Depois de milhões de anos de evolução, a nossa espécie, como uma banda de rock velha, começou a ficar confortável: seu típico Homo sapiens. Então, existe outra classe de humanos. Essa classe de humanos tem poderes espetaculares, como controle da mente ou a habilidade de manipular ondas eletromagnéticas e existe basicamente em franquias de super heróis, como X-Men (ou o clássico filme de 1999 estrelando Ben Stiller, Heróis muito loucos).
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Esses personagens não são lembrados pelo seu realismo, mas seriam eles tão implausíveis? É tão difícil acreditar que, em algum esforço de fim de carreira, os seres humanos finalmente se juntem para começar a evoluir asas, visão noturna ou o quer que seja?
No mais recente Giz Asks, nós perguntamos a biólogos evolucionistas, acadêmicos e futuristas se é possível que pessoas com habilidades super humanas estejam entre nós, ou estarão algum dia, e quais dessas habilidades são as mais plausíveis cientificamente. Eles nos contaram que, por mais que humanos mutantes provavelmente não estejam evoluindo ao nosso lado, existem certos cenários (uma mudança para Marte, por exemplo, ou uma devastação em grande escala relacionada ao clima) que podem trazer humanos com genética radicalmente diferente no futuro distante. Ou, através de modificação genética, nos próximos meses.
Scott Solomon
Scott Solomon é um biólogo, professor e escritor, autor de Future Humans: Inside the Science of Our Continuing Evolution. Atualmente ensina ecologia, biologia evolucionária e comunicação científica na Rice University in Houston, Texas.
É improvável que a seleção natural esteja operando atualmente para dar telepatia ou controle mental para as pessoas. E é seguro dizer que traços que desafiam as leis da gravidade, como o voo, provavelmente nunca vão evoluir nos humanos. Mas uma coisa que está sendo desenvolvida agora permite que façamos alterações no nosso DNA, por meio do uso do CRISPR/Cas 9, que é uma forma de edição de genomas, incluindo a princípio o genoma humano. Isso está desenvolvendo um cenário no qual, no futuro próximo, seja possível fazer mudanças em humanos e outros organismos de maneiras bem específicas e deliberadas… se estivermos falando de traços fisicamente possíveis.
Por exemplo, os humanos conseguem ver dentro de certo espectro de luz, então chamamos ele de espectro de luz visível, porque é onde nós vemos. Mas insetos em alguns casos podem ver luz que é invisível para os humanos, luz ultravioleta, por exemplo. Então isso significa que é possível para um organismo enxergar luz UV, nós apenas não temos a capacidade de fazer isso, porque nossas células fotorreceptoras nos olhos não são sintonizadas com esses comprimentos de onda de luz. Então, se nós soubéssemos toda a genética necessária para um inseto ver luz no espectro ultravioleta, ao menos em teoria seria possível alterar os nossos próprios genes para permitir que os humanos vejam luz no alcance UV também.
Mas se você mandar pessoas para Marte, e elas começarem a se adaptar à condição lá…
E, da mesma forma, alguns organismos conseguem detectar o calor no espectro infravermelho, por exemplo algumas espécies de cobras e alguns insetos. Então, de novo, se entendermos a genética, então ao menos em teoria poderíamos manipular os nossos genes para permitir isso em nós. Se nós deveríamos fazer isso ou não, é outra questão. Mas a história parece sugerir que quando humanos desenvolvem a habilidade de usar um tipo específico de tecnologia, nós costumamos usar.
Para uma nova espécie de humano se desenvolver [naturalmente], é necessário algum tipo de barreira reprodutiva. Seria necessário algo mantendo esse outro tipo de humano de procriar conosco e misturar os genes… Mas, se você mandar pessoas para Marte, e elas começarem a se adaptar à condição de lá, seja através de seleção natural ou deliberadamente editando os genes para tentar tornar a vida mais fácil de viver em outros planetas, isso pode levar a um caminho onde uma nova espécie evolua.
Peter Ward
Professor do departamento de biologia da Universidade de Washington, autor de diversos livros, mais recentemente ‘A New History of Life: The radical new discoveries about the origins and evolution of life on Earth’, com Joe Kirschvink
O assunto na verdade são supersoldados. Esse é o santo graal: conseguir uma criatura militar melhor. Nada é mais eficiente do que uma estrutura biológica, nem silício nem metal. Um soldado que é bem mais difícil de sangrar até a morte, um soldado que não precisa beber tanta água, ou não precisa comer por cinco ou seis dias, ou não precisa dormir, qualquer uma dessas coisas seria uma enorme vantagem na guerra. [Com o CRISPR] você pode colocar um novo gene em um organismo, ou você pode alterar um gene e ligá-lo após ele ter sido desligado. Os genes mais importantes são os genes regulatórios, eles são como generais que controlam centenas de outros genes, então ao mexer com apenas um deles você pode mudar muito sobre como um organismo parece ou como ele se comporta.
Ao mesmo tempo, também é uma forma de causar uma mudança que não é Darwiniana. Lamarck sempre é ridicularizado em aulas de evolução. Ele é o cara que disse que o motivo pelo qual as girafas têm pescoços compridos é que elas esticavam eles todos os dias, e todo esse estica as levou a dar à luz a bebês de pescoços compridos. Ha, ha, ha.
Mas em termos de comportamento, na verdade ele não estava tão errado quanto nós pensamos. Estamos descobrindo mais disso, por exemplo, as pessoas que passaram por combate, ou mulheres que sofreram abuso, que têm esses episódios terríveis na vida, causam mudança permanente, que então é passada para suas crianças. Essas são mudanças genéticas que estão de fato acontecendo com as pessoas. Isso é chamado de epigenética e também pode causar mudança evolucionária.
Em uma escala maior, a quantidade de stress que os americanos estão passando no momento, por causa de Trump, vai ter consequências evolucionárias.
Jennifer M. Gidley
Presidente do World Futures Studies Federation, professor adjunto no Institute for Sustainable Futures (University of Technology, Sydney) e autor de The Future: A Very Short Introduction e Postformal Education: A Philosophy for Complex Futures.
Os transumanistas de hoje dizem que a única forma dos humanos terem poderes super-humanos é através de melhora tecnológica, biológica ou genética. As visões mais extremistas de mistura de humanos com máquinas incluem ciborgues; a singularidade de Ray Kurzweil, a ideia de que o funcionamento humano pode melhorar tecnologicamente de maneira exponencial até a convergência; e o “neural lace” de Elon Musk, que une o cérebro humano com IA. Todas essas ideias ainda estão no reino da ficção científica, no entanto elas estão atraindo centenas de milhões de dólares em financiamento.
Ironicamente, a ideia de um humano desenvolver poderes super-humanos não é nova. Friedrich Nietzsche escreveu em 1883 sobre o Übermensch traduzido como: ‘Super-humano, ultra-humano, ou pessoa maior’. Sua ideia integrava a teoria evolucionista de Darwin com os escritos dos Idealistas Alemães sobre a evolução da consciência. Como Nietzsche, o filósofo francês Henri Bergson escreveu em 1907 sobre o super-homem surgindo do ser humano, da mesma forma que os humanos se levantaram dos animais. Em 1950, Teilhard de Chardin escreveu sobre o ultra-humano ou transumano, mas esse transumanismo era humanista e espiritual, e não tecnológico.
John Stewart
Membro baseado na Austrália do grupo de Evolução, Complexidade e Cognição da Universidade de Bruxelas, autor de The Evolutionary Manifesto e Evolution’s arrow: the direction of evolution and the future of humanity.
Algumas mutações genéticas aleatórias são incapazes de produzirem capacidades altamente complexas, como o voo com asas. É tão improvável quanto um terremoto em um vilarejo medieval rearranjar tudo para produzir uma cidade moderna. Isso acontece porque a evolução baseada em genes procede amplamente por meio de um processo cego de tentativa e erro. A grande maioria das mutações será danosa. Novas adaptações complexas podem ser descobertas apenas por meio do acúmulo de pequenos avanços no decorrer de muitas, muitas gerações. Bilhões de indivíduos devem morrer como experimentos falhos para produzir qualquer coisa através da tentativa e erro que seja complexo e adaptativo. Em contraste, podemos usar as nossas mentes inteligentes para reduzir a conta e procurar e então tentar as possibilidades visadas em nossas mentes. É muito mais eficiente e aceitável testar as mudanças em nossas mentes ao invés de produzir vários indivíduos mutantes, quase todos os quais morreriam como experimentos falhos. Como o grande filósofo Karl Popper colocou, “as nossas hipóteses morrem no nosso lugar”.
“É tão improvável quanto um terremoto em um vilarejo medieval rearranjar tudo para produzir uma cidade moderna”.
Também é altamente improvável que super poderes possam ser possibilitados por mudanças dentro dos corpos dos humanos. As atuais leis da física e da química não parecem permitir que mecanismos de carne e osso possam permitir, por exemplo, indivíduos de diferentes continentes se comunicarem tão efetivamente quanto eles conseguem usando smartphones. Certamente o típico super poder que os mutantes apresentados em filmes parecem inconsistentes com as leis conhecidas da natureza. Atualmente eles são coisas da ficção científica e provavelmente vão continuar assim.
Asia Murphy
Estudante de PhD, Ecologia, Penn State University
Eu diria que voo, controle mental, telepatia [são ao menos superpoderes plausíveis]. Eu não tenho certeza de como o controle mental e a telepatia poderiam ocorrer (apesar de você poder dizer “controle mental” quando fala de pessoas particularmente carismáticas junto com pessoas altamente impressionáveis). A habilidade de voar precisaria de uma reestruturação corporal, além de simplesmente conseguirmos asas. Precisaríamos de músculos muito melhores nas costas e no peito e, acredito, uma mudança no nosso centro gravitacional, que seria demorado e difícil. A visão noturna seria o mais fácil, embora também não seja fácil de alcançar simplesmente porque algum ancestral nosso era noturno.
Poderia um novo tipo de super-humano possivelmente evoluir junto com humanos comuns? Se esse tipo de humano super-mutado ainda for a mesma espécie que nós, pessoas comuns, então eu não acharia que seria mais provável que a mutação seja causada por um gene recessivo (pense no pequeno ‘n’ e não no N grande), e se eles ainda estão cruzando com nós humanos comuns, sobrariam cada vez menos mutantes puros (nn), mais “portadores” (Nn) e pessoas comuns (NN). Se eles viveriam junto conosco, isso dependeria do cenário.
Cenário 1: algo ruim acontece que as pessoas comuns (NN ou Nn) sejam selecionadas contra e os mutantes (nn) sejam selecionados a favor (digamos, atmosfera contaminada, e os mutantes conseguindo resistir ao veneno melhor do que nós). Nesse cenário, você teria mutantes eventualmente nos dominando, porque eles são selecionados para esse ambiente.
Cenário 2: a mutação é neutra, e os mutantes continuam cruzando conosco, pessoas comuns. Teríamos um cenário em que teríamos três tipos de pessoas andando por aí: pessoas normais (NN), portadores (Nn) e mutantes (nn).
Cenário 3: a mutação é ativamente danosa (sendo selecionada contra). Você teria um cenário em que quaisquer mutantes são retirados do campo genético (talvez morrendo cedo), e apenas os portadores e as pessoas normais continuam sobrevivendo. Isso se os mutantes forem a da mesma espécie que nós, pessoas comuns.
De qualquer forma, isso levaria muito tempo, então eu acho que a melhor chance de termos mutantes e pessoas normais vivendo junto ao mesmo tempo seria com eles sendo da mesma espécie dos humanos, mas com algo que acontecesse com um gene que causasse diferenças fenotípicas que pudessem ser levadas em frente.
Mark Lorch
Professor de Comunicação Científica, Escola de Matemática e Ciências Físicas, Universidade de Hull.
Alguns superpoderes sempre estarão firmemente presos ao campo da fantasia; para citar Star Trek, “você não pode mudar as leis da física“. Então, velocistas como o Flash e Mercúrio nunca vão conseguir consumir tanta comida necessária para alimentar suas corridas supersônicas. De forma parecida, a habilidade do Tocha Humana, de (reversivelmente) se transformar em um plasma superaquecido, pode continuar tranquilamente no campo da fantasia. Ela exige energia demais.
No entanto, existem muitos exemplos de “superpoderes” na natureza, então sabemos que eles são ao menos possíveis biologicamente. Alguns tipos de falcão podem ter algum tipo de visão telescópica, que é conquistada ao ter mais células fotossensíveis na retina. Morcegos têm ecolocalização, como a usada por Matt Murdoch (o Demolidor). Muitos animais têm o que podemos chamar de super-visão por causa de sua capacidade de enxergar UV. E temos o Magneto, que pode sentir campos eletromagnéticos. Isso não é tão distante das enguias elétricas, e até mesmo a humilde pomba pode sentir campos magnéticos.
Julia Boughner
Professora assistente, University of Saskatchewan
Existem toneladas de provas em fóssil de [novos tipos de humanos que se desenvolveram junto com os humanos comuns] no passado, então eu não vejo nenhuma razão para isso não acontecer no futuro.
Nós costumávamos achar que existia uma trajetória linear entre nossos ancestrais fósseis e os humanos modernos contemporâneos, mas quanto mais fósseis são descobertos, mais provas temos para sugerir que não existia só uma ou três linhas ancestrais, mas mais um feixe de espécies fósseis que foram em diversas direções e então, por algum motivo que ainda não sabemos, foram extintas. Nós somos o único parente vivo hoje em dia, mas perdemos diferentes espécies que existiram e viveram próximas umas das outras ao mesmo tempo, apesar de não no mesmo espaço.
“Não havia apenas uma linha ancestral, mas um feixe de linhas.”
Em termos de superpoderes que poderíamos ter evoluído, ou que gostaríamos de ver, eles seriam construídos em cima do que já temos. Por um lado, somos muito bons em matarmos uns aos outros.
Por outro, também somos incrivelmente bons em cuidar uns dos outros, e esse é o motivo pelo qual eu acho que prosperamos enquanto espécie, porque somos sociais e trabalhamos juntos e cooperamos. Portanto, enquanto entramos nessa parte perigosa da nossa história, quando estamos no antropoceno, e o clima está mudando, eu gostaria de nos ver enquanto espécie e, globalmente, como uma comunidade, desenvolver nossos superpoderes para além do nosso nível atual de empatia e compaixão e imaginação, para realmente alcançar um nível heroico, níveis de história em quadrinhos de inovação e invenção. Nós precisamos virar os nossos próprios heróis.