Maior vazamento da história revela corrupção mundial em 2,6 terabytes de dados
Uma equipe internacional de jornalistas obteve o “maior vazamento da história”: são 2,6 terabytes de dados sobre contas offshore e paraísos fiscais gerenciados pelo escritório jurídico Mossack Fonseca, do Panamá. Eles revelam esquemas de corrupção ao redor do mundo, e claro que o Brasil está envolvido.
Cem organizações de mídia no mundo inteiro vêm trabalhando nesse projeto – chamado de “Panama Papers” – ao longo do último ano. No Brasil, participam da investigação o UOL, o Estadão e a RedeTV!.
São mais de 11,5 milhões de arquivos, uma escala extremamente maior do que os telegramas diplomáticos revelados pelo WikiLeaks em 2010, por exemplo. Esta imagem mostra como o vazamento é gigantesco:
A escala dos #panamapapers. E isso apenas com uma empresa, em um paraíso fiscal. pic.twitter.com/yzg1PCBvsA
— Maurício Santoro (@msantoro1978) April 4, 2016
Os dados foram vazados ao jornal alemão Süddeutsche Zeitung por meio de um informante que usava meios de comunicação digital seguros. Como seria impossível lidar sozinho com tantas informações, o jornal procurou o Consórcio Nacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) para compartilhar a tarefa.
São cerca de 214 mil empresas offshore, abertas e fechadas em 21 países diferentes, entre 1977 e 2015. A Mossack Fonseca trabalhava com cerca de 14 mil intermediários, incluindo bancos e escritórios de advocacia, dos quais 403 eram do Brasil.
No Brasil
Eis alguns dos casos descobertos por jornalistas brasileiros:
– pelo menos 107 empresas offshore estão ligadas a personagens da Operação Lava Jato, e ainda não haviam sido mencionadas por investigadores brasileiros. Algumas dessas contas estão ligadas à empreiteira Odebrecht e às famílias Mendes Júnior, Schahin, Queiroz Galvão, Feffer (controladora do grupo Suzano) e a Walter Faria, do Grupo Petrópolis;
– a Mossack Fonseca também criou ou vendeu empresas offshore para políticos brasileiros e seus familiares, e há ligações com PDT, PMDB, PP, PSB, PSD, PSDB e PTB;
– documentos mencionam uma das contas atribuídas a Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara. Ela foi aberta por meio da offshore Penbur Holdings, administrada pela Mossack Fonseca; e os detalhes batem com a descrição feita na delação premiada do empresário Ricardo Pernambuco – ele diz que Cunha teria usado a conta da Penbur para receber propina. Cunha nega ter contas no exterior;
– Carlos de Queiroz Galvão, dono da construtora Queiroz Galvão, comprou duas empresas offshore em 2014, após a Polícia Federal ter deflagrado a Operação Lava Jato. Uma das empresas foi usada para movimentar uma conta no banco Crédit Agricole. A construtora diz que a offshore foi usada para comprar um imóvel no exterior;
– Joaquim Barbosa comprou um apartamento de 73 m² em Miami em 2012, enquanto era presidente do Supremo Tribunal Federal e relator do processo do mensalão. Ele usou uma companhia offshore criada pela Mossack, e aparentemente deixou de pagar um imposto de US$ 2 mil.
É simples: se eu devesse, será que as autoridades fiscais da Flórida já nao teriam me enviado a "fatura"?
— Joaquim Barbosa (@joaquimboficial) April 4, 2016
Quanto a este último caso, Barbosa respondeu no Twitter que trabalhou por mais de quatro décadas, boa parte delas “com remuneração elevada”, e que teria condições de pagar por um imóvel de R$ 600 mil.
O UOL lembra que “a lei brasileira permite a qualquer cidadão ter uma empresa num paraíso fiscal. É necessário, entretanto, que a operação esteja registrada no Imposto de Renda do proprietário”. Barbosa diz que a transação foi informada à Receita Federal e o imóvel “consta de todas as minhas declarações de IR”.
Countries with officials implicated in #PanamaPapers pic.twitter.com/H4DGmesj9g
— Amb. Arturo Sarukhan (@Arturo_Sarukhan) April 4, 2016
No mundo
O jornal britânico The Guardian também publicou uma série de artigos sobre possíveis casos de corrupção em outros países:
– detalhes sobre uma rede de acordos e empréstimos no valor de US$ 2 bilhões ligando o presidente russo Vladimir Putin e seus conhecidos mais próximos;
– revelações de como os membros da comissão de ética da FIFA estavam mais estreitamente relacionados com a corrupção do que se pensava;
– e uma offshore do primeiro-ministro da Islândia, Sigmundur David Gunnlaugsson, suspeito de ter escondido milhões de dólares nas Ilhas Virgens britânicas.
Há ainda o caso de uma offshore associada a Mauricio Macri, presidente da Argentina, e a dois familiares. Ela foi dissolvida em 2009 e não aparece nas declarações patrimoniais do político (na época, ele era prefeito de Buenos Aires). Um porta-voz do governo argentino diz que as contas não são de Macri, e sim do grupo familiar Socma, e garante que o grupo declarou essas contas.
A lista também inclui Xi Jinping, presidente da China; os reis Mohammed VI e Salman, de Marrocos e Arábia Saudita; o pai do primeiro-ministro britânico, David Cameron; e até mesmo celebridades como o jogador de futebol Lionel Messi e o ator Jackie Chan.
A Mossack Fonseca é o quarto maior provedor de serviços offshore no mundo. A empresa diz que os seus “serviços são regulados em vários níveis, muitas vezes com sobreposição de agências, e nós temos um registro de forte cumprimento das regras”, acrescentando que eles são “membros responsáveis da comunidade financeira e empresarial global”.
Confira mais detalhes no site da ICIJ: panamapapers.icij.org.