Ciência

Em estudo inédito, moradores de favelas brasileiras relatam dificuldade de acesso a alimentos saudáveis

Dificuldade de acesso a alimentos saudáveis a preços acessíveis é um dos principais obstáculos dos moradores entrevistados
Foto: Freepik

Texto: Agência Bori

Highlights

  • Estudo faz uma avaliação da influência do ambiente alimentar em favelas brasileiras
  • Moradores enfrentam desafios pela falta de informação sobre alimentos, pela restrição financeira e pelo acesso limitado aos locais de compra
  • Resultados da pesquisa podem colaborar com planejamento de políticas públicas que incentivem a oferta de alimentos saudáveis a preços baixos

Uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) analisou, pela primeira vez, a influência do ambiente alimentar sobre as escolhas dos moradores de favelas brasileiras. O estudo, publicado na segunda (18) na revista “Cadernos de Saúde Pública”, observa a dificuldade de acesso dos moradores a alimentos saudáveis. Entre as limitações destacadas, estão a falta de informação sobre alimentação adequada, restrições de renda e número reduzido de estabelecimentos que oferecem alimentos saudáveis a preços acessíveis.

As autoras do estudo realizaram dois grupos focais online de duas horas de duração com dez moradores de favelas de diferentes cidades do país, em novembro de 2022. A maioria era do sexo feminino (80%), com idades entre 18 e 30 anos (60%), e representação racial diversa – 90% dos participantes se distribuem igualmente entre brancos, pretos e pardos. A maioria residia em favelas do Sudeste do Brasil (60%).

O trabalho indica que os moradores enfrentam desafios significativos em seu ambiente alimentar. A falta de acesso físico e financeiro à comida saudável, juntamente com a alta disponibilidade e promoção intensiva de produtos ultraprocessados, dificulta a adoção de uma dieta nutritiva e leva a escolhas alimentares confusas. O transporte entre casa, trabalho ou local de estudo também reduz o tempo disponível para comprar e preparar alimentos, segundo aponta o estudo do Grupo de Estudos, Pesquisas e Práticas em Ambiente Alimentar e Saúde (GEPPAAS) da UFMG, coordenado pela professora Larissa Loures Mendes.

Para Luana Lara Rocha, pesquisadora da UFMG e autora do artigo, a maioria dos participantes mencionou a importância de integrar diariamente verduras, legumes, frutas, carnes, arroz e feijão em sua alimentação. Alguns observaram que os preços elevados desses alimentos representam um obstáculo para sua inclusão regular. “Eles expressaram o desejo de aumentar o consumo e a variedade de frutas, alimentos orgânicos, peixes e castanhas, desde que suas condições financeiras permitam. Além disso, destacaram a falta de tempo como uma barreira para diversificar a alimentação e preparar refeições de melhor qualidade”, observa Rocha.

A autora explica que a condução de estudos específicos para áreas de comunidades é importante para captar suas particularidades. Cerca de 16 milhões de brasileiros moram em favelas, segundo dados do Censo 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – o que corresponde a 7,4% da população brasileira. Esse conhecimento auxilia a elaboração e o aprimoramento de políticas públicas e programas que incentivem a oferta de alimentos saudáveis a preços acessíveis, bem como estratégias e ações concretas relacionadas ao transporte, à segurança e ao ambiente desses locais que interferem no acesso aos alimentos. “A complexidade dos problemas relacionados à vida urbana na favela exige soluções específicas e integradas”, aponta.

A identificação dos fatores que impactam o acesso aos alimentos em favelas levou os pesquisadores a desenvolverem um instrumento para avaliar a percepção desse acesso. Agora, a pesquisadora planeja conduzir uma pesquisa de campo com esta ferramenta, em Belo Horizonte, para coletar informações sobre o ambiente alimentar, a segurança alimentar e nutricional e o estado nutricional das crianças das favelas do município. “Os dados obtidos serão reunidos e apresentados aos gestores responsáveis pelas políticas públicas de alimentação, nutrição e segurança alimentar e nutricional”, conclui Rocha.

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