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A expansão do mercado de games brasileiro se deve a mudanças no modo tradicional do trabalho

Ricardo Nakamura afirma que a migração para a distribuição digital é o principal fator da expansão do mercado de desenvolvimento e do consumo de jogos eletrônicos no País

Texto: Felipe Bruno/Jornal da USP

O setor de jogos eletrônicos mundial está em expansão, tendo movimentado mais de US$196,8 bilhões em 2022, segundo projeções da PwC. A pandemia de covid-19 influenciou nesses números, visto que foi responsável por popularizar o trabalho remoto e, além disso, obrigou que as pessoas ficassem confinadas dentro de suas casas, proporcionando o aumento no número de jogadores.

Essa área, que antigamente era associada a crianças e adolescentes, hoje alcança um público extremamente plural e diverso. Inclusive, de acordo com a empresa de pesquisa Euromonitor, 21% dos idosos acima de 60 anos jogam videogame com frequência, o que demonstra que estão cada vez mais conectados com o universo digital.

Nesse sentido, a indústria brasileira de desenvolvimento de jogos está acompanhando o crescimento mundial. É o que afirma a 9ª edição da Pesquisa Game Brasil (PGB), que constatou um acréscimo de 169% no número de estúdios desenvolvedores no Brasil em comparação a 2018 — de 375 para mais de mil.

Cenário brasileiro

Ricardo Nakamura – Foto: Currículo Lattes

Ricardo Nakamura, professor da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados (IEA), afirma que a migração para a distribuição digital é o principal fator da expansão do mercado de desenvolvimento e do consumo de jogos eletrônicos no País. “Na medida em que grande parte dos jogos digitais é distribuída pela internet, não mais no pacote físico, que tem que ser colocado numa loja e tem todos os desafios de logística, a gente vê essa expansão”, desenvolve.

Diante desse cenário, atualmente o Brasil é o maior mercado de games da América Latina e o 13º no ranking mundial, responsável por movimentar cerca de R$ 12 bilhões ao ano, de acordo com estimativas da Newzoo, e com investimento superior a mais de US$ 20 bilhões em empresas da área somente nesta década, segundo levantamento da XDS. Relativo à exportação, o relatório Brazil Games revelou que, em 2021, foi ultrapassada a marca dos US$ 50 milhões e os principais consumidores das produções nacionais são os Estados Unidos e a própria América Latina.

Segundo o docente, outro aspecto importante para essa realidade foi a mudança do modo tradicional de trabalho, que, especialmente após a pandemia, está cada vez mais descentralizado e vários projetos são terceirizados: “Na hora em que estúdios vão fazer um grande projeto, eles contratam ou subcontratam outras empresas que, às vezes, estão em diferentes países, para construírem um jogo e cada um fica responsável por algumas tarefas. Essa lógica de trabalho distribuído e remoto auxilia nessa expansão”.

Ainda conforme o relatório, as empresas brasileiras desenvolvedoras de jogos eletrônicos não possuem um foco único para produção, atuando em diferentes setores para atingir públicos variados e diversificando sua fonte de receita. Como destaque, estão os jogos de entretenimento e os jogos educacionais, respectivamente 76% e 12%, e os dispositivos que mais possuem produtos são celulares (38%) e computadores (20%).

Assim, o especialista analisa como isso influi na potencialização de outras áreas tecnológicas no Brasil: “Muitas vezes, essas empresas fazem projetos de jogos, mas fazem outros também, como de sistemas de treinamento ou de software para publicidade. Ao mesmo tempo, os projetos são multidisciplinares, então têm que contratar diferentes especialistas”. Dessa forma, ele complementa que, ao desenvolver sistemas variados e envolver profissionais de diferentes áreas, ocorre a troca de conhecimentos que ultrapassam o mercado de games e adentram toda a indústria de tecnologia.

Concentração regional

Apesar desse cenário positivo no Brasil, em que a produção está cada vez mais digitalizada e dos estúdios estarem presentes em todas as regiões do País, ainda há uma concentração na região Sudeste — mais de 55% das empresas estão aí localizadas. Isso ocorre por conta de uma histórica desigualdade regional, que influenciou para que esse nicho fosse iniciado nessa região, em especial em São Paulo e Rio de Janeiro, há mais de 20 anos.

Nesse âmbito, mais de 40% dos cursos cadastrados no Ministério da Educação (MEC) focados no mercado de jogos eletrônicos se encontram no Sudeste, sendo que apenas 0,27% deles são oferecidos pelo setor público. Além disso, os principais e maiores eventos relacionados com jogos da América Latina, como a Brasil Game Show (BGS), a Campus Party e a Comic Con Experience (CCXP), são realizados na cidade de São Paulo.

Futuro próspero

Segundo os relatórios que tratam da temática da indústria brasileira de jogos eletrônicos, existe a tendência de amadurecimento das pequenas e médias empresas da área — que já estão se mantendo no mercado há pelo menos cinco anos. “Dá para imaginar um amadurecimento desse grupo, que está apostando na criatividade e no lançamento de jogos inovadores com propostas diferentes, justamente pela agilidade de serem empresas pequenas trabalhando em projetos mais curtos”, desenvolve o professor.

Por fim, Ricardo Nakamura afirma que, na medida em que os estúdios atingem essa maturidade, eles criam um portfólio de jogos que demonstra competência para o cenário internacional. Consequentemente, entidades mundiais buscam a contratação delas para o desenvolvimento de  projetos inteiros — ou parte deles — por conta da descentralização do mercado, que permite o trabalho remoto.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira

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