Novas evidências sugerem que humanos não caçaram rinocerontes lanosos até a extinção

Novas evidências genéticas sugerem que o clima mais quente foi o responsável por matar os rinocerontes lanudos no final da última era glacial. Até então, cientistas acreditavam que a extinção da espécie se deu pela caça excessiva de humanos contra o animal. Com ursos das cavernas, felinos dente-de-sabre, mamutes peludos, preguiças gigantes e lobos selvagens, […]
Um esqueleto de rinoceronte lanoso. Crédito: Fedor Shidlovskiy
Um esqueleto de rinoceronte lanoso. Imagem: Fedor Shidlovskiy

Novas evidências genéticas sugerem que o clima mais quente foi o responsável por matar os rinocerontes lanudos no final da última era glacial. Até então, cientistas acreditavam que a extinção da espécie se deu pela caça excessiva de humanos contra o animal.

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Com ursos das cavernas, felinos dente-de-sabre, mamutes peludos, preguiças gigantes e lobos selvagens, o Pleistoceno – época do Período Quaternário que ocorreu entre 1,8 milhão a 11 mil anos atrás – foi a casa de várias espécies gigantescas e que hoje existem apenas na memória. E, claro, havia o rinoceronte lanoso (Coelodonta antiquitatis), uma versão desgrenhada dos animais com chifres a que estamos acostumados hoje.

Pesando mais de 2 mil kg e apresentando uma saliência gigantesca no ombro, esses herbívoros impressionantes ocuparam um vasto território que se estendia da Europa Ocidental ao norte da Ásia. O reinado dos rinocerontes lanudos, que durou milhões de anos, chegou a um fim abrupto há cerca de 14 mil anos, com a Sibéria sendo o local final de sua longa permanência na Terra.

A caça excessiva de humanos e o fim da última era glacial são as duas causas tipicamente atribuídas à sua morte, embora falte um entendimento completo das razões de sua extinção. Agora, novas evidências genéticas publicadas na Current Biology têm dado um novo olhar a este período tumultuado da história evolutiva do nosso planeta, mostrando que, na verdade, foi a mudança climática que pôs fim a esta espécie.

Reconstrução artística de rinoceronte lanoso. Crédito: Wikimedia Commons

Reconstrução artística de rinoceronte lanoso. Imagem: Wikimedia Commons

Os pesquisadores Edana Lord e Nicolas Dussex, do Centro para Paleogenética – um empreendimento conjunto entre a Universidade de Estocolmo e o Museu Sueco de História Natural -, sequenciaram os genomas de 14 rinocerontes lanudos, extraindo DNA de amostras preservadas de tecido, osso e cabelo. A equipe desenvolveu estimativas do tamanho da população de rinocerontes lanosos ao longo do tempo sequenciando um genoma nuclear completo e reunindo mais de uma dúzia de genomas mitocondriais. Esta dúzia de genomas forneceu uma estimativa do tamanho da população feminina da espécie.

Combinados, os dados genéticos ofereceram uma estimativa de rinocerontes lanosos que viveram na Terra entre 29 mil a 18,5 mil anos atrás. Como os autores mostram no estudo, a população de rinocerontes lanosos era notavelmente estável e diversa nos milhares de anos que antecederam sua extinção. Os novos dados sugerem que esses animais estavam longe de serem varridos do planeta, milênios antes do fim da última era do gelo.

“Na verdade, não vemos uma diminuição no tamanho da população após 29 mil anos atrás”, explicou Lord em um comunicado à imprensa da Cell Press. “Os dados que examinamos vão até 18,5 mil anos atrás, o que é aproximadamente 4,5 mil anos antes de sua extinção. Logo, isso implica que eles diminuíram em algum momento nessa lacuna de tempo”, completou.

Rinoceronte lanoso. Crédito: Sergey Fedorov

Um rinoceronte lanudo bem preservado. Imagem: Sergey Fedorov

“Isso não é algo que sabíamos antes e indica que o declínio que levou à extinção aconteceu bem próximo ao desaparecimento final da espécie”, explicou Love Dalén, autor sênior do estudo e geneticista evolucionista do Centro para Paleogenética.

A nova análise de DNA também revelou que a espécie tinha adaptações especiais ao frio, como uma capacidade aprimorada de sentir as temperaturas quentes e frias. Esses animais também exibiam maior diversidade genética do que os mamutes lanudos e os rinocerontes que existem hoje.

No entanto, os dados não se encaixam com a noção de que os caçadores humanos da era do gelo levaram os rinocerontes peludos à extinção. Os humanos, como estamos aprendendo, eram ativos no norte da Ásia há cerca de 30 mil anos, muito antes do desaparecimento desta espécie. Além disso, a aparente estabilidade dos rinocerontes lanosos durante o período sugere que os humanos desempenharam um papel menor, senão desprezível, em sua morte.

“Descobrimos que, depois de um aumento no tamanho da população no início de um período de frio, há cerca de 29 mil anos, o tamanho da população de rinocerontes lanosos permaneceu constante e que, neste momento, a consanguinidade era baixa”, explicou Dussex no comunicado à imprensa.

O fato de a consanguinidade (que é o grau de parentesco entre indivíduos) ser baixa é bastante revelador, já que a falta de diversidade genética é um sinal revelador de uma espécie com grandes problemas. Claro, é possível que os humanos ainda tenham desempenhado um papel em sua extinção, mas Dalén acha que é improvável.

“De certa forma, acho que não é muito surpreendente que não vejamos um efeito da chegada humana. Um animal de duas toneladas, com um chifre de 1,5 metro e mau humor, talvez não seja algo que os humanos paleolíticos gostariam de cutucar com uma lança”, disse Dussex.

De fato, este artigo levanta um ponto importante: que os humanos são frequentemente culpados pelas extinções que aconteceram no final do Período Paleolítico Superior. Para os grupos minúsculos de humanos que lutavam para sobreviver ao ambiente hostil da era do gelo, parece exagero sugerir que eles poderiam exterminar espécies inteiras de herbívoros gigantes, sejam rinocerontes ou mamutes peludos. Dalén concorda.

“Pessoalmente, acho improvável que os humanos daquele período tivessem a capacidade de caçar uma espécie até a extinção, exceto em pequenas ilhas. O principal motivo é que, uma vez que uma presa favorita se torna rara, os predadores tendem a mudar para outra espécie. Além disso, para os animais maiores, como rinoceronte e mamute, me parece que o risco e a dificuldade de caçar esses animais seriam grandes demais para serem feitos em escala ‘industrial’”, afirmou o pesquisador.

Os restos preservados e reconstruídos de um bebê rinoceronte chamado Sasha, descoberto na Sibéria. Crédito: Fedor Shidlovskiy

Os restos preservados e reconstruídos de um bebê rinoceronte chamado Sasha, descoberto na Sibéria. Imagem: Fedor Shidlovskiy

Dito isso, sabemos que os primeiros humanos na Sibéria caçavam herbívoros menores, como bisonte-da-estepe, renas e boi-almiscarado.

“Embora eu não ache que os humanos sozinhos poderiam ter levado isso à extinção, certamente parece plausível que uma combinação da caça humana e a mudança ambiental impulsionada pelo aquecimento do clima pudesse ter levado à extinção de algumas espécies”, disse Dalén.

Quanto a como a mudança do clima tornou a vida tão difícil para o rinoceronte lanudo, essa continua sendo uma questão sem resposta. O aquecimento das temperaturas entre 14,7 mil e 12,9 mil anos atrás resultou no aumento da precipitação. “Minha hipótese é que a mudança na precipitação pode ter sido um elemento decisivo, já que pode ter levado tanto ao aumento da umidade no verão, resultando em mais pântanos, quanto ao aumento da cobertura de neve no inverno, tornando mais difícil encontrar comida”, explicou.

Para trabalhos futuros, a equipe gostaria de adquirir mais DNA para ampliar os estudos dessa lacuna entre 18 mil e 14 mil anos atrás – claramente uma época em que algo bastante infeliz começou a acontecer com os rinocerontes lanosos.

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