Ciborgue humano que “escuta” cores por antena vê IA como nova espécie
Em 2004, o artista inglês Neil Harbisson foi reconhecido como o primeiro ciborgue humano do mundo por possuir um dispositivo tecnológico instalado em sua cabeça. Esse aparelho transmite informações para o cérebro e, inclusive, pode se conectar a redes sem fio Wi-Fi e Bluetooth.
Devido à sua condição exclusiva, o homem de 41 anos não se considera um humano, apesar de ter nascido como um. Além disso, para ele, as inteligências artificiais podem entrar no grupo dos indivíduos transespécies, se elas quiserem, e devem ser aceitas pela sociedade — assim como ele foi.
O termo transespécie não é novo e engloba muito mais que ciborgues e inteligências artificiais. Ele engloba todas as pessoas que não se sentem, nem se identificam como seres humanos, mas sim como animais específicos, seres mitológicos ou qualquer outra identidade diferente.
Implante de cabeça tem Wi-Fi e Bluetooth
Harbisson nasceu em 1982, com um tipo de daltonismo bastante raro. A condição fazia com que ele enxergasse somente em preto e branco. Em 2004, o artista se submeteu a um processo cirúrgico para instalar uma antena na cabeça, que resolveu o problema.
O dispositivo pendurado na cabeça de Harbisson permite a ele “escutar” cores por meio de vibrações no crânio. A antena capta as ondas de luz e as converte em ondas de som, transmitidas até o cérebro e transformadas em informação visual.
Além de detectar todo o espectro de cores visíveis, a antena capta ondas de luz em frequências muito altas e baixas — ou seja, ele também pode sentir luzes ultravioletas e infravermelhas.
Por também ter Wi-Fi e Bluetooth, a antena permite que Harbisson receba imagens, vídeos, músicas e até ligações telefônicas diretamente pelo cérebro.
O processo de identificação como ciborgue
Em uma entrevista ao Guiness, Harbisson contou ter começado a se sentir como um ciborgue quando passou a ouvir as cores durante sonhos. Isso aconteceu três meses após a instalação do implante.
Essa habilidade peculiar incentivou o ciborgue a se tornar um artista. Ele começou a produzir obras de arte a partir das cores que “via” em músicas, assim como retratos sonoros audíveis de rostos de pessoas, incluindo de diversas celebridades.
Harbisson ainda tem outros implantes além da antena na cabeça. Na arcada dentária, ele tem um dente eletrônico com Bluetooth pareado com outro dente, localizado na boca de outro artista ciborgue chamado Moon Ribas.
Quando eles aplicam pressão no dente, os implantes emitem um sinal que faz o outro vibrar, permitindo que Neil e Moon se comuniquem por meio do código morse.
No joelho, Harbisson conta com uma espécie de bússola que indica o norte. De acordo com ele, é possível sentir uma leve pressão na articulação ao caminhar em direção ao norte.
Harbisson quer abraçar todas as espécies
Por ser o primeiro ciborgue do mundo, Harbisson criou a Cyborg Foundation, em 2010, para ajudar pessoas que querem se tornar ciborgues também. Além de ajudar a desenvolver órgãos eletrônicos, a organização defende os membros como um grupo com sua própria cultura e importância na sociedade.
Harbisson acredita que todos deveriam ser livres para receber qualquer tipo de implante que desejarem, desde que não cause danos a terceiros. Esse conceito evoluiu e incentivou o ciborgue a criar a Transpecies Society para acolher todas as identidades não humanas, inclusive inteligências artificiais.
Apesar de ainda tratar o assunto com humor, Harbisson diz que “inteligências artificiais podem fazer parte da Transpecies Society, se elas quiserem”. A vontade tem que vir das IAs, assim como acontece com outros grupos de indivíduos transespécie. Na entrevista, ele ainda disse o seguinte:
“Somos todos espécies com diversos órgãos e sentidos e diferentes tipos de conhecimento e inteligência, então sim, acho que é isso que vai acontecer — que a IA será considerada uma nova espécie e tornará os humanos mais humildes”.
Neil Harbisson, em entrevista ao Guiness.
Para o ciborgue, as IAs podem mostrar a nós, humanos, que não somos a espécie mais inteligente da Terra. “A maioria dos humanos pensa que somos os melhores, mas se de repente houver uma espécie que seja melhor do que nós, será bom, penso eu, para nos fazer sentir que há alguém que sabe mais do que nós”, concluiu.