Cientistas encontram evidência mais antiga de peste bubônica em fóssil humano

A descoberta da bactéria em um caçador de 5 mil anos sugere que a peste demorou para se tornar a doença terrível que conhecemos hoje.
Imagem: Dominik Göldner, BGAEU, Berlim

O crânio de um caçador que viveu na Europa há mais de 5 mil anos contém os vestígios mais antigos da bactéria responsável por causar a peste bubônica, de acordo com um novo estudo. É provável que a descoberta forneça algumas pistas importantes sobre as origens e a evolução desse inimigo de longa data, que foi responsável por algumas das piores epidemias da história da humanidade.

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A peste é causada pela bactéria Yersinia pestis e geralmente se espalha pelo contato com animais ou por picadas de pulgas. Também pode se tornar uma doença respiratória muito séria, disseminada entre as pessoas, conhecida como peste pneumônica. Outra forma de contágio, muito rara e frequentemente fatal, é chamada de peste septicêmica e ocorre quando a bactéria atinge a corrente sanguínea.

Embora hoje seja contida por meio de um melhor saneamento e disponibilidade de antibióticos, na Idade Média, a peste varria regularmente Europa, Ásia e África, deixando para trás devastação em seu rastro. Em meados do século 14, a doença era considerada uma das pandemias mais letais de todos os tempos, matando cerca de um terço de toda a população da Europa e pelo menos 50 milhões de pessoas em todo o mundo.

Assim como todas as outras coisas vivas, os germes que causam doenças humanas evoluem com o tempo. Agora os cientistas estão interessados ​​em desvendar quando a Y. pestis encontrou a humanidade pela primeira vez e como ela acabou se transformando em algo capaz de causar tantas mortes.

De acordo com o estudo, publicado na Cell Reports, os pesquisadores estavam procurando por vestígios de DNA deixados nos restos do crânio de um jovem enterrado há aproximadamente 5 mil anos perto do rio Salaca, na Letônia. Felizmente, essa análise incluiu a triagem de patógenos em potencial, e foi quando eles encontraram pedaços de DNA que codificam para proteínas específicas da bactéria. A partir dessas pequenas partes, eles reconstruíram o genoma dessa cepa, apelidada de RV 2039 (a mesma designação dada ao homem) e compararam o que encontraram com outras cepas antigas que foram reconstruídas.

Os pesquisadores dizem que a RV 2039 precede qualquer uma dessas outras amostras de Y. pestis e pode representar o início de sua evolução como uma espécie distinta. Se essas constatações forem válidas, isso também pode mudar certas suposições sobre como essas bactérias existiam naquela época. “Nossa descoberta apresenta evidências dessa bactéria em um caçador e esclarece mais sobre as fases iniciais da evolução e diversificação de Y. pestis”, escreveram os especialistas.

Eles acreditam que a Y. pestis se separou de outra espécie de bactéria chamada Yersinia pseudotuberculosis há milhares de anos. Mas os autores do estudo argumentam que sua descoberta pode empurrar a linha do tempo atual estimada de quando essa divisão ocorreu, para cerca de 7 mil anos atrás. Além disso, eles dizem que há evidências de que essa versão da peste era muito mais domesticada do que a versão por trás da Peste Negra.

Por um lado, como outras cepas de peste antigas, essas bactérias não têm as adaptações que lhes permitiram se espalhar a partir de pulgas — acredita-se que essa mutação tenha sido responsável por iniciar sua evolução para uma doença mais virulenta. Como o DNA parece ter sido recuperado da corrente sanguínea do homem, é possível que ele tenha morrido de uma forma letal da doença. Mas a grande quantidade de DNA da peste encontrada sugere que a infecção poderia ter sido tolerada sem causar a morte, dizem os pesquisadores, citando estudos que mostram que camundongos com altas cargas de bactérias da peste moderna tendem a ficar menos doentes.

Em todo caso, a descoberta do homem cuidadosamente enterrado ao lado de outros sem praga sugere que, o que quer que ele tivesse, não era considerado altamente contagioso pelas populações humanas da época. Combinado com evidências de outros casos de pragas antigas, os autores argumentam que esta versão pode não ter sido capaz de causar grandes surtos; em vez disso, ela infectava pessoas apenas periodicamente por meio de picadas de muitos roedores que servem como seus hospedeiros naturais. Se for verdade, isso afetaria seriamente a teoria recente de que o surgimento precoce da peste pneumônica causou uma pandemia generalizada na época, alimentada por rotas comerciais entre assentamentos neolíticos.

“Com base nos dados genômicos, não se pode excluir que o RV 2039 e as outras formas iniciais eram menos transmissíveis do que as cepas posteriores, levando apenas a surtos locais”, escreveram eles. É provável que esse debate sobre a praga não seja resolvido por um único estudo. Mas suas descobertas são incríveis por outro motivo, dizem os pesquisadores.

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O cemitério e o crânio foram descobertos pela primeira vez no final do século 19 pelo arqueólogo amador Carl Georg Count Sievers. Sievers e seu mentor, o médico alemão Rudolf Virchow, argumentaram que o local tinha que ser pré-histórico, mas sua teoria foi duramente criticada por outros da época. Por fim, o crânio do homem aparentemente desapareceu após a Segunda Guerra Mundial, mas foi redescoberto nas coleções do trabalho de Virchow mantidas pela Sociedade de Antropologia, Etnologia e Pré-história de Berlim em 2011; a subsequente datação por carbono confirmou sua idade, justificando Sievers e Virchow.

“Virchow não estava em posição de diagnosticar a peste com o crânio de Rinnukalns. No entanto, graças à abordagem científica progressiva de Virchow, os restos escavados por Sievers foram armazenados em sua coleção, onde sobreviveram de modo que um diagnóstico posterior ainda fosse possível, mesmo depois de 145 anos”, escreveram os autores do estudo.

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