Na última sexta-feira (18), cronometristas (sim, isso realmente existe) de todo o mundo decidiram acabar de vez com os chamados “segundos bissextos” – segundos adicionados artificialmente para sincronizar os calendários com o tempo solar.
Com a decisão, a contagem dos segundos deixará de ser feita via astronomia, como acontece há 2 mil anos, e passará a ser pautada exclusivamente pelos relógios atômicos a partir de 2035. Para o ser humano, seria uma mudança quase que imperceptível, mas pode causar efeitos inesperados nas máquinas e sistemas informatizados.
Isso só acontece porque, ao longo do tempo, os segundos deixaram de ser tão precisos. Tradicionalmente, a unidade se definia por termos astronômicos – ou seja, um segundo equivalia à fração de 1/86.400 do tempo que a Terra demora para girar no próprio eixo (cerca de 24 horas).
Mas, a partir de 1967, metrologistas do BIPM (Escritório Internacional de Pesos e Medidas, na sigla em inglês) começaram a medir o tempo a partir do zero com os relógios atômicos. Assim, a duração oficial do segundo virou 9.192.631.770 vibrações de um átomo de césio 133.
Como a rotação da Terra apresenta uma ligeira alteração de ano a ano, o segundo astronômico acabou ficando mais longo que o segundo atômico. Por isso, em 1972 o BIPM inseriu um segundo extra – chamado segundo bissexto – ao final de um dia atômico.
Na prática, sempre que o tempo atômico está um segundo inteiro à frente, ele “para” por um segundo para permitir que a Terra o alcance. Em 1972, os cronometristas incluíram 10 segundos bissextos na escala atômica. Desde então, outros 27 também entraram na contagem.
Mais difícil do que parece
Como a rotação da Terra não é 100% precisa, adicionar esse segundo extra é uma tarefa bastante complexa. Hoje, então, o desafio é ainda maior: o tempo preciso tornou-se essencial para a infraestrutura informatizada e mudá-lo poderia causar um colapso nas máquinas.
Como o processo de combinar essas duas escalas de tempo ficou extremamente difícil – e desorganizado –, os especialistas sugeriram abandonar o segundo bissexto a partir de 2035.
Isso significa que toda a humanidade adotará o tempo atômico. Mas só por enquanto, até que encontrem um plano melhor para sincronizar os relógios atômicos com o tempo da Terra.
A prática de ajustar o calendário com um dia a mais, nos anos bissextos, para alinhar o ano civil de 365 dias com o tempo que a Terra leva até dar uma volta ao redor do Sol, começou há mais de 2 mil anos, com Júlio César. Ela só foi modificada no século 16 pelo Papa Gregório 13º, que deu origem ao calendário gregoriano – usado até hoje.
Por isso, deixar essa escala de tempo para os relógios atômicos não agrada a todos. A Rússia, por exemplo, pediu que a mudança no segundo bissexto fosse adiada porque isso exige diversas alterações no seu sistema de satélite Glonass, que incorpora o segundo extra.
Já o Reino Unido tenta não entrar na discussão porque tem um apreço histórico com o padrão astronômico consagrado no horário de Greenwich. Os EUA, por sua vez, apoiam o descarte do segundo bissexto.
Possíveis consequências
A questão está nos efeitos que essa mudança trará para a tecnologia. Um segundo é uma quantidade de tempo considerável quando falamos da internet ou da transmissão de dados, por exemplo.
As leis internacionais definem que pacotes de dados relacionados a transações financeiras sejam carimbados com o tempo preciso para que possam ser registrados e rastreados de volta via UTC (Tempo Universal Coordenado, na sigla em inglês), o padrão de tempo universal.
Agora sem os segundos bissextos, o UTC continuará existindo, assim como os fusos horários globais que se referem a ele. Mas a discussão da sexta-feira não foi assim tão simples.