Conquista quântica permite que os físicos ‘vejam’ ondas gravitacionais do universo mais profundo
Os físicos estão relatando os resultados de um teste para comprimir o vácuo do próprio espaço-tempo, a fim de detectar melhor as ondas gravitacionais da colisão de buracos negros.
Eventos extraterrestres extremos, como dois buracos negros colidindo ou supernovas, podem produzir ondulações no espaço-tempo chamadas ondas gravitacionais. Aqui na Terra, um conjunto de observatórios tenta medir essas ondulações usando lasers – mas os efeitos das ondas podem ser tão sutis que mesmo a aleatoriedade construída no próprio espaço vazio atrapalha a sensibilidade do experimento. Mas esse novo método, resultado de décadas de pesquisa, permitiu que os pesquisadores suprimissem esse ruído e estendessem o alcance dos detectores de ondas gravitacionais.
“O método nos permite aumentar a distância no universo em que podemos detectar ondas gravitacionais”, disse uma das autoras do estudo, Lisa Barsotti, principal pesquisadora do Instituto Kavli de Astrofísica e Pesquisa Espacial do MIT Kavli que trabalha no LIGO, ao Gizmodo.
O Observatório de Ondas Gravitacionais com Interferômetro a Laser (LIGO) e o observatório de ondas gravitacionais Virgo se baseiam no princípio de padrões de interferência criados pela sobreposição de feixes de laser. Um feixe de laser passa para um elemento óptico que o divide em dois feixes, depois envia cada um deles para um tubo de dois quilômetros de comprimento e para espelhos, que os devolvem ao elemento óptico que os une. A luz (até mesmo a luz do laser) viaja como uma onda; portanto, quando os feixes se reúnem, eles se transformam em uma nova onda. Uma onda gravitacional de passagem mudaria levemente a distância que um dos raios laser viaja, deixando seus rastros na onda final correspondente, à medida que os raios viajam dentro e fora da fase um do outro.
Mas depois que o laser é recombinado, ele deve viajar através das flutuações quânticas do vácuo da máquina. Uma consequência da mecânica quântica, a teoria que governa como as partículas subatômicas interagem, é que, nas escalas menores, há pequenas oscilações de energia crescente e decrescente. Essas flutuações introduzem um nível de incerteza quando as partículas de luz chegam ao detector – o que limita a sensibilidade do detector, já que é mais difícil ver a mudança na fase da luz introduzida pelas ondas gravitacionais. Agora, os físicos conseguiram uma maneira de suprimir essas flutuações quânticas injetando “estados de vácuo espremidos” nesta parte final do experimento.
Um dos princípios centrais da mecânica quântica, o princípio da incerteza de Heisenberg, diz que certos pares de propriedades, como a posição de uma partícula e seu momento ou sua energia e o tempo que ela chega, não podem ser medidos simultaneamente com precisão; aumentar a precisão em um dos valores diminui a precisão no outro e vice-versa. Comprimir é uma maneira de aumentar a precisão (e diminuir o ruído) do valor em que os físicos estão mais interessados às custas do outro.
A linha preta mostra a quantidade de ruído em uma determinada frequência sem comprimir. O verde mostra o efeito da compressão: menos ruído. Gráfico: LIGO
A força de trabalho do mecanismo de supressão de ruído é um tipo especial de cristal com propriedades ópticas ajustáveis. O cristal vincula um feixe de laser que passa por ele às flutuações de energia do vácuo, permitindo aos pesquisadores criarem um novo campo onde eles mudaram o ruído da propriedade na qual estão mais interessados (fase) para a propriedade em que estão menos interessado (amplitude). Eles passam essa luz de volta para a saída do interferômetro, onde ele substitui o vácuo com ruído por esse novo campo compactado. O laser resultante agora tem menos ruído em suas medições de fase e mais em sua amplitude. Para reduzir o ruído da luz difusa produzida pelo próprio cristal sintonizado, os componentes principais do compressor ficam dentro do vácuo do LIGO. Os pesquisadores relataram o sucesso desse método nos detectores LIGO e Virgo na última quinta-feira (5), em artigos publicados na Physical Review Letters.
Isso é algo importante. “Essa conquista é uma bela demonstração de como a tecnologia quântica pode aprimorar instrumentos de precisão e expandir os limites da ciência”, disse Ping Koy Lam, professor de física da Universidade Nacional da Austrália que não esteve envolvido neste estudo, mas que trabalha com compressão para detectores de ondas gravitacionais, ao Gizmodo por e-mail.
Mas tudo tem o seu preço – o ruído de amplitude aparece em outro lugar, resultando em um ligeiro aumento na incerteza para ondas gravitacionais de baixa frequência. No futuro, os físicos esperam reduzir a amplitude para as frequências mais baixas e a fase para as frequências mais altas, disse ao Gizmodo Nergis Mavalvala, professor de astrofísica do MIT que contribuiu com a pesquisa.
O LIGO e o Virgo agora usam essa compressão para aumentar a sensibilidade, à medida que continuam a procurar as ondas gravitacionais causadas pela colisão de buracos negros. Mas para a autora principal do artigo, a estudante de graduação Maggie Tse, uma das partes mais emocionantes foi ver o mundo muitas vezes incompreensível e difícil de medir da física quântica acontecer na vida real. Ela disse ao Gizmodo: “Transformar os estados quânticos assustadores em algo tangível é mágico”.