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Por que os próximos astronautas a irem à Lua talvez tenham que se preocupar com choques elétricos

Imagine que você é um astronauta e está dando uma olhada na superfície cinzenta e gelada da Lua. Você está em uma missão de campo, verificando alguns instrumentos, e enquanto caminha em direção a um detector de poeira lunar, nota como as estrelas parecem brilhantes – quase não dá para acreditar que está na Lua, […]

Ilustração por JoAnna Wendel

Imagine que você é um astronauta e está dando uma olhada na superfície cinzenta e gelada da Lua. Você está em uma missão de campo, verificando alguns instrumentos, e enquanto caminha em direção a um detector de poeira lunar, nota como as estrelas parecem brilhantes – quase não dá para acreditar que está na Lua, fazendo a ciência acontecer e…

ZAP! Uma faísca pisca na sua mão, e o seu traje espacial brilha. Você confere se houve algum dano, no seu traje e nos equipamentos. Felizmente, tudo parece estar em ordem. Essa foi por pouco.

Embora esse cenário seja inteiramente hipotético, alguns cientistas estão preocupados com a possibilidade de a superfície carregada e cheia de poeira da Lua dar choques em instrumentos ou roupas espaciais, da mesma forma como podemos levar choque ao tocar numa maçaneta depois de caminhar por um chão de carpete – com exceção de que na Lua não precisaria haver contato com nenhum objeto.

A superfície da Lua carrega uma carga elétrica porque está exposta ao vento solar, um fluxo de partículas carregadas – elétrons com carga negativa e íons com carga positiva – que constantemente saem do Sol.

O campo magnético da Terra nos protege dessas partículas altamente carregadas, mas a Lua não tem esse mecanismo de defesa. Esses elétrons e íons de fluxo livre fazem com que a superfície da Lua se torne carregada.

Junto com essa carga, há também a poeira que compõe a camada superior da superfície da Lua. Essa poeira está em todos os cantos, é irregular e abrasiva. Em um traje espacial, a poeira pode se tornar um condutor de elétrons, o que pode levar a um choque, como explica Joseph Wang, físico de plasma da Universidade do Sul da Califórnia.

Quando enviarmos humanos de volta à Lua – seja em 2024 ou depois – “a poeira estará grudada em cada superfície”, disse Wang. Não importa o que você faça, “a poeira lunar vai grudar”.

Wang e seus colegas queriam saber se a poeira lunar poderia aumentar as chances de os futuros astronautas na Lua tomarem choques.

É claro que os humanos já caminharam na Lua e permaneceram lá por dias, em múltiplas missões, durante o programa Apollo. Esses astronautas nunca relataram problemas com choques elétricos, fosse em seus equipamentos ou em seus corpos, como aponta Jim Rice, um cientista sênior do Instituto de Ciências Planetárias do Arizona.

Mas Wang disse que isso se deve ao fato de as missões Apollo terem operado em regiões onde, durante o dia, estavam banhadas pela luz solar.

A luz solar em si não é carregada, mas os fótons que atingem a superfície da Lua podem disparar elétrons num processo conhecido como emissão fotoelétrica. Os elétrons que partem deixam para trás uma superfície com carga mais positiva, que equilibra as cargas negativas trazidas pelos elétrons do vento solar. Com as duas cargas mais equilibradas, os choques são menos prováveis.

Mas a NASA quer que os humanos aterrissem no pólo sul da Lua, onde a luz do sol bate num ângulo baixo e as regiões que estão sempre à sombra retêm o gelo d’água. Nessas áreas, os elétrons do vento solar dominam, e há pouca luz solar para carregar positivamente a superfície.

Segundo Wang, que apresentou a pesquisa de sua equipe no Encontro de Geofísica dos EUA, regiões que ficam à sombra na Lua acumulam grandes cargas negativas – “centenas a milhares de volts negativos”, segundo o resumo.

Rice não acredita que os choques nos astronautas precise ser uma grande preocupação, baseada nas experiências passadas dos astronautas na Lua. No entanto, ele admitiu que não sabemos o que aconteceria se, no futuro, os astronautas precisassem mover materiais carregados com escavadeiras lunares ou outros tipos de equipamentos.

Para testar se os trajes espaciais poderiam contribuir para os choques elétricos na Lua, Wang e sua equipe colocaram amostras de Gore-Tex (um tecido usado em roupas espaciais) em câmaras de vácuo com um simulador de solo lunar que imitava a composição química do regolito da Lua.

Algumas das amostras do traje estavam cobertas de pó, enquanto outras estavam limpas. A equipe jogou um jato com plasma nas amostras, para ver quais estariam vulneráveis.

Como Wang suspeitava, as amostras de Gore-Tex empoeiradas sofreram curvaturas de choque mais frequentemente do que as amostras limpas, porque as partículas de solo perturbaram a superfície uniforme do traje espacial.

Tais rupturas podem permitir a descarga de elétrons. Imagine uma pista de esqui: uma pista suave permitiria aos esquiadores descer a pista sem perturbações. Mas coloque deformações nessa pista, como poeira num traje, e é mais provável que os esquiadores atinjam esses obstáculos.

O que isso significa para os futuros astronautas? Wang não tem a certeza. “Demonstramos que a deformação pode ocorrer no material do traje espacial em uma simulação da superfície lunar em um ambiente de plasma”, disse ele. “A próxima pergunta é: as deformações podem causar danos ao traje espacial?”

Se esses choques seriam capazes de danificar equipamentos essenciais ou até mesmo os próprios astronautas são outras questões a serem respondidas.

JoAnna Wendel é uma cartunista e escritora de ciências em Washington, DC. Ela adora espaço, planetas, rochas, e seu gato, Pancake. Você pode encontrar seu trabalho no joannawendelcomics.com e segui-la no Twitter na conta @JoAnnaScience.

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