Necrópole escavada em Paris dá pistas sobre Lutécia, a 1ª capital francesa
Engana-se quem pensa que Paris sempre foi a principal cidade francesa: há 2.000 anos, a charmosa capital francesa era Lutécia, uma pequena vila de pescadores descoberta pelos romanos à beira do rio Sena. Misteriosa e alvo de diversas escavações ao longo da história, ela só virou Paris depois da queda do império romano no ocidente, por volta de 470 d.C..
Na última quarta-feira (19), arqueólogos anunciaram mais um capítulo de sua história: a identificação de uma ala inexplorada da necrópole de Saint James, depois de escavar o subsolo de uma movimentada estação de trem no centro de Paris.
Eles só encontraram o lugar por causa da pesquisa para a construção de uma nova ferrovia que deveria passar pelo local histórico. Por algum motivo, arqueólogos não encontraram a necrópole nas várias obras rodoviárias que atravessam o local desde a década de 1970.
Os arqueólogos franceses já suspeitavam que a nova obra passava perto da necrópole que um dia ficara ao sul de Lutécia. Segundo os cientistas, este foi o maior cemitério da cidade, parcialmente escavada no século 19.
Escavadores encontraram e perderam a necrópole várias vezes no decorrer dos séculos. Essa ala do cemitério, porém, só foi descoberta pela primeira vez agora. “Ninguém a via desde a antiguidade”, disse Dominique Garcia, presidente do Inrap (Instituto Nacional de Pesquisa Arqueológica Preventiva da França), que atuou nas escavações.
Saint James é uma entre as diversas necrópoles que existiram em Lutécia ao longo do império romano. Isso porque, na antiguidade, os espaços separados aos mortos e aos vivos eram muito distintos. O mais comum era que os grandes cemitérios ficassem na periferias das cidades e à beira das estradas.
O que tem na necrópole de Lutécia
Os cientistas identificaram 50 sepulturas, sendo a grande maioria do século 2. Há evidências de que os romanos abriram o local no século 1 e o abandonaram no século 4. Estima-se que o cemitério tinha 1,6 hectare – o que equivale a um campo de futebol e meio.
A equipe de arqueólogos identificou “densidade alta” e uma série de “sobreposições”. Isso significa que muitos corpos foram enterrados sobre outros no decorrer do tempo. Não há marcas de cremações, embora os dois métodos de sepultamento já existissem no período.
Em alguns dos caixões de madeira, ainda há vestígios de tábuas e pregos. Parte deles possui objetos que acompanham os cadáveres, como recipientes de cerâmica (xícaras, jarras e pratos) e vidro (garrafas balsamário e corpos).
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Moeda para Caronte
Os escavadores também identificaram moedas dentro das bocas ou ao lado dos corpos no caixão. Comum na antiguidade, essa prática servia como um “pagamento” para Caronte, o barqueiro que transporta as almas no rio que divide o mundo dos vivos e dos mortos.
Também há vários vestígios de sapatos, que permanecem por causa dos diversos pregos na sola. Nos defuntos, ou estão junto aos pés ou na lateral dos sujeitos. A equipe de cientistas também identificou uma cova única com o esqueleto de um porco inteiro. A hipótese é que o animal tenha sido uma oferenda aos deuses.
Diferente da escavação de Saint James em 1800, desta vez os arqueólogos vão remover todos os artefatos da necrópole para uma análise do DNA.