Por que temos medo do escuro (e por que isso é bom)

É normal crianças passarem por fases em que elas têm medo do escuro. Qualquer rangido no assoalho ou barulho aleatório no meio da noite faz com que elas fiquem aterrorizadas. Eis o motivo disso acontecer – e saiba também por que não devemos nunca perder completamente este medo. Talvez seja uma informação óbvia, mas não […]

É normal crianças passarem por fases em que elas têm medo do escuro. Qualquer rangido no assoalho ou barulho aleatório no meio da noite faz com que elas fiquem aterrorizadas. Eis o motivo disso acontecer – e saiba também por que não devemos nunca perder completamente este medo.

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Talvez seja uma informação óbvia, mas não é exatamente do medo em si que as crianças têm tanto medo, e sim o temor de que algum bicho-papão ou outro monstro apareça debaixo da cama depois de fazer algum barulho. Este medo, e a ansiedade gerada por ele, age como um mecanismo verificador e limitador contra comportamentos imprudentes como, por exemplo, correr na noite africana com a possibilidade de ser atacado por algum felino gigante. Em outras palavras, é uma vantagem evolutiva.

Lembremos que nos primórdios da humanidade, estávamos longe do topo da cadeia alimentar. Nossos ancestrais rapidamente aprenderam que muitos predadores preferem se esconder na escuridão para caçar e essa associação foi fortalecida no nosso subconsciente: fique longe da escuridão, é nela que está o perigo.

Mesmo que o medo do escuro possa se manifestar através de reações agudas – como gritar em pânico quando alguém apagar as luzes, ou na forma de insônia, como um estudo recente conduzido na Universidade de Toronto sugere – é mais comum que ele se manifeste através de ansiedade. A emoção da ansiedade tem papel específico nas nossas respostas comportamentais para estimular, assim como as emoções de amor, raiva, e tristeza, agindo para aumentar nossa capacidade de lidar com o estresse e explorar totalmente as oportunidades benéficas.

Como Isaac M. Marks e Randolph M. Nesse estipularam em Medo e Adequação: Uma análise evolucionária dos distúrbios de ansiedade:

Cada emoção pode ser pensada com um programa de computador projetado para atingir determinadas tarefas particularmente bem (Nesse 1990). Se a tarefa atual é cortejo, o amor romântico é útil. Se alguém está sendo traído, a raiva é útil. Se um tigre está atacando, então o medo e esquiva são os melhores. Se as pessoas estão sendo desaprovadas, a ansiedade social pode ser apropriada. Diferentes emoções, no entanto, precisam ser orquestradas, assim como funções endócrinas precisam ser coordenadas em uma orquestra endócrina. Respostas emocionais precisam se adequar a desafios diferentes, nos quais cada emoção se encaixa em uma situação específica.

Em resumo, a ansiedade aumenta sua percepção das situações que podem prejudicar seus recursos reprodutivos. Não apenas seus sinais vitais, mas relações, ganhos, posição social, características físicas; qualquer coisa que faça você mais atraente para o sexo oposto e, consequentemente, mais próximo da reprodução.

Diferentemente de raiva ou tristeza, que ocorrem em resposta direta a eventos específicos, nós respondemos a sinais ambientais indicando uma potencial perda com uma ansiedade que precede um evento, já que nesse momento é o sentimento mais benéfico do ponto de vista evolucional. Isso é, nossos ancestrais que melhores reconheceram e responderam a esses sinais aumentaram a possibilidade de sobrevivência e reprodução em relação aos mais relaxados. Sentir ansiedade para um evento passado é um desperdício total de recursos já que o possível dano já deve ter ocorrido. Não apenas isso é como chorar pelo leite derramado, mas isso também pode fazer você ser morto (caso seja um Neandertal).

Como essa resposta está relacionada à seleção natural, alguns sinais – como uma cobra, ou olhos de felinos, ou objetos similares a aranhas, e a escuridão (onde cobras, leopardos e aranhas vivem) – invocam essa emoção com mais facilidade. Isso é resultado de gerações após gerações de humanos reagindo e consequentemente se preparando para perigos como esses. É por isso que muitas ameaças antigas – fogo não-controlado, aranhas, cobras, predadores e escuridão – costumam gerar mais respostas negativas, mesmo em crianças pequenas, do que ameaças modernas como automóveis, guerras nucleares ou armas.

Mesmo que a ansiedade esteja enraizada na nossa psique, ela não é totalmente instintiva. Também aprendemos a ter medo e ansiedade a partir dos nossos pais. Se uma criança pequena se assusta com um objeto novo ou desconhecido e a mãe responde de maneira calma, a criança aprende que aquele item não é uma ameaça. Se os pais respondem com apreensão, os medos da criança são confirmados e amplificados. Isso permite para os filhos a aprenderem sobre os perigos ao seu redor sem precisarem ser picados por cobras, perseguidos por leões ou eletrocutados por uma moeda na tomada ao mesmo tempo que simultaneamente descobrem que coisas como folhas e rochas pequenas, assim como trovões e cenas assustadoras na TV, não são ameaças reais.

É um sistema bem bonito, de verdade. Esta emoção sutil foi aperfeiçoada e refinada ao longo dos últimos milênios pela natureza e se tornou uma resposta vital de sobrevivência que permanece útil no mundo moderno assim como era no Neolítico. Claro, os sinais ambientais se adaptaram, e a ansiedade sobre interações sociais e propriedade substituiram aquelas após encontrarmos abrigos e aprendermos a não passar fome até a morte, mas a resposta básica a ameaça permanece: mantenha-se vivo para se reproduzir pro mais um dia. O medo do escuro e, por extensão, o medo do desconhecido, estão aqui para garantir que nunca esqueceremos disso. [Indiana University – Time –HuffPo – Wiki – University of Michigan – Imagem: Vlue]

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