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Bezos não garante que Amazon siga regras da própria empresa para proteger vendedores

Amazon tem regra que divisão que cria produtos próprios não deveria acessar dados de vendas do marketplace; Bezos não garante que isso funciona.

Jeff Bezos durante audiência no Congresso dos EUA. Crédito: Graeme Jennings/Pool (Getty Images)

Jeff Bezos durante audiência no Congresso dos EUA. Crédito: Graeme Jennings/Pool (Getty Images)

Nesta quarta-feira (29), durante a grande audiência antitruste de empresas de tecnologia no Comitê Judiciário da Câmara dos EUA, o CEO da Amazon, Jeff Bezos, disse que não podia garantir que a empresa não tenha violado suas próprias políticas de concorrência justa para proteger vendedores independentes em sua plataforma de comércio online.

Antes de ir para os detalhes, vale contextualizar um pouco a situação. Há várias formas pelas quais os clientes comprar pela Amazon. Em alguns casos, a empresa compra produtos no atacado de fornecedores e os revende para os clientes — essas são “vendas primárias”, feitas pela própria Amazon, que atua como varejista neste caso.

É comum também que comerciantes usem a Amazon como loja digital; alguns enviam os produtos por conta própria, enquanto outros mandam os itens para os armazéns da Amazon, permitindo que a companhia cuide da logística e do atendimento ao cliente.

Além disso, existem marcas próprias da Amazon, como a Amazon Basics (ainda não disponível no Brasil), que são produtos feitos sob encomenda da própria marca.

Bezos ressaltou a proliferação de vendedores independentes na Amazon como evidência de que a empresa não está tentando suprimir a concorrência no mercado eletrônico.

Isso pode ser um fator importante em qualquer processo antitruste, já que a Amazon controla cerca de 38% das vendas de comércio eletrônico nos EUA. Em abril de 2019, ele disse que as vendas próprias haviam caído para 42% das vendas brutas de mercadorias, enquanto as vendas de terceiros eram 58% e aumentavam a cada ano.

No entanto, essa defesa só funciona se a Amazon estiver jogando limpo com vendedores independentes em vez de, digamos, usar táticas secretas para minar seus negócios.

A empresa diz que tem uma regra interna que a proíbe de coletar qualquer coisa, exceto dados agregados de vendas de terceiros, mas entrevistas com mais de 20 ex-funcionários feitas pelo Wall Street Journal e publicadas em abril de 2020 sugeriram que era comum que colaboradores violassem ou quebrassem essas regras para obter uma vantagem competitiva em produtos da linha própria.

O Wall Street Journal também informou que, ao juntar dados de apenas dois vendedores, a Amazon já passa a considerá-los como “agregados”, e que esses dados foram usados pela empresa para planejar lançamentos de novos produtos ou marcas próprias.

Embora a empresa tenha dito ao WSJ que as marcas próprias representavam apenas 1% dos seus US$ 158 bilhões em vendas anuais no varejo (sem contar os dispositivos da Amazon, como alto-falantes Echo, Kindles e câmeras Ring), ex-executivos da Amazon afirmaram que receberam metas incrivelmente ambiciosas para aumentar as vendas internas da marca para 10% das vendas no varejo até 2022.

À época, a Amazon disse ao Wall Street Journal que acessar tais dados era contra suas políticas e que uma investigação estava em andamento. Durante a audiência desta quarta-feira, Bezos disse à congresssta Pramila Jayapal que ele “não podia garantir que essa política nunca foi violada”.

“Continuamos a analisar isso com muito cuidado”, acrescentou. “Ainda não estou convencido de que chegamos ao fim [dessa investigação] e continuaremos analisando. Não é tão fácil como parece, porque algumas das fontes da reportagem são anônimas.”

Bezos também confirmou à congressista Kelly Armstrong que a Amazon considera apenas dois produtos em uma categoria como o suficiente para mineração de dados “agregados” — apesar do fato de que, para os executivos da Amazon, seria fácil separá-los, especialmente se uma dessas empresas dominasse a categoria.

Como observou o Wall Street Journal, os membros do Congresso também perguntaram a Bezos sobre o fundo de capital de risco da Amazon, que supostamente investiu em concorrentes e obteve acesso a dados proprietários para lançar produtos concorrentes.

A congressista Jamie Raskin questionou Bezos se a empresa vende alto-falantes Echo abaixo do custo; ele respondeu que às vezes, durante ocasiões especiais. Já a congressista Mary Scanlon interrogou Bezos sobre uma guerra de preços com o site diapers.com, que fez o CEO da varejista responder que isso ocorreu há 11 anos, “então você está pedindo muito da minha memória”.

Outra discussão sobre o “conflito de interesse inerente” da Amazon, desta vez com o presidente da subcomissão antitruste do Judiciário da Câmara, David Cicilline, não foi muito bem. De acordo com a transcrição do TechCrunch:

Cicilline: Não é um conflito de interesse inerente à Amazon produzir e vender produtos em sua plataforma que competem diretamente com itens de terceiros, principalmente quando vocês, da Amazon, definem as regras do jogo?

Bezos: Obrigado…não, não acredito nisso. Nós temos…o consumidor é quem toma as decisões sobre o que comprar, a que preço e com quem comprá-lo.

Cicilline: Não foi esta a pergunta, senhor Bezos. A questão é se existe um conflito de interesses inerente…você disse que não pode garantir que a política de não compartilhar dados de terceiros com a própria linha da Amazon tenha sido violada. Você poderia, por favor listar exemplos de quando essa política foi violada? Terceiros não devem ter certeza de que os dados não estão sendo compartilhados com sua própria linha de concorrentes?

Bezos: O que é importante entender é que temos uma política contra o uso de dados individuais de vendedores para competir com nossos produtos de marca própria.

Cicilline: Você não pôde garantir à senhora Jayapal que a política não é violada rotineiramente!

Bezos: Bem, quero dizer, estamos investigando isso. Não quero ir além do que sei agora, mas como consequência desta reportagem do Wall Street Journal, estamos analisando isso com muito cuidado.

A Amazon já foi acusada de outras práticas comerciais injustas ou anticompetitivas relativas a vendas próprias e de terceiros para alavancar e aumentar suas margens, como impor termos arbitrários e resoluções de disputas aos vendedores do marketplace.

Em outros casos, a Amazon supostamente encerrou as contas de vendedores e as colocou em um relacionamento de vendas diretas em que a Amazon pode controlar os preços. Houve também casos em que houve o contrário: determinou que comerciantes de vendas diretas fossem para o marketplace. Reguladores europeus lançaram sua própria investigação para verificar se a Amazon abusa do seu duplo papel como operadora de mercado e varejista online para aumentar rapidamente suas marcas internas.

“Estamos muito preocupados com essa zona de assassinato de inovação que parece estar surgindo”, disse o congressista Joe Neguse durante a audiência.

“O que você tem a dizer às pequenas empresas que estão conversando com o Congresso simplesmente porque vocês não estão ouvindo elas?”, perguntou a representante Lucy McBath durante a audiência. “Não acho que seja isso esteja acontecendo sistematicamente”, respondeu Bezos. “Os vendedores terceirizados em geral estão indo muito bem na Amazon.”

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