única vez que o jogo força isso. Todas as mortes a partir daí, o culpado é única e exclusivamente o jogador. Você morreu por ser arrogante em pensar que já evoluiu o suficiente para matar com um só golpe, por ser ganancioso em acumular só mais esses “ecos de sangue” ou por não prestar a atenção na sua barra de estamina.

Isso faz com que a morte em Bloodborne não represente uma fatalidade, mas um processo de aprendizado e crescimento do jogador. Cada vez que se morre, você (normalmente) volta sabendo de algo novo, sabendo como abordar aquele inimigo ou chefe.

Fora isso, matar um inimigo não significa só passar de um obstáculo, mas também mais “ecos de sangue”, que são necessários para comprar equipamentos e evoluir o personagem. É pela morte deles que você pode ficar mais forte. É pela sua própria morte que você se torna um jogador melhor.

Essa é uma característica que já estava presente em Demon’s Souls e Dark Souls, mas aqui ela é mais evidente, já que o jogo é construído para atacar e se arriscar mais.

Pode até parecer que esse efeito de morre, ressuscita, morre de novo, ressuscita de novo faz com que a “vida” em Bloodborne fique banalizada, mas não, é justamente o contrário. É a morte constante que faz com que se valorize não ser um suicida correndo pra cima dos monstros, cada golpe tem que ser pensado e cada esquiva deve ser calculada.

Por isso, a morte é uma engrenagem tão importante para mover toda a máquina de Bloodborne.

(Não) lembrando daqueles que se foram

Imagine não conseguir lembrar dos amigos, pessoas queridas, ídolos ou até mesmo familiares que já morreram. Os momentos juntos, as risadas e a fisionomia deles foram completamente apagados de sua memória e as únicas provas de que eles realmente existiram são nomes estampados em lápides. É por isso que passam os personagens de Final Fantasy Type-0 HD.

No mundo de Orience, onde acontece o jogo, o uso dos cristais (um elemento presente em todo Final Fantasy) tem esse efeito colateral nas pessoas. Isso faz com o que o impacto da morte e o próprio conceito dela mude, além de dar todo o tom melancólico e pesado que esse spin-off da famosa série de JRPG tem.

Já nos primeiros minutos de jogo, vemos de forma brutal e crua como o tema da morte é abordado, ao vermos um soldado, no fronte de batalha, em seus últimos suspiros de vida ao lado de seu Chocobo.

O que surpreende é que ele não está corajosamente enfrentando a morte. O soldado chora copiosamente enquanto seu Chocobo agoniza ao seu lado. Ele sabe muito bem que vai virar mais um número na conta de baixas da guerra, mas talvez o desespero e o choro vem porque ele sabe que logo ele desaparecerá da memórias das pessoas que ama.

É uma cena forte, mas principalmente humana.

É interessante como o jogo consegue fazer dessa “morte esquecida” um elemento narrativo que ao mesmo aproxima e afasta os personagens do jogo, fazendo disso algo que enriquece o desenrolar da história. Um exemplo são os cadets das outras classes em Akademeia.

Só contextualizando, em Type-0 HD o jogador controlar os membros da class zero, que estão em uma espécie de academia militar, a Akademeia – mas que também possui outras 12 classes de aula, sendo que cada uma delas é especializada em algo. Pois bem, uma dessas outras classes, da qual não me recordo agora, possui os cadetes mais fortes, mas porque são justamente os que são mandados para o fronte de batalhas e, logo, são o que tem a taxa de mortalidade mais alta.

Ao conversar aleatoriamente com um cadete dessa classe, ele fala o quanto não quer se apegar aos seus colegas, porque ele sabe que amanhã ou depois, eles com certeza estarão mortos. Isso chega até a ser mais pesado que qualquer morte em Bloodborne.

Ao mesmo tempo, o jogo também apresenta uma figura de “não-morte” com os L’Ciel, pessoas que vivem por centenas, até milhares de anos, para cumprir o seu dever como representantes dos cristais que existem no mundo.

Os L’Ciel são quase imortais, mas apesar de parecerem ir contra a temática da morte, eles dão mais força a ela, já que são representados como algo alienado, distante do mundo e de todos, um retrato do quanto nos tornaríamos estranhos sem a morte para nos dar propósitos à vida.

Mas não é só como elemento da história que a morte é importante Type-0 HD, ela também é representada como uma mecânica dos Eidolons – as famosas invocações, tão comuns na série.

No jogo, para se invocar uma Shiva ou Ifrit, é preciso se sacrificar no campo de batalha. É a troca da vida por uma possibilidade de derrotar um inimigo mais forte. A única ressalva nesse quesito é justamente os protagonistas do jogo, por serem especiais, não morrem ao invocar as criaturas e só ficarem incapacitados depois na luta.

Se nos casamentos é a morte que separa duas pessoas, nos jogos é ela que une Bloodborne e FF Type-0 HD, mesmo sendo tratada de forma distinta. Pode ser uma relação direta do jogador com o jogo, como em Bloodborne, ou uma característica para enriquecer os laços com os personagens e a saber mais do game, como em Type-0 HD.

É claro que não é só esse elemento que faz, sozinho, tanto Bloodborne quanto Type-0 HD serem bons jogos. Ambos possuem outras características que podem se destacar, mas não há dúvida que a abordagem que eles fazem do tema da morte e, principalmente, como ela é aplicada em cada um deles os tornam mais ricos.


Bloodborne está disponível exclusivamente para PS4 e a cópia para análise foi cedida pela Sony.

Final Fantasy Type-0 HD está disponível para Xbox One e PS4. A cópia para análise foi cedida pela Square Enix.

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