Pesquisadores usam técnica CRISPR injetada no sangue para tratar doença genética rara
O sistema de editor de genes CRISPR se destaca na correção de mutações de doenças em células cultivadas em laboratório. No entanto, utilizar a técnica para tratar a maioria das doenças genéticas tem um grande obstáculo: colocar uma espécie de tesoura molecular no corpo e fazê-la “cortar” ou editar o DNA nos tecidos necessários. Agora, pela primeira vez, pesquisadores conseguiram injetar um medicamento CRISPR na corrente sanguínea de pessoas com doenças hereditárias para ajudar no tratamento das patologias.
O experimento é um trabalho das empresas norte-americanas de biotecnologia Regeneron Pharmaceuticals e Intellia Therapeutics. O CRISPR foi injetado no sangue de pacientes com Amiloidose por Transtirretina (ATTR), uma doença hereditária rara causada por uma mutação no gene que codifica a proteína transtirretina (TTR). Algumas dessas proteínas acabam se tornando tóxicas e prejudicando o funcionando de vários órgãos, entre eles fígado e coração.
No ensaio usando o medicamento CRISPR, quatro homens e duas mulheres com ATTR, entre idades de 46 e 64 anos, receberam uma partícula lipídica carregando dois RNAs diferentes: um mRNA mensageiro, que codifica a proteína Cas9 (componente CRISPR que corta o DNA), e outro RNA guia, para direcioná-lo ao gene da doença e atacá-lo. Depois do Cas9 fazer um corte, o mecanismo de reparo de DNA da célula cura a parte cortada, só que de maneira imperfeita e, assim, interrompendo a atividade do gene que causa a mutação.
Após 28 dias, três homens que receberam a maior das duas doses do tratamento tiveram uma queda de 80% a 96% nos níveis de TTR, o que significa que a técnica foi capaz de praticamente interromper a produção das proteínas tóxicas causadoras da ATTR. As porcentagens são um pouco maiores do que os 81% de média do remédio patisiran, que também estabiliza a doença, mas interrompe a produção de TTR temporariamente, o que exige que os pacientes sejam medicados periodicamente.
Além disso, os pesquisadores afirmam que pode levar meses para que os pacientes que recebam o tratamento CRISPR vejam os sintomas da doença diminuírem. Contudo, são poucos os efeitos colaterais relatados, e a abordagem do mRNA encapsulado em lipídeos é potencialmente mais segura do que outros métodos.
mRNA nas vacinas contra Covid-19
Se uma parte dessa notícia lhe soa familiar, é porque os termos RNA e mRNA ganharam força nesta pandemia graças ao desenvolvimento de algumas vacinas contra Covid-19. Por exemplo, os imunizantes da Pfizer/BioNTech e Moderna utilizam o mecanismo baseado em RNA mensageiro para enviar um alerta ao sistema imunológico do corpo humano, que então aprende a como se defender da ameaça do novo coronavírus. A técnica não é nova, e tem um destaque na pandemia porque o sistema é altamente adaptável, o que significa que pode ser usado no desenvolvimento de tratamentos para outras doenças.
No ano passado, o mesmo grupo de pesquisadores responsável por esta descoberta envolvendo a ATTR usaram o CRISPR para ativar uma forma fetal de hemoglobina para corrigir a mutação que causa a anemia falciforme. O tratamento exigia a remoção das células-tronco do sangue de pacientes com a doença, modificar essas células com a técnica CRISPR e por fim colocá-las de volta no corpo.
Também foi testada uma injeção direta de um vírus que codifica os componentes do CRISPR no olho de pacientes para tratar uma condição que causa cegueira.
[Science]