Descoberta de micróbios vivos no fundo mar oferecem esperança para vida em Marte
Quantidades surpreendentes de bactérias foram encontradas vivendo em rochas ricas em argila no fundo do mar do Pacífico. A descoberta levanta a possibilidade do micróbios igualmente resilientes vivendo profundamente sob a superfície de Marte.
Rochas vulcânicas antigas sob o fundo do mar do Pacífico fornecem um habitat para densos aglomerados de comunidades microbianas, de acordo com um artigo publicado na última semana no Communications Biology Os micróbios foram encontrados em uma profundidade de 100 metros sob o fundo do mar, aconchegando-se nas fendas das antigas rochas vulcânicas ricas em argila.
“A vida encontra um lar em praticamente todas as fendas disponíveis”, explicou Jennifer Biddle, professora associada da Universidade de Delaware, que não estava envolvida com a nova pesquisa, em uma conversa por telefone com o Gizmodo. “Trabalhos anteriores nos últimos 20 anos sugeriram essa possibilidade — que muitos micróbios podem existir dentro das fendas das crostas dos oceanos —, mas este artigo é bom porque é realmente a primeira evidência de micróbios ativos nessas rochas em particular, e não apenas seus restos fossilizados”.
Uma amostra de roca vulcânica. Crédito: Caitlin Devor, University of Tokyo, CC BY 4.0
Micróbios subterrâneos já foram encontrados antes. Em 2006, por exemplo, os cientistas detectaram bactérias a quase 3,2 km debaixo da superfície da Terra, e em 2018, cientistas encontraram bactérias fotossintetizadoras a milhares de metros abaixo da superfície de uma mina abandonada na Espanha. No final do mês passado, foi publicado um artigo descrevendo as comunidades microbianas que vivem cerca de 792 metros abaixo do fundo do mar.
O que torna a nova descoberta especial é que os micróbios estavam vivos e foram retirados de antigas rochas vulcânicas com idades entre 13,5 milhões e 104 milhões de anos. Se os microorganismos ativos podem ser encontrados nessas rochas foi uma pergunta sem resposta que entrou na pesquisa, mas o novo artigo sugere que eles estão prosperando em seu habitat externo.
Um dos autores, Yonhey Suzuki, da Universidade de Tóquio, no Japão, coletou as amostras em 2010. Os pesquisadores selecionaram três pontos diferentes no fundo do oceano Pacífico entre o Taiti e a Nova Zelândia. Para descartar fontes contaminantes, os cientistas selecionaram áreas distantes das fontes hidrotermais.
Imagens ampliadas de amostras de rocha, onde (b) é 1.000 vezes mais ampliada que (a). As manchas verdes à direita de cada uma mostram as bactérias, iluminada pela luz fluorescente. As áreas cinzas são de argila, enquanto as áreas laranjas são de rocha sólida de basalto (vulcânicas). Crédito: Suzuki et al. 2020, DOI: 10.1038/s42003-020-0860-1, CC BY 4.0
Um tubo de metal com 5,7 km de comprimento foi baixado até o fundo do oceano e uma broca escavou mais 125 metros no fundo do mar. Nos primeiros 75 metros da jornada, a broca percorreu uma lama espessa, seguida por outros 40 metros através de rochas sólidas.
Uma vez no laboratório, as amostras revelaram traços das bactérias dentro das fendas da rocha vulcânica. Essas pequenas fraturas, com menos de 1 mm de espessura, se formaram quando a lava quente estava esfriando.
Suzuki encontrou as bactérias em densidades surpreendentes, com colônias atingindo 10 bilhões de células bacterianas para cada centímetro cúbico, que é aproximadamente a mesma quantidade encontrada no intestino humano. O próprio fundo do mar produziu apenas 100 células por centímetro cúbico.
A bactéria provavelmente é atraída pelos minerais ricos em argila, que fornecem um habitat adequado para os micróbios aeróbicos que se alimentam de oxigênio e nutrientes orgânicos. E como Biddle disse ao Gizmodo, “a argila tem uma superfície carregada, facilitando a aderências das bactérias”. Usando a análise de DNA, os pesquisadores identificaram espécies aeróbias distintas, mas similares, de bactérias retiradas de diferentes locais.
“Esta descoberta da vida em que ninguém esperava existir em rocha sólida abaixo do fundo do mar pode estar mudando o jogo para a busca da vida no espaço”, disse Suzuki em um comunicado à imprensa. “Agora estou ansioso para encontrar vida em Marte. Caso contrário, deve ser que a vida dependa de algum outro processo que Marte não possui, como placas tectônicas”, acrescentou.
Suzuki e seu colegas em breve colaborarão com a NASA enquanto trabalham em um plano para trazer rochas marcianas à Terra para análise. O veículo Perserverance, que deve ser lançado neste verão no hemisfério norte (entre junho e setembro), foi feito apenas para este propósito. O rover coletará animais e os depositará na superfície de Marte para uma missão futura de retorno de amostras.
Suzuki diz que os minerais argilosos encontrados no fundo do mar do Pacífico podem ser semelhantes aos minerais de Marte.
“Os minerais são como uma impressão digital de quais condições estavam presentes quando o barro se formou”, disse ele. “Níveis neutros a ligeiramente alcalinos, baixa temperatura, salinidade moderada, ambiente rico em ferro, rocha de basalto — todas essas condições são compartilhadas entre o oceano profundo e a superfície de Marte”.
Biddle, no entanto, foi cauteloso com as implicações astrobiológicas do novo artigo.
“A vida pode ser mais robusta? Claro, mas eu seria cauteloso com esse tipo de interpretação”, disse ela ao Gizmodo. “Marte pode estar perdendo um ciclo biogeoquímico completo para todos os elementos necessários para a vida”, explicou ela, acrescentando que o novo artigo “não é um slam dunk” para mostrar que a vida certamente existe em outras partes do sistema solar. “Outras coisas precisam estar presentes para permitir que a vida sobreviva”, disse ela.
Com uma missão de retorno de amostra de Marte pendente em andamento, em breve poderemos colocar essa teoria à prova. Dito isto, provavelmente não teremos respostas satisfatórias até que possamos aprofundar a crosta marciana, o que o rover Perserverance não será capaz de fazer. Por enquanto, teremos que nos contentar com essas especulações fascinantes.