O que aconteceria se os insetos fossem extintos do mundo? Entenda a importância desses pequenos animais
Reportagem: Mateus Carvalho/Instituto Butantan
Os insetos fazem parte do grupo de animais mais populoso do mundo e representam aproximadamente 70% dos indivíduos que habitam o planeta Terra. Embora muitos deles pareçam desnecessários para os seres humanos, esses pequenos bichinhos desempenham vários papéis ecológicos e são importantes para o desenvolvimento e equilíbrio do ecossistema. Mais do que isso, o planeta poderia entrar em colapso em uma hipotética e, praticamente impossível, extinção dos insetos.
Os insetos são essenciais para a polinização e produção de alimentos, na reciclagem de substratos, na decomposição de matéria vegetal, na contribuição para o controle de pragas que atingem vegetações, além de servir de alimento para outras espécies.
“Se não tivéssemos os insetos, não teríamos alimentos suficientes por conta da falta de polinização que alguns deles fazem. Muitos animais também sofreriam ou seriam extintos porque os insetos servem de alimento para eles. Outro exemplo é o mosquito, que na fase imatura se desenvolve na água atuando como filtrador”, conta a curadora da Coleção Entomológica do Instituto Butantan, Flávia Virginio. “Esses são só alguns exemplos para mostrar que o meio ambiente ficaria totalmente desiquilibrado sem a presença deles”, acrescenta.
A importância dos insetos para a vida em geral, a relação estabelecida entre seres humanos e insetos, bem como a grande diversidade de insetos, faz com que a possibilidade de sua extinção seja impensável – mesmo que alguns, como o mosquito Aedes aegypti, sejam vetores de doenças mortais, entre elas a dengue. O que se pode fazer é controlar as espécies que causam algum tipo de prejuízo à população, como os transmissores de enfermidades e pragas agrícolas, por meio de seus “inimigos naturais” que podem ser outros bichos predadores e microrganismos, ou até mesmo pelo controle integrado, que envolve os controles manual, químico e biológico.
“É complexo pensar em extinguir ou tirar uma espécie de circulação de uma cidade ou país porque os insetos não veem barreiras geográficas. O Aedes aegypti, por exemplo, foi eliminado do Brasil durante um tempo por conta da ação organizada com o uso de DDT, um inseticida que contribuiu para o controle do Aedes à época. No entanto, em pouco tempo, já podíamos ver os mosquitos voando pelo Brasil porque os insetos continuam entrando no país, seja pelo mar por meio de navios estrangeiros ou por terra”, comenta Flávia.
Os mosquitos são vistos com mais frequência no dia a dia porque eles estão por toda parte, em ambientes externos e internos, já que se adaptam muito bem às cidades e até mesmo aos diferentes climas. Soma-se a isso a quantidade de ovos que uma única fêmea pode colocar durante sua vida, que pode variar entre 200 e 500, em média.
“A evolução dos insetos é muito rápida e eles estão sempre se adaptando. Os inseticidas acabam ‘forçando’ essa evolução, já que sempre estão selecionando os indivíduos mais resistentes a eles. Por isso, de tempos em tempos, o produto químico utilizado precisa ser trocado”, destaca Flávia.
A dieta pode explicar
Dentro dos diversos grupos de insetos há características específicas de alimentação, e isso explica algumas de suas “funções” no planeta – tanto para o bem quanto para o mal. Eles possuem diferentes sistemas bucais, que incluem mastigação, sucção, picada e lambida.
Os coprófagos, como o besouro rola-bosta, se alimentam de fezes e matérias orgânicas e são responsáveis por fazerem a reciclagem de ambientes e a decomposição de compostos. Já os necrófagos comem matéria animal em decomposição, atuando também como recicladores. As moscas de ordem Diptera e das famílias Sarcophagidae, Muscidae e Calliphoridae são alguns dos insetos que fazem esse trabalho.
Os frugívoros, como as moscas das frutas e os percevejos, são aqueles que se alimentam especificamente de frutas e frutos, enquanto que os fitófagos, como gafanhotos e grilos, se alimentam de folhas e caules de plantas. Ambos, frequentemente prejudicam economicamente a produção agrícola.
Há também os insetívoros, que são predadores ou também parasitoides de outros insetos e ajudam a manter a quantidade de várias espécies na natureza equilibrada – inclusive os bichos considerados “pragas”. As joaninhas, vespas e formigas são alguns dos insetívoros que predam essas pragas agrícolas.
Por fim, há ainda os hematófagos, que são os insetos que se alimentam de sangue e têm importância médica-veterinária porque podem atuar como vetores de patógenos (vírus, bactérias e protozoários), como alguns mosquitos, moscas e pulgas.
Uso de agrotóxicos e mudanças climáticas
Para proteger as plantações de insetos-praga, muitos agricultores utilizam inseticidas. Mas como estes defensivos agrícolas em geral não são específicos para determinados insetos, o uso indiscriminado desses produtos acaba prejudicando toda uma cadeia, inclusive aqueles insetos que são considerados como bioindicadores, bem como os que auxiliam o ser humano no controle natural e sustentável dos predadores e parasitoides.
“O grande problema é que quando um agrotóxico é jogado nas plantações, ele não cai para matar um determinado inseto. Neste caso, o produto acaba atingindo todos os grupos que estão ao redor de uma vegetação e mata, inclusive, aqueles insetos que podem servir como bioindicadores que, por serem mais sensíveis, indicam que o ar está puro e que a água está limpa”, explica Flávia.
As mudanças climáticas impulsionadas pelas ações humanas ameaçam a vida de alguns insetos no planeta. Um estudo desenvolvido em 2022 pela Universidade de Londres e publicado na revista Nature mostra uma queda de 49% no número de insetos em regiões afetadas pelo aumento da temperatura em relação a habitats naturais com pouca alteração climática.
O Brasil, por ser um país predominantemente tropical e com temperaturas mais elevadas, abriga uma boa parte da biodiversidade de insetos. “Aqui na região neotropical há condições ideais para o desenvolvimento de insetos porque é quente e úmido de forma geral. O Brasil é considerado uma região com uma grande área de biodiversidade, e por isso boa parte de insetos está aqui, sem contar as espécies que ainda não conhecemos e que, provavelmente, serão extintas antes de as descrevermos cientificamente”, completa Flávia.
O livro Viver no futuro, ainda tem clima para isso? Aquecimento global, seus impactos e a revolução dos artrópodes, que tem Flávia como uma das organizadoras, traz informações sobre como as mudanças climáticas afetam a vida dos artrópodes, que são animais com membros articulados como os insetos, e como o problema pode influenciar na vida dos seres humanos.