No início de novembro, o grupo britânico Which?, uma organização de defesa do consumidor, alertou sobre a possibilidade de dispositivos inteligentes — incluindo a air fryer — estarem roubando dados e informações pessoais de usuários. De acordo com as informações, aparelhos de diferentes marcas começaram a solicitar localização precisa e permissão para gravar áudio.
A pesquisa afirma que, possivelmente, terceiros podem usar os dados coletados para fins de marketing. Além disso, muitos deles provêm da instalação dos aplicativos dos dispositivos. Isso porque o usuário precisa realizar um cadastro para que os aparelhos funcionem conforme as recomendações das desenvolvedoras.
Considerando a vigilância excessiva, a organização classificou marcas de air fryers, smartwatches, smart TVs e alto-falantes inteligentes em diferentes categorias, avaliando sua privacidade. O levantamento considera fatores como consentimento, transparência, segurança de dados, minimização de dados, rastreadores e exclusão de dados.
“Nossa pesquisa mostra como os fabricantes de tecnologia inteligente e as empresas com as quais eles trabalham atualmente conseguem coletar dados dos consumidores, aparentemente, de forma imprudente, e isso geralmente é feito com pouca ou nenhuma transparência”, disse Harry Rose, editor da revista Which?.
Segundo as análises, o aplicativo das fritadeiras da Xiaomi se conectou a rastreadores do Facebook, da Pangle (rede de anúncios do TikTok for Business) e da Tencent, por exemplo.
Já as air fryers da Aigostar solicitaram o gênero e a data de nascimento — ainda que opcionalmente — para configurar a conta de proprietário, sem especificar motivo. Conforme sinalizado no aviso de privacidade, ambas as marcas enviaram os dados pessoais para servidores na China.
Air Fryer roubando dados é um risco à segurança
Segundo Lucas Galvão, CEO da Open Cybersecurity, “ao aceitar os termos de uso de dispositivos inteligentes, os usuários muitas vezes acabam cedendo acesso a dados íntimos – como hábitos diários, localização e até gravações de áudio para as corporações fabricantes.”
Além da mídia direcionada, ele aponta que o principal risco é a falta de controle de como a empresa utilizará os dados. “Sem um sistema de proteção e uma política de privacidade rigorosa, essas informações podem ser expostas a hackers. Isso leva a situações de roubo de identidade, golpes e até manipulação de perfis de consumo. Em alguns casos, esses dados são comercializados para terceiros, o que expande ainda mais a rede de exposição dos usuários”, alertou.
“O que acontece, então, é que o usuário se torna um produto – suas informações pessoais passam a circular entre anunciantes, empresas de dados e até em mercados paralelos, onde a privacidade é desconsiderada”, disse. “Em um cenário assim, vale refletir: estamos dispostos a trocar nossa privacidade por um pouco de conveniência tecnológica?”
Raphael Santos Marques, co-fundador da Tech do Bem, ressalta que o risco de vazamentos de dados devido a falhas de segurança pode expor informações sensíveis. Ele explica ainda que “a agregação de dados de múltiplas fontes pode permitir a criação de perfis detalhados sobre indivíduos”.
“Isso vai muito além de simplesmente saber suas preferências de compra. Essas empresas podem coletar informações sobre sua saúde, situação financeira, orientação política e muito mais. O perigo real está no uso potencial desses perfis para tomadas de decisão automatizadas que podem afetar áreas críticas da sua vida, como chances de conseguir um emprego, aprovação de crédito ou até mesmo o preço de um seguro”, exemplifica.
Como usar aparelhos inteligentes sem comprometer seus dados pessoais?
Por fim, o especialista faz recomendações para minimizar o acesso aos dados pessoais sem comprometer – muito – a funcionalidade do produto. Algumas delas são:
- revisar as configurações de privacidade do dispositivo e do aplicativo associado e desativar coletas de dados não essenciais;
- usar um e-mail secundário e informações mínimas ao criar contas para esses dispositivos; evitar conectar o dispositivo a redes sociais ou serviços não essenciais;
- e usar uma rede Wi-Fi separada para dispositivos IoT.
Contudo, ele pontua: “se a questão da privacidade é uma prioridade, o ideal é optar por dispositivos que ofereçam controle local, reduzindo a necessidade de conexão constante com servidores externos.”