A língua do tamanduá é uma obra de arte evolucionária
Tamanduás são animais impressionantes. Eles, de alguma forma, conseguem sugar formigas de suas casas como um milkshake, com tal facilidade que até esquecemos como isso é estranho. E os cientistas concordam que, sim, as línguas dos tamanduás são estranhas. E também foram pouco estudadas.
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Um time de pesquisadores brasileiros está usando seu tempo para tentar entender essas pegajosas armadilhas de formigas. Como os tamanduás ficaram com esse apêndice estranho, enquanto seus parentes mais próximos, as preguiças e tatus, apresentam línguas mais normais? A resposta é, obviamente, adaptação evolucionária para suas dietas de formigas.
A morfologia geral da língua do Tamanduá Bandeira (Imagem: Daniel Casali)
“Toda a musculatura envolvida em mastigar é fortemente relacionada aos hábitos alimentares desses organismos”, disse o autor do estudo Daniel Casali, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, ao Gizmodo. “Tatus são generalistas, alguns se especializam em insetos e alguns são mais especializados em formigas e cupins”, o que significa ser mirmecófago. “Os tamanduás são quase exclusivamente mirmecófagos. Nós achamos que a pressão seletiva dessa dieta levou a um gradual alongamento de suas línguas.”
Um alongamento da língua cujos incríveis resultados parecem com isso:
O mais recente estudo do autor envolveu pegar amostras de 29 tamanduás que morreram em hospitais veterinários, ou foram coletados de estradas, de três espécies: o Tamanduá-Bandeira, o Tamanduá-Mirim e o Tamanduá-Anão. Depois de examinar as línguas de diversas formas com um microscópio, eles observaram uma seção transversal de formato oval de longa e estreita língua. A parte mais distante do crânio estava coberta de protusões irregulares, e a parte da frente é arredondada e lisa. A língua do Tamanduá-Mirim e do Tamanduá-Bandeira tinha pontas cônicas que a fazem se parecer com, bem, um pênis (o Tamanduá-Anão, não).
A ponta da língua do Tamanduá-Mirim (Imagem: Daniel Casali)
Além disso, a estrutura muscular da língua implica que ela provavelmente se alonga muito, de acordo com o artigo publicado recentemente no Journal of Morphology. Isso sugere que os músculos são desenhados especificamente para maximizar a velocidade e alongamento do órgão para se adequar ao comportamento de alimentação.
E, claro, ele todo é coberto de mucosas pegajosas. Mas não tem muitas papilas gustativas, como observado neste e em estudos anteriores – afinal, os tamanduás comem principalmente comidas e junto com elas, terra. “Portanto, é plausível especular que uma língua deficientemente adaptada à função do gosto pode ser adaptável para seus hábitos alimentares”, escrevem os autores no artigo.
Mas além da língua, Casali está mais impressionado com o crânio tubular do tamanduá, que é especializado para o movimento da fina língua. De fato, todo o animal parece ser adaptado para o seu propósito de comer insetos, rasgando ninhos de formigas com seus braços fortes, perfurando buracos com suas garras e colando sua língua de espaguete nos buracos que faz. A língua ainda tem chifres que podem ajudar a agarrar formigas e cupins enquanto o tamanduá explora formigueiros e cupinzeiros.
Estruturas com ganchos para capturar formigas (Imagem: Daniel Casali)
Casali também apontou que os parentes distantes pangolins evoluíram línguas completamente diferentes do mesmo formato. “Os mesmos órgãos em dois organismos diferentes dão uma estrutura similar externamente”, ele disse ao Gizmodo. “Mas quando olhamos os detalhes, eles são bem diferentes, e nós vemos essa convergência evolucionária. Eles chegaram ao mesmo produto por caminhos diferentes.”
De qualquer forma, aproveite o milagre da evolução que criou esses estranhos animais de língua de espaguete e cabeça comprida.
Imagem do topo: Malene Thyssen/Wikimedia Commons