Ciência

Butantan desenvolve pesquisas usando peixe-zebra como biomonitor da qualidade da água

Modelo zebrafish é ideal para identificar contaminações por sua transparência durante o estágio larval, rápido desenvolvimento e reprodução em larga escala
Fotos: Renato Rodrigues/Comunicação Butantan

Reportagem: Guilherme Castro/Instituto Butantan

O Instituto Butantan está desenvolvendo pesquisas utilizando como modelo o zebrafish (Danio rerio), conhecido como peixe-zebra ou paulistinha, para monitorar alterações químicas e biológicas em águas de bacias hidrográficas, represas e efluentes, inclusive provenientes de desastres ambientais. O acompanhamento é feito por meio de um teste de baixo custo, capaz de identificar visualmente alterações morfológicas em embriões de zebrafish e indicar se há ou não alta toxicidade na água analisada.

Só em 2023, 19 mil pessoas sofreram com doenças de transmissão hídrica e alimentar (DTHA) – um número bem maior que o de 2015, por exemplo, quando foram registrados 10 mil casos, de acordo com a Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde. O guia Vigilância e Controle da Qualidade da Água para Consumo Humano, também do Ministério da Saúde, indica que desmatamento, processos de erosão, assoreamento e despejo de material contaminante estão entre as principais causas de alterações químico-biológicas dos recursos hídricos.

Com o objetivo de melhorar o processo de identificação de água imprópria para uso, os pesquisadores do Laboratório de Toxinologia Aplicada (LETA) do Instituto Butantan estão utilizando o teste de toxicidade aguda em embriões de zebrafish, modelo descrito nas Diretrizes para Testes de Produtos Químicos da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O experimento é internacionalmente reconhecido e capaz de dar resultados precisos em até 96 horas.

Por que utilizar o zebrafish?

O zebrafish tem semelhança genética com seres humanos de até 70%. Em relação aos genes que causam doenças nas pessoas, a semelhança chega a ser de 84%. Essa homologia genética garante que algumas partes do corpo humano e do organismo do peixe sejam parecidas, como o sistema imune, o sistema nervoso e o coração. A equivalência serve como princípio de precaução durante as análises utilizando o peixe-zebra: se a toxicidade da água é suficiente para afetar o Danio rerio, é muito provável que ela também cause dano às pessoas.

Substituto dos modelos animais tradicionais (como ratos e camundongos), o paulistinha é adequado à pesquisa por possuir, além da compatibilidade com o ser humano, características fisiológicas durante o estágio larval que facilitam a análise científica – como o corpo totalmente transparente e a presença de órgãos iguais aos do estágio adulto.

Outras vantagens são o baixo custo de produção dos testes que utilizam o peixe e sua alta reprodutibilidade: um único acasalamento de zebrafish adultos pode gerar 300 embriões, enquanto um camundongo pode gerar até 10 filhotes por parto. Diante desses ganhos, o uso do paulistinha como modelo experimental alternativo foi reconhecido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação em outubro de 2022.

Como funciona o teste?

O teste de toxicidade aguda em zebrafish é feito em placas de cultura e avalia a mortalidade e deformidades (propriedade conhecida como teratogenicidade) causadas por agentes tóxicos. Os embriões são colocados em pequenos recipientes e envolvidos com a água a ser examinada. O modelo absorve o material de estudo e fica suscetível a alterações físicas que podem ser facilmente identificadas.

Os resultados podem ser vistos em 24, 42, 72 e 96 horas do início do teste. Sem utilizar métodos invasivos, a análise, que com outros métodos levaria algumas semanas ou meses para dar resultados, pode ser conferida em dias.

De acordo com a pesquisadora científica do Laboratório Especial de Toxinologia Aplicada (LETA) Mônica Lopes-Ferreira, o estudo de toxicidade por meio de zebrafish dispensa gráficos. “É um teste ideal porque você consegue entender morfologicamente, visualmente, a partir do corpo do peixe, o que a água pode provocar – se há efeito teratogênico, ou seja, uma anomalia ou alteração corporal”, explica ela.

O teste também está de acordo com o princípio dos três R (redução, refinamento e substituição) que ajuda a racionalizar o uso de animais em pesquisas, já que demanda pouco tempo, espaço e custo.

“A importância do monitoramento por meio de zebrafish é que, independentemente de qual tipo de água seja, ela vai estar se relacionando e impactando a vida humana em alguma escala. Em um rio existem inúmeros animais utilizados para alimentação e que podem ser afetados por água contaminada. Essa mesma água também pode ser utilizada para irrigar uma plantação, por exemplo. Facilitar esse processo é garantir a precaução”, finaliza Mônica.

fique por dentro
das novidades giz Inscreva-se agora para receber em primeira mão todas as notícias sobre tecnologia, ciência e cultura, reviews e comparativos exclusivos de produtos, além de descontos imperdíveis em ofertas exclusivas