O que esperar da primeira produção brasileira do Netflix, estrelada por Felipe Neto?
O Netflix achou seu caminho para ser a HBO: apesar de a empresa não divulgar números exatos de audiência de cada programa, as indicações ao Emmy de suas produções originais e o barulho que elas fazem nas redes sociais indicam que, sim, as pessoas gostaram do resultado. E a expansão chegou ao Brasil: segundo matéria de hoje d’O Globo, a primeira série original brasileira, “A Toca”, estreia dia 9 de agosto, estrelada pelo vlogger Felipe Neto. E aí?
Felipe Neto é aquela figura que ficou conhecida na primeira leva popular de vlogueiros brasileiros, com seu programa “Não faz sentido”, onde o rapaz colocava o dedo na ferida em vários problemas, xingava muita gente e conquistava um público mais jovem que parava de consumir a TV tradicional. O número de visualizações foi aumentando, a atenção também, até que Felipe Neto foi parar no Multishow, e fez algumas pontas em programas de humor da Globo.
Agora, depois de seis meses negociando com o Netflix, Felipe Neto terá um novo caminho na internet: “A Toca” será um seriado de apenas três episódios de 30 minutos, no formato de mockumentary (falso documentário), contando a história de uma produtora chefiada pelo vlogueiro de 25 anos.
As negociações foram longas, mas aparentemente o que definiu que Felipe Neto seria a pessoa certa foram os tais algoritmos do Netflix. Segundo Jonathan Friedland, diretor de comunicação global do Netflix, os complexos algoritmos que acompanham cada usuário que assiste conteúdo mostraram que stand-ups de Rafinha Bastos e Danilo Gentilli e programas como “Pânico” agradavam muita gente. Hora, então, de apostar no humor.
Mas há uma diferença entre os algoritmos e a realidade por aqui: nos EUA, os algoritmos mostraram que muitas pessoas gostavam do ator Kevin Spacey e do diretor David Fincher. Com isso em mãos, o Netflix convenceu ambos a estrelarem “House of Cards”, o seriado indicado a 4 estatuetas do Emmy. Não há, no Netflix brasileiro, nenhum programa com Felipe Neto. Trata-se, assim, de uma aposta.
O motivo é simples: enquanto nos EUA o Netflix pode pegar tais dados e dizer “ei, Fincher, 30 milhões de pessoas assinam o Netflix por aqui, muita gente verá seu trabalho”, no Brasil ainda temos a vaga estimativa de que a empresa tem mais de um milhão de assinantes. Isso diminui as chances de reproduzir o processo – criar novos seriados, mas usando nomes já consagrados no cinema ou na televisão.
A favor do Netflix pesa a liberdade dada aos produtores de conteúdo. Felipe Neto conta que não teve que mostrar o roteiro do programa para ninguém da empresa, que confiou e não palpitou em nenhum processo. O discurso bate com o que foi dito por Jenji Kohan, criadora do seriado “Weeds” e que produziu “Orange is the New Black”, a produção original mais recente do Netflix americana. A escritora disse que essa liberdade e a certeza de produzir uma temporada inteira (e não só um piloto para tentar convencer um canal, por exemplo) fizeram com que ela trabalhasse do melhor jeito possível.
E é interessante ver que o Netflix brasileiro fará algo experimental: diferente dos outros seriados produzidos, “A Toca” terá um formato bem diferente e não muito comum ao público, o de falso documentário.
Mas, apesar do esforço e da liberdade do Netflix, há algo que me preocupa bastante: Felipe Neto faz sucesso com uma parcela bem jovem da internet brasileira. Uma garotada que nasceu e viveu a era da pirataria, e que ainda acha um absurdo pagar por qualquer conteúdo. E, sem grande apelo na televisão (como é o caso de Rafinha Bastos e Danilo Gentili), não consigo imaginar tantas pessoas se interessando pelo serviço por causa do programa. E um possível insucesso pode engavetar outros programas originais brasileiros. Esperamos que isso não aconteça, nas no dia 9 de agosto teremos uma ideia mais clara sobre o que o Brasil pode representar e significar para o futuro do Netflix. [O Globo]