O curioso caso da galáxia jovem que aparenta ser mais velha
Com 1,2 bilhão de anos, a galáxia ALESS 073.1 deveria ter uma aparência jovem, com um grupo difuso e incipiente de estrelas e gás suspenso no início do universo. Em vez disso, ela apresenta uma protuberância central e um cinturão giratório que a faz parecer bilhões de anos mais velha. Este estranho canto do universo foi recentemente registrada pelo observatório Atacama Large Millimeter Array (ALMA) no Chile.
Uma equipe internacional de astrônomos investigou o rápido desenvolvimento da galáxia recém-descoberta em uma análise publicada na revista Scientific Reports. Eles descobriram que apesar da idade de ALESS ser inferior a 10% da idade atual do universo, algumas partes de sua estrutura indicam uma entidade muito mais velha. Para ser mais especifico, é a presença de uma protuberância no seu centro e um disco giratório em torno desse local, característica que os astrônomos historicamente só viram em galáxias que tiveram mais tempo para se formar, na escala de bilhões de anos.
“A expectativa geral até alguns anos atrás era que as galáxias no universo primordial deveriam ser muito caóticas e turbulentas”, disse Federico Lelli, astrônomo do Observatório Astrofísico Arcetri, na Itália e principal autor do novo artigo. Ele iniciou o trabalho no Observatório Europeu do Sul em Munique e continuou na Universidade de Cardiff. “Esperávamos ver movimentos de gás caóticos, mas não é isto que ocorre com esta galáxia.”
A respeito do universo primitivo, a ideia era que novas estrelas e galáxias nasceriam a partir do acúmulo de gás e material do éter interestelar. A equipe de Lelli sugere que a linha do tempo da formação galáctica precisa ser revisitada. “Para vocês entenderem melhor, esta galáxia possui 8 anos, mas parece um adolescente ou uma pessoa adulta”.
A equipe de pesquisa não viu diretamente a protuberância, o que indica uma densidade de estrelas que normalmente cercam um buraco negro supermassivo no centro de uma galáxia. Ela só foi notada quando mediram o seu movimento de gás e poeira. O mesmo vale para a rotação da galáxia — que a equipe foi capaz de calcular a partir da medição dos gases em ambos os lados da galáxia, indicando o deslocamento para direções opostas.
A proeminência pode ter ocorrido por meio de uma fusão com outra galáxia ou de uma estrutura galáctica inerentemente instável, embora Lelli tenha dito que a última é uma hipótese menos provável.
“Esta descoberta espetacular desafia nosso entendimento atual de como as galáxias se formam porque acreditamos que essas características só surgiram em galáxias ‘maduras’, não nas mais jovens”, disse o coautor Timothy Davis, astrônomo da Universidade de Cardiff, em um comunicado da universidade.
Embora ainda não se saiba qual é a idade do disco giratório da ALESS, sua existência na marca de 1,2 bilhões de anos ainda precede qualquer outro disco galáctico conhecido.
“Dez anos atrás, pensávamos que os discos se formavam na metade da idade do universo”, disse Lelli. Como o universo tem cerca de 13,8 bilhões de anos, isso seria cerca de 6,9 bilhões de anos atrás. “E agora estamos em 10%, voltando e voltando no tempo.”
As observações feitas na ALESS sugerem que pode haver mais na formação de outras galáxias primitivas do que se pensava anteriormente. “A questão é se esta é a regra ou a exceção”, disse Lelli. “Para resolver isso, estamos planejando observar mais galáxias com resolução semelhante.”
Essas observações de outras galáxias deveriam ter ocorrido no ano passado, mas a pandemia atrapalhou os planos existentes. Até mesmo em um observatório como o ALMA, que hospeda centenas de pessoas no meio do deserto, as pesquisas tiveram que ser suspensas. Lelli espera que olhar para outras galáxias ajude a contextualizar o aspecto maduro de ALESS 073.1. Com o próximo lançamento do Telescópio Espacial James Webb e a construção do Telescópio Extremamente Grande do Observatório Europeu do Sul, é justo dizer que o futuro da observação espacial é brilhante, contanto que tenhamos tempo para olhar.