Pesquisadores americanos estão testando uma nova forma de tratar problemas cardíacos e derrames. A aposta é no transplante de mitocôndrias – organelas celulares responsáveis pela fabricação de ATP (adenosina trifosfato). As moléculas de ATP, por sua vez, funcionam como um depósito de energia das células. É ela que garante o combustível para que as reações celulares aconteçam.
Mais de uma década atrás, o pesquisador James McCully, do Hospital Infantil de Boston, notou que nenhum medicamento era capaz de salvar as mitocôndrias com defeito no tecido cardíaco danificado após uma isquemia — falta de fornecimento sanguíneo. Todo esse processo foi descrito nesta reportagem da National Geographic.
Então, veio a ideia: retirar mitocôndrias saudáveis do próprio paciente e colocá-las nas células afetadas. Assim, o tecido poderia ser curado sem o auxílio de remédios.
O transplante de mitocôndrias foi realizado algumas vezes. Uma criança sob os cuidados do cirurgião Sitaram Emani, no próprio Hospital Infantil de Boston, passou pelo procedimento. A cirurgia correu como o esperado, com as mitocôndrias saudáveis sendo absorvidas pelas células danificadas e ajudando na regeneração do tecido cardíaco.
Durante o procedimento, o paciente fica conectado à máquina de ECMO (oxigenação por membrana extracorporal). As mitocôndrias saudáveis são coletadas rapidamente e logo em seguida já são inseridas na pessoa através da artéria coronária, femoral, ou injeção direta na região comprometida. Essa mesma equipe operou 12 pacientes desde 2015. Desses, oito sobreviveram.
O coração é apenas um dos órgãos que pode se beneficiar do transplante de mitocôndrias. Kei Hayashida, pesquisador dos Institutos Feinstein de Pesquisa Médica, nos EUA, notou durante testes com roedores que algumas das mitocôndrias injetadas na artéria femoral chegavam ao cérebro.
Após a observação, os pesquisadores foram capazes de tratar três pacientes com AVC graças ao procedimento. Dois deles apresentaram resultados satisfatórios, enquanto o terceiro não se recuperou tão bem – provavelmente devido ao grande número de derrames que já havia tido.
Entraves
De toda forma, há algumas questões ainda não respondidas sobre o transplante de mitocôndrias. Em primeiro lugar, os pesquisadores não sabem ao certo se aplicar a injeção na veia femoral é suficiente para que as mitocôndrias cheguem ao coração. Resta a dúvida se colocá-las diretamente no tecido danificado é melhor ou não.
Além disso, não se sabe a quantidade de mitocôndrias que deve ser transferida para que a técnica seja bem sucedida. Em animais, os cientistas usam como base o peso do coração da cobaia, mas isso não se aplica a todos os tecidos. Quando considerado o músculo esquelético, por exemplo, é preciso injetar mais mitocôndrias por grama de tecido muscular.