De 2001 a 2020, a taxa de mortalidade dos brasileiros por hepatites virais registrou tendência de queda de 4 a 8% ao ano, de acordo com o subtipo da doença. No caso da hepatite viral crônica, a tendência estacionária do restante do país não foi acompanhada pelas regiões Norte e Nordeste, que tiveram um aumento de 6% e 5% ao ano na mortalidade da doença. Os dados são de pesquisa da Universidade Tiradentes, do Sergipe, publicada na segunda (3) na “Revista Brasileira de Epidemiologia”.
Os autores analisaram os dados públicos dos últimos 20 anos disponíveis no Sistema de Informação de Mortalidade, com auxílio da plataforma DATASUS. As inflamações do fígado conhecidas como hepatites são doenças passíveis de diagnóstico, podendo ser prevenidas com vacina (tipo B), e diferentes subtipos podem ser tratados com possibilidade de cura. “Hepatite A sempre foi uma doença curável. As hepatites B e C são as que podem causar câncer na evolução crônica. Com o advento da vacina, houve uma redução na mortalidade, porém ela não é acessível a toda a população, principalmente na região Norte e Nordeste”, explica a média cirurgiã Sonia Oliveira Lima, uma das autoras do estudo.
No Brasil, nos últimos 20 anos, foram registradas 49.831 mortes por hepatites. Considerados os números absolutos, a região com maior mortalidade foi a Sudeste, com 51% dos óbitos. A com menor mortalidade foi a Centro-Oeste, com 5% dos óbitos. A região Nordeste ocupou o terceiro lugar, com 13% das mortes. Quando analisadas as taxas de mortalidade, as médias brasileiras foram 0,88 mortes por hepatite viral crônica para cada 100 mil habitantes, quatro vezes maior que a taxa das outras hepatites virais (0,22 mortes para cada 100 mil habitantes). Na hepatite viral crônica, as regiões Sul e Sudeste ultrapassaram a média nacional, com 1,38 e 1,06 para 100 mil habitantes. A região Norte ultrapassou a média brasileira para hepatite A, hepatite B, outras hepatites e hepatite não especificada.
Os autores alertam para os estados do Acre e Amazonas, que, no período analisado, apresentaram as taxas de mortalidade por hepatite viral crônica mais altas do país. Ambos registram conglomerados espaciais com altas taxas de mortalidade em todas as hepatites. Essa ocorrência, afirmam os pesquisadores, pode ser explicada pela alta prevalência de soropositividade para o vírus da hepatite Delta (VHD) na região Norte, concentrando 77% dos casos nacionais.
O mestre e enfermeiro Jefferson Felipe Calazans Batista, doutorando em Saúde e Ambiente pela Universidade Tiradentes e também autor do estudo, põe peso nos fatores sociais para explicar os números: “Os dados reforçam a importância de investir no acesso e estrutura de saúde dessas regiões. Quando chamamos a atenção para a alta morbidade e mortalidade de uma doença que já existe prevenção e tratamento, isso se torna muito grave”.
Ao analisar uma amostra temporal considerável, os cientistas esperam que os resultados auxiliem o direcionamento das tomadas de decisão e as ações de educação em saúde relacionadas à prevenção e ao tratamento de hepatites no Brasil. Os próximos passos envolvem olhar com mais atenção aos cenários específicos do Acre e Amazonas para compreender os tratamentos disponíveis e estratégias para políticas de saúde mais efetivas.
A cirurgiã Lima destaca a importância da notificação. “Tiveram muitas mortes, classificadas como hepatites não especificadas, em que não é possível verificar qual tipo de hepatite era. Isso demonstra uma possível falha na notificação”, recorda. Ela recomenda que os médicos e gestores de saúde tenham mais treinamento e estímulo para incluir o diagnóstico exato no atestado de óbito para conferir um retrato epidemiológico mais real. Por fim, o enfermeiro Batista sugere a inclusão de exames periódicos para detectar hepatites de forma precoce na população brasileira.