Como células podem ser reprogramadas para combater câncer, segundo estudo da Fiocruz
Um novo estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostra que é possível reprogramar as células para combater o câncer de mama através do estímulo do sistema imunológico.
Os pesquisadores conseguiram barrar o avanço do tumor depois de uma alteração no perfil dos macrófagos, um dos tipos de células de defesa do organismo. Quase 50% da massa tumoral é composta por macrófagos. Por isso, as atividades dessas células influenciam no prognóstico do câncer.
Segundo os cientistas, existem dois tipos de macrófagos. São eles:
- M2: têm características anti-inflamatórias, geralmente relacionadas com mais permissividade tumoral;
- M1: são pró-inflamatórias e mais eficazes em limitar a progressão do tumor.
No estudo, os cientistas propõem “transformar” os macrófagos M2 em M1 como uma forma de inibir o desenvolvimento do tumor. E isso pode ser feito com “camada de proteção” de nanopartículas de óxido de ferro.
Essas nanopartículas são biocompatíveis, ou seja, têm baixa toxicidade para as células saudáveis. Além disso, o custo é baixo e a síntese é rápida, o que facilita a produção em escala.
Tirando do papel
O processo desenvolveu três experimentos: 1) in vitro em 2D; 2) in vivo, com camundongos de laboratório; e 3) in vitro em 3D.
No primeiro caso (in vitro em 2D), os cientistas usaram um sistema artificial para colocar células tumorais de mama em contato com os macrófagos. Nesse contato, eles perceberam que o câncer se multiplicou. Mas, ao introduzir as nanopartículas, as células tumorais morriam.
Em seguida, eles recorreram aos camundongos de laboratório. Nessa etapa, os pesquisadores injetaram células tumorais e nanopartículas nos animais, deixando-os em observação por 21 dias.
Ao final do período, os camundongos que receberam as nanopartículas apresentaram uma redução de quase 50% na massa tumoral na comparação com os animais que não receberam o tratamento.
Por fim, o último experimento levou em consideração uma simulação das células tumorais em um modelo tridimensional (3D). Nesse momento, os cientistas colocaram células tumorais em contato com outras células do organismo humano. E, de novo, as nanopartículas transformaram as células M2 em M1, reduzindo a incidência do câncer.
Ponto de partida
Os estudos possibilitam perspectivas otimistas para, no futuro, criar tratamentos complementares ao câncer de mama. “É um ponto de partida”, disse Carlos Eduardo Calzavara, líder do grupo de Imunologia Celular e Molecular e coordenador do projeto de pesquisa.
Segundo ele, ainda é preciso realizar novas pesquisas para avaliar os efeitos fisiológicos, mecanismos de ação, efeitos colaterais e tempo de absorção das nanopartículas no organismo. “Mas a prova de conceito nós já temos, o que é muito importante”, afirmou ele.
A pesquisa é realizada pela pós-doutoranda em Imunologia Celular e Molecular, Camila Sales Nascimento, nos laboratórios da Fiocruz Minas. Para ter acesso às nanopartículas de óxido de ferro, a organização desenvolveu uma parceria com o Departamento de Física da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).