População indígena soma 1,69 milhão de pessoas no Brasil

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) identificou a existência de 1.693.535 pessoas indígenas vivendo no país, o que representa 0,83% da população
Censo da população indígena

Christina Queiroz | Revista Pesquisa FAPESP

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Em operações que envolveram 1,5 mil agentes censitários, lideranças indígenas, organizações da sociedade civil, tradutores, geógrafos e antropólogos, o Censo Demográfico de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) identificou a existência de 1.693.535 pessoas indígenas vivendo no país, o que representa 0,83% da população. Na edição de 2010, o levantamento registrou a presença de 896.917 indígenas, ou 0,47% do total de residentes. O crescimento de 88,82% observado entre os dois censos, no entanto, não pode ser atribuído somente a aspectos demográficos. Isso porque, na edição atual, o IBGE adotou mudanças metodológicas e inovações tecnológicas que permitiram ampliar o escopo da contagem de pessoas indígenas e sua distribuição pelo território brasileiro.
“Para conhecer o papel do componente demográfico nessa variação, ou seja, para estimar em que medida a população indígena está ou não em processo de recuperação populacional, precisamos ainda analisar dados sobre fecundidade e mortalidade, além de elaborar pirâmides etárias”, explicou a antropóloga Marta de Oliveira Antunes, do IBGE, durante o evento de divulgação à imprensa realizado no último dia 3 de agosto. Essas informações serão divulgadas pelo instituto nos próximos meses.
Uma mudança metodológica que impactou na contagem da população indígena envolve a pergunta: “Você se considera indígena?”. Em 2010, ela só era feita para pessoas que viviam em terras indígenas delimitadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Isso significa que o levantamento daquele ano pode ter deixado pessoas indígenas que vivem em cidades ou em regiões não demarcadas de fora da contagem. No ano passado, a questão foi também formulada para residentes de outros territórios com a presença de comunidades indígenas, para além das áreas reconhecidas formalmente pela Funai.
“Nas comunidades indígenas, cada recenseador contou com o apoio de pelo menos uma pessoa indígena para realizar a coleta de dados. Em alguns casos, essa equipe somava cinco pessoas, incluindo profissionais do IBGE, guias, tradutores e lideranças”, contou a antropóloga. Segundo ela, para chegar a todas as localidades, foi preciso fazer travessias em barcos, aviões, helicópteros e trajetos a pé em meio à mata fechada. Antunes explica que, antes de entrar em cada agrupamento, dentro ou fora de terras indígenas reconhecidas pela Funai, os recenseadores conversavam com lideranças para explicar o funcionamento do questionário. Muitas delas, antes de autorizar a entrada do IBGE, pediam para conversar com a própria comunidade. “O respeito a esses processos e os diálogos com populações locais foram fundamentais para que o Censo pudesse chegar a todas as localidades indígenas do país”, afirmou Antunes. Uma das evidências da eficácia da nova metodologia e do engajamento de populações indígenas com o processo de coleta de dados, segundo a antropóloga, é a taxa de não resposta do questionário registrada: apenas 1,7%. A média nacional foi de 4,23%.
No evento à imprensa, o geógrafo Fernando Souza Damasco, do IBGE, detalhou que a contagem foi feita a partir de mapeamentos e trabalhos cartográficos prévios, que permitiram identificar todas as localidades indígenas do país, para além de terras delimitadas pela Funai. “Essas iniciativas tiveram a participação de instituições e organizações da sociedade civil e lideranças indígenas, que nos enviaram pontos de referência e listagens de aldeias e comunidades. Além disso, utilizamos imagens de satélite atualizadas em tempo real”, detalhou o geógrafo. Por meio desses avanços metodológicos e do apoio tecnológico, foi possível fazer a coleta de dados, por exemplo, de povos que até pouco tempo atrás viviam isolados, indígenas em situação de abrigo e de comunidades que têm como característica a mobilidade territorial.
Dados do levantamento mostram que 44,48% da população indígena do país vivia na região Norte em 2022, totalizando 753,3 mil pessoas, enquanto 31,22% estava no Nordeste, o que corresponde a 528,8 mil indivíduos.

Amazonas e Bahia

Os dois estados com maior quantidade de pessoas indígenas são Amazonas (com 490,9 mil) e Bahia (com 229,1 mil), que reúnem 42,51% do total dessa população. Mato Grosso do Sul (116,4 mil), Pernambuco (106,6 mil) e Roraima (97,3 mil) vêm em seguida. Por outro lado, Sergipe (4,7 mil), Distrito Federal (5,8 mil) e Piauí (7,2 mil) eram os estados com menor número de indígenas.
Em 2022, os três municípios com a maior quantidade de pessoas indígenas também estavam no Amazonas: Manaus (71,7 mil), São Gabriel da Cachoeira (48,3 mil) e Tabatinga (34,5 mil). Já as cidades com as maiores proporções de população indígena eram Uiramutã (RR), onde 96,60% dos habitantes pertenciam a alguma etnia. Santa Isabel do Rio Negro (AM), com 96,17%, e São Gabriel da Cachoeira (AM), com 93,17%, vinham em seguida.
Do total de 72,4 milhões domicílios particulares permanentes ocupados no Brasil, 630 mil registraram ao menos um morador indígena, o que equivale a 0,87% do conjunto de domicílios. Dos 630 mil domicílios, apenas 137,2 mil ficavam dentro de terras indígenas (21,79% do total) e, neles, a maioria dos moradores era indígena. Fora das terras demarcadas, os domicílios em que residiam ao menos um indígena contavam com mais diferenciação étnica entre seus moradores.
Até o final de julho de 2022, o país tinha 573 terras indígenas declaradas, homologadas ou regularizadas pela Funai. Nelas viviam 689,2 mil pessoas – 622,1 mil eram indígenas (90,26%) e 67,1 mil não indígenas (9,74%). A terra yanomami nos estados do Amazonas e Roraima registrou o maior número de indígenas (27,1 mil), seguida pela Raposa Serra do Sol (RR), com 26,1 mil, e a Évare I (AM), com 20,1 mil.

Aumento de terras indígenas

Segundo Damasco, em 2010 o país contava com 505 terras indígenas. Em 2022 esse número subiu para 573. “Por conta de mudanças em processos de regularização, quatro delas foram suprimidas e 72 inseridas na base da Funai”, detalhou. Isso significa que há 501 terras indígenas que podem ser comparadas entre os censos de 2010 e 2022. Ao longo desse período, a população indígena residente no universo dessas 501 terras indígenas aumentou em 81,9 mil pessoas, ou seja, houve um acréscimo de 16,01% entre 2010 e 2022.
O Censo registrou crescimento de população vivendo em terras indígenas em todas as regiões do país, ou seja, no Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. Porém esse avanço não foi identificado em todos os estados. Roraima foi a unidade da federação com o maior aumento, enquanto Alagoas, São Paulo e Rio Grande do Sul tiveram variação negativa. Além disso, foi constatado que 867,9 mil indígenas viviam na Amazônia Legal – que abrange nove estados – em 2022, o que representa 51,25% do total. “Isso significa que metade da população indígena brasileira reside fora dessa região”, destacou Damasco. Segundo o geógrafo, no trabalho conjunto realizado com indígenas para captar dados do Censo, lideranças enfatizaram a importância de não associar imagens de indígenas exclusivamente à Amazônia Legal, na medida em que sua presença também é intensa em outras partes do território.

 

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