Investidores querem que Apple ajude pais a protegerem crianças do vício em tecnologia
Dois grandes acionistas da Apple querem que a empresa de Cupertino proteja as crianças dos perigos de gadgets viciantes. Mas os motivos deles podem não ser puramente altruístas.
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Em uma carta aberta publicada nesta segunda-feira, o grupo de investimento Jana Partners junto com o Fundo de previdência dos professores do Estado da Califórnia destaca uma longa lista de preocupações sobre vício no uso de smartphones entre crianças e adolescentes. Com o título “Think Different About Children” (“Pense diferente sobre as crianças”, em tradução livre), a carta propõe que a Apple faça mudanças fundamentais em sua linha de dispositivos para proteger os pequenos.
Citando várias pesquisas com adolescentes da UCLA, Associação Americana de Psicologia e Escola de Medicina de Harvard, entre outras instituições, a carta diz que vários estudos ligam o uso excessivo de dispositivos inteligentes e mídias sociais a depressão, baixa auto-estima e falta de empatia. As crianças costumam receber o primeiro smartphone aos 10 anos, destaca o documento, indicando que a Apple não fez o suficiente para entender como os dispositivos afetam as crianças.
“Desafiaria o senso comum argumentar que crianças, cujos cérebros estão se desenvolvendo, não estão tendo pelo menos algum impacto, ou que a fabricante de um produto tão poderoso não tem o papel de ajudar os pais a asseguraram o uso [desses aparelhos] de forma apropriada”, diz a carta.
A carta propõe “passos iniciais” a serem adotados pela Apple, incluindo a criação de um comitê de especialistas no desenvolvimento de crianças para estudar como dispositivos inteligentes podem impactar no crescimento, em gastar mais recursos para informar os pais sobre perigos em potencial e curiosamente, adicionar uma camada adicional de controle parental nos dispositivos da Apple para garantir que as crianças “não estão recebendo o mesmo telefone de uma pessoa de 40 anos.”
Sendo bem claro, a Apple já conta com um controle parental nativo no iOS. Porém, ele é um pouco limitado. A ferramenta previne usuários de comprar ou assistir filmes adultos, esconde apps voltados para adultos em dispositivos compartilhados e permite desabilitar a câmera, por exemplo. A carta, no entanto, propõe mudanças dramáticas. Imagine um iPad que, por exemplo, com um tempo específico de uso, possa ser desligado ao acabar um determinado prazo.
Da carta:
“Por exemplo, o menu de configuração inicial poderia ser expandido, da mesma forma que um novo usuário escolhe idioma e fuso, para pais inserirem a idade do usuário e receber opções de configuração baseadas na faixa etária, as melhores pesquisas disponíveis sobre tempo de uso, restrição ao uso do aparelho durante certas horas, redução de disponibilidade de sites de mídias sociais, configurar um monitoramento parental e muitas outras opções.”
É interessante que a Jana queira que a Apple crie um controle parental nos dispositivos. Mas, francamente, nada tem impedido que os pais ponham em práticas as ações acima, como determinar uma regra para uso de telefone durante o café da manhã ou o jantar. Seria melhor os pais entenderem melhor o que é bullying, sobre privacidade e sobre as redes sociais que seus filhos utilizam.
A Jana quer, entre outras recomendações sensíveis, uma atualização de produto que visa o lucro. A Jana Partner e o Fundo de previdência dos professores do Estado da Califórnia detêm cerca de US$ 2 bilhões em ações da Apple. Barry Rosenstein, uma das fundadoras da Jana e uma das autoras da carta, é conhecida por ser uma investidora ativista e, historicamente, as recomendações dela resultam em grandes margens de lucro para fundos especulativos.
De fato, é possível até imaginar a campanha de marketing para um potencial update utilizando a mesma linguagem da carta: há muitas pesquisas de longo termo sobre o impacto de dispositivos inteligentes nas crianças, mas nenhuma delas fala sobre os potenciais riscos destes aparelhos para este público. A Apple pode promover sua responsabilidade em proteger as crianças, criando uma nova tendência entre competidores com novos controles parentais.
Os consumidores podem amar a ideia de automatizar este aspecto de cuidado dos pais e, como a Jana Partners bem sabe, os investidores vão adorar.
Em resposta à carta aberta, a Apple confirmou seu compromisso com proteção parental para crianças e disse que está trabalhando em “novos recursos e melhorias” para seus produtos.
“A Apple sempre teve cuidado com as crianças, e nós trabalhamos duro para criar produtos poderosos que inspiram, entretem e educam as crianças, enquanto também ajudamos os pais a protegê-las online”, disse um porta-voz da Apple em um comunicado enviado à Bloomberg nesta terça-feira (9). Além disso, o representante da empresa disse que “temos novos recursos e melhorias planejadas para o futuro para adicionar funcionalidades e fazer estas ferramentas [de controle parental] ainda mais robustas.”
Imagem do topo por Pixabay