Ciência

Palmeira infectada com bactéria letal libera gases que alertam plantas vizinhas sobre ameaça

Uma doença conhecida como bronzeamento letal vem devastando palmeiras nos EUA. A bactéria já está no Caribe e poderá chegar ao Brasil

Agência FAPESP* –Julia Moióli 

Uma doença bacteriana conhecida como bronzeamento letal vem devastando cerca de 20 espécies de palmeiras no sul dos Estados Unidos nas últimas duas décadas. O fitopatógeno já está presente em países do Caribe e, em breve, poderá chegar ao Brasil.

Estudo conduzido pela bolsista de pós-doutorado da FAPESP Jordana Alves Ferreira mostrou que as plantas infectadas liberam altas concentrações de compostos voláteis capazes de alertar palmeiras saudáveis ao seu redor sobre uma possível ameaça. Esses gases, descritos pela primeira vez na revista científica Plants, poderão ser usados na fabricação de insumos para tratar a infecção.

Causado pelo fitoplasma Candidatus Phytoplasma aculeata e espalhado para a planta pelo inseto-vetor Haplaxius crudus durante sua alimentação, o bronzeamento letal causa o escurecimento das folhas, apodrecimento e morte da palmeira devido ao entupimento do fluxo do floema (tecido pelo qual a seiva é transportada). O processo é seguido pela queda da copa da palmeira Sabal palmetto, nativa da Flórida. Além de ser responsável por perdas econômicas significativas para empresas paisagísticas e de viveiros, também reduz a proteção que essas plantas oferecem contra enchentes por meio da evapotranspiração da água das chuvas.

No caso do Brasil, estima-se que os danos seriam significativos: o país possui cerca de 280 mil hectares cultivados com coqueiro e produz 2 bilhões de frutos por ano para alimentação, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

A pesquisa desenvolvida por Ferreira na Embrapa Meio Ambiente teve o objetivo de buscar opções de tratamento para as palmeiras infectadas. Em trabalho anterior, conduzido na Universidade da Flórida, em Davie (Estados Unidos), com apoio de Bolsa Estágio de Pesquisa no Exterior (BEPE), a pesquisadora testou a aplicação de tratamentos com bioformulações diretamente dentro das plantas (técnica conhecida como endoterapia vegetal) usando um equipamento endoterápico pressurizado específico para palmeiras e desenvolvido no Brasil. Testes prévios, cujos resultados foram publicados na revista Analytical Methods, já haviam mostrado a capacidade da técnica de controlar lagartas de coqueiro, que causam prejuízo entre produtores nacionais, de forma rápida e com menos produtos.

No estudo mais recente, a bolsista desenvolveu um método de análise que envolve a técnica de cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (GC-MS, na sigla em inglês) e mostrou que as folhas das palmeiras infectadas liberam altas concentrações de biomarcadores voláteis (os compostos hexanal e E-2-hexenal) que avisam as plantas próximas sobre uma possível ameaça. Essas, por sua vez, passaram a liberar outros tipos de marcadores (3-hexenal e Z-3-hexen-1-ol), sabidamente emitidos por plantas sob estresse, caracterizando uma comunicação entre as plantas pelos voláteis. Já as palmeiras não infectadas ou ameaçadas não liberam os biomarcadores.

“A substância produzida pela própria planta na tentativa de se curar, defender e de alertar as demais é também um poderoso antibiótico, que pode ser utilizado no desenvolvimento de novas bioformulações para tratar as palmeiras usando a endoterapia vegetal”, afirma Ferreira, que publicou recentemente um artigo de revisão sobre a técnica na revista Agriculture.

Solução natural e de amplo uso

Apesar de estudos adicionais ainda serem necessários para detalhar a produção dos compostos voláteis, a descoberta abre caminho para uma série de possibilidades de tratamentos para plantas na agricultura. Exemplos são a avaliação de compostos que podem ser utilizados no tratamento de infecções, criação de estímulos para que as plantas gerem suas próprias defesas, desenvolvimento de impedimentos alimentares e atrativos para inimigos naturais de H. crudus.

Nos Estados Unidos, especificamente, a grande vantagem seria ter à mão uma substância natural alternativa ao antibiótico sintético tradicionalmente utilizado – a oxitetraciclina, não usada no Brasil –, capaz de causar problemas ambientais como a resistência que gera.

“É importante destacar ainda que tanto os voláteis descobertos quanto a endoterapia podem ser alternativas a serem testadas no tratamento de doença em outras plantas perenes”, completa Sônia Cláudia do Nascimento de Queiroz, pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente e supervisora do estudo.

O artigo Identification of Green-Leaf Volatiles Released from Cabbage Palms (Sabal palmetto) Infected with the Lethal Bronzing Phytoplasma pode ser lido em: www.mdpi.com/2223-7747/12/11/2164.

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