Em relatório independente, Facebook admite ter tido influência em genocídio no Myanmar

O Facebook admitiu em um post de blog nesta segunda-feira (5) que sua própria “avaliação independente de impacto nos direitos humanos” confirmou a influência da rede no genocídio perpetrado pelo Estado no Myanmar contra os muçulmanos rohingyas, pela resposta “devagar e ineficaz” do site às evidências de que estaria alimentando a perseguição ao povo minoritário. […]
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O Facebook admitiu em um post de blog nesta segunda-feira (5) que sua própria “avaliação independente de impacto nos direitos humanos” confirmou a influência da rede no genocídio perpetrado pelo Estado no Myanmar contra os muçulmanos rohingyas, pela resposta “devagar e ineficaz” do site às evidências de que estaria alimentando a perseguição ao povo minoritário.

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Para muitos usuários de Facebook no Myanmar, o site é o principal (ou mesmo único) portal de acesso à internet. Diversas reportagens da mídia confirmaram que os militares do país usaram o Facebook como, nas palavras do New York Times, uma “ferramenta para limpeza étnica… [Autoridades militares foram] os principais operadores por trás de uma campanha sistemática no Facebook que se estendeu por meia década e visou o grupo minoritário rohingya, de maioria muçulmana”.

A gigante das redes sociais escreveu que seu relatório independente, feito pela organização sem fins lucrativos Business for Social Responsibility (BSR), de San Francisco, “conclui que, antes desse ano, não estávamos fazendo o bastante para evitar que nossa plataforma fosse usada para fomentar divisão e incitar a violência offline”. Embora o Facebook tenha apontado que “pode e deve fazer mais”, a empresa também escreveu que o relatório da BSR enfatizou que a companhia agora estava se esforçando mais para não fomentar o genocídio (e também que a rede não podia ser colocada como única responsável pela perseguição, algo que ninguém alegou):

Ao longo desse ano, investimos pesado em pessoas, tecnologia e parcerias para examinar e resolver o abuso do Facebook no Myanmar, e o relatório da BSR reconhece que agora estamos tomando as ações corretivas certas.

O relatório da BSR também examina o complexo contexto político e social no Myanmar, que inclui uma população que entrou rapidamente na internet, uma estrutura legal que não reflete os princípios dos direitos humanos e tensão cultural, religiosa e étnica. Nesse ambiente, explica o relatório da BSR, o Facebook, por si só, não pode trazer as mudanças amplas necessárias para resolver a situação de direitos humanos no Myanmar.

O Facebook reconheceu que enfrenta dificuldades para monitorar usuários no Myanmar, porque ele é “atualmente o único país no mundo com uma presença online significativa que não se adequou ao Unicode — o padrão internacional de codificação de texto”. O site diz que contratou 99 falantes nativos do idioma do Myanmar para melhorar o “desenvolvimento e aplicação de nossas diretrizes”, também agindo em cima de 64 mil denúncias recebidas do Myanmar nos últimos meses:

No terceiro trimestre de 2018, vimos melhora contínua: agimos em cima de aproximadamente 64 mil peças de conteúdo no Myanmar que violavam nossas políticas de discurso de ódio, das quais identificamos proativamente 63% — em comparação com 13% no último trimestre de 2017 e 52% no segundo trimestre deste ano.

Horas depois da divulgação de um relatório da ONU em agosto, o Facebook baniu diversos líderes das Forças Armadas do Myanmar, incluindo o general sênior Min Aung Hlaing, assim como várias organizações do país. Em outubro, a rede também excluiu uma série de outras páginas que estavam envolvidas na disseminação de propaganda e desinformação em apoio da limpeza étnica. Mas uma reportagem da Wired mostrou que a culpa do Facebook na campanha violenta data pelo menos de 2013, quando a correspondente Aela Callan alertou a rede sobre o número de páginas disseminadoras de ódio que estavam surgindo:

Aela Callan, correspondente internacional em um programa da Universidade Stanford, se encontrou com Elliot Schrage, vice-presidente de comunicações globais do Facebook, em novembro de 2013 para discutir discurso de ódio e páginas falsas que estavam se espalhando no Myanmar. Callan voltou para a sede da empresa em Menlo Park, na Califórnia, no começo de março de 2014, depois de reuniões de acompanhamento com um funcionário de uma organização da sociedade civil de tecnologia do Myanmar para, mais uma vez, levantar os problemas com a empresa e mostrar ao Facebook “o quão sérios [o discurso de ódio e a desinformação] eram”, diz Callan.

Mas a grande burocracia do Facebook e a sua empolgação com o potencial do mercado do Myanmar pareceram se sobrepor às preocupações sobre a proliferação de discurso de ódio. Na época, a empresa tinha apenas um falante de birmanês, baseado em Dublin, na Irlanda, para rever todo o conteúdo em birmanês sinalizado como problemático, segundo o que disseram a Callan.

Uma investigação separada da Reuters descobriu que, no começo de 2015, ainda havia apenas “duas pessoas no Facebook que falavam birmanês revisando posts problemáticos”.

Embora o Facebook diga que vá fazer um trabalho melhor no futuro, já é um pouco tarde para os cerca de 700 mil muçulmanos rohingyas que a UNICEF estima que tenham fugido do Myanmar até abril deste ano, ou para os cerca de 25 mil que a ONU estima que tenham sido mortos. Em outros lugares do mundo, a lista de transgressões do Facebook segue crescendo: na semana passada, a empresa se desculpou por promover uma categoria de anúncios projetada para atrair usuários interessados em “teorias conspiratórias de genocídio branco”.

[Reuters]

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Imagem do topo: Getty

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