Um terço da população do cágado-rajado está ameaçada por hidrelétricas, aponta estudo

Expansão das instalações de barragens no sul do Brasil aumenta o risco de extinção do cágado-rajado, espécie nativa do Brasil
Um terço da população do cágado-rajado está ameaçada por hidrelétricas, aponta estudo
Imagem: Raphael Zulianello/Reprodução

Texto: Agência Bori 

Estudo publicado na terça (27) na revista Journal of Applied Ecology revela que a expansão das instalações de barragens nos estados do sul do Brasil aumenta o risco de extinção do cágado-rajado, espécie de cágado de água doce endêmica da Mata Atlântica e dos Pampas, na América do Sul.

No pior cenário previsto, o cágado-rajado perderá quase 35% em distribuição geográfica, apontam pesquisadores das universidades federais dos estados de Goiás, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul, da UNESP Rio Claro e de organizações do terceiro setor.

Os autores criaram modelos de nicho ecológico que correlacionam os registros de ocorrência da espécie Phrynops williams com as variáveis ambientais que descrevem clima, topografia, solo e uso do solo a fim de mapear as prováveis áreas de bacia hidrográfica habitadas pelo réptil.

Depois, esses modelos foram sobrepostos aos dados de projetos hidrelétricos da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Para avaliar o impacto das barragens localizadas em regiões com presença do cágado-rajado, os pesquisadores levaram em consideração dois critérios: a perda de área de provável habitat da espécie e a quebra de conectividade entre as populações de cágado-rajado que se distribuem ao longo dos rios.

O trabalho revela o padrão geral dos impactos cumulativos dos empreendimentos sobre a distribuição da espécie. Segundo os autores, os resultados têm alto potencial de aplicação para subsidiar tomadas de decisão relacionadas à expansão da matriz hidrelétrica.

“Acredito que a publicação deste estudo é uma importante contribuição para a conservação do cágado-rajado”, explica André Regolin, biológo e um dos autores do trabalho.

De acordo com o estudo, as grandes usinas hidrelétricas têm os maiores impactos no cenário atual. No entanto, há ainda um alto número de pequenas centrais hidrelétricas planejadas que, se construídas, aumentarão mais de 50% da área impactada por este tipo de empreendimento, porque são projetadas para regiões consideradas pelos pesquisadores como sendo de alta e moderada prioridade de conservação.

Frente à ameaça, o estudo sugere que o status de conservação da espécie seja alterado para “Vulnerável” no Brasil. Nos países vizinhos, como Argentina, Paraguai e Uruguai, o estudo revela que o risco de extinção é ainda maior, onde a espécie está classificada como “Em Perigo”.

As usinas hidrelétricas são a principal fonte de energia elétrica no país e poder prever como afetam determinada espécie possibilita pensar também sobre alternativas de instalação de menor impacto, o que pode subsidiar a tomada de decisão do poder público.

“A análise de conectividade dá para direcionar onde é mais impactante. É uma visão mais global do que se tem projetado para toda a área de vida da espécie, um dado muito mais refinado. Foge de análises pontuais, que é o que a gente tem até o momento”, afirma Tobias Kunz, biólogo e também autor do estudo.

A metodologia utilizada pelos pesquisadores, afirmam, pode ser replicada para estudos com outros animais. “Seria pertinente no futuro elaborarmos um índice de viabilidade ambiental desses empreendimentos, nos quais não se considera só uma espécie, mas várias”, acredita Regolin.

Como próximos passos, os autores sugerem a possibilidade de estudar o design das barragens para identificação das que oferecem maior impacto. Além disso, apontam a necessidade de desenvolvimento de novos métodos para amostragem da espécie, processo necessário para o licenciamento de cada barragem e que não é viável em sua metodologia tradicional, além da colaboração conjunta com órgãos ambientais.

“Existem diversas lacunas de conhecimento sobre o cágado-rajado e será necessário investimento em pesquisa de ponta para poder avançar com propostas concretas para sua conservação”, conclui Regolin.

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