Existem algumas generalizações que podemos fazer sobre carne. Primeiro, a produção de carnes é ruim para os animais. Segundo, a produção de carne faz mal ao meio ambiente. Terceiro, carne é muito gostoso.
Algumas novas startups querem oferecer uma alternativa para as pessoas que não estão dispostas a se tornarem vegetarianas ou veganas e que consiga resolver esses três problemas – uma carne gostosa que é melhor para o meio ambiente e que não envolva a matança de animais. Existem apenas algumas opções viáveis o suficiente em desenvolvimento que se vale a pena considerar: uma delas projeta ingredientes substitutos com base em plantas e outra é sobre o cultivo de tecido animal a partir de células-tronco. Uma nova entrevista com os empreendedores que querem vender a carne à base de planta mostra que tudo isso pode se tornar um guerra das comidas.
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O pessoal do TechCrunch conversou com Pat Brown, CEO da Impossible Foods, empresa que criou o tão falado (e saboroso, diga-se de passagem), Impossible Burger, à venda em alguns restaurantes em Nova York, Los Angeles e São Francisco. Brown aproveitou a oportunidade com o TechCrunch para falar mal dos seus concorrentes que utilizam carne de cultura:
TechCrunch: por que não tentar “carne limpa”, ou carne feita em laboratório a partir de células animais?
Pat Brown: A resposta simples é porque essa é uma das ideias mais estúpidas já expressadas. Em primeiro lugar, não é verdade que é possível fazer um trabalho melhor dessa maneira. Porque então você compra, no melhor cenário, as mesmas limitações que a carne bovina tem. E economicamente é completamente não expansível.
Se pudéssemos criar tecidos que não uma réplica significativa de um tecido animal em um preço acessível a partir de células-tronco, isso revolucionaria a medicina. Olhe ao seu redor. Isso não está acontecendo.
Utilizar células-tronco para tratamentos médicos e utilizar células-tronco que se transformem simplesmente em proteína comestível obviamente não são a mesma coisa. Mas Brown sabe o que acontece quando se trata de bioquímica e de ciência no geral. Afinal, ele é um professor de Stanford que co-fundou a Biblioteca Pública de Ciência, publicadores do periódico PLoS One. Mas isso é realmente uma competição, e a carne feita em laboratório é sua principal concorrente.
Neste momento, o mundo de carne feita em laboratório inclui apenas algumas companhias, entre elas a Mosa Meat, que produziu o primeiro hambúrguer sintético em 2013, e a Memphis Meats, que produziu a primeira ave sintética neste ano. Hoje, pesquisadores estão tentando descobrir como cultivar tecidos animais a partir das células-tronco, uma ideia muito falada, mas ainda em seus primeiros passos. O pessoal da Memphis Meats afirma que terá produtos nas prateleiras dos mercados até 2021. Em comparação, a carne feita de plantas da Impossible Foods já está por aí desde 2011 e já arrecadou quase US$ 200 milhões em recursos e tem um produto em restaurantes. A Memphis Meats só chegou em 2015 e captou apenas US$ 3 milhões, embora a Modern Meadow, uma empresa que produz couro cultivado e pretende expandir para os mercados de carne em cultura, já conseguiu US$ 53 milhões.
O “empreendedor social” e investidor da Memphis Meats Seth Bannon tinha algumas coisas para dizer sobre os comentários de Brown e os escreveu em um post no Medium.
Bannon acha que seu produto é escalável e que não possui as mesmas limitações que a carne bovina. Por exemplo, ao focar apenas em cultivar carne e não o resto do boi, a eficiência irá aumentar. A carne cultivada certamente não necessita de tanto tempo para maturar quanto um animal, já que leva apenas algumas semanas em vez de anos. Sobre o impacto ambiental, ele cita uma análise de 2011 de Oxford que supõe que carnes bovina e suína iriam exigir muito menos energia do que um rebanho equivalente, enquanto que frangos exigiriam um pouco mais, mas em compensação ocupariam menos espaço.
Bannon afirma que o preço da carne cultivada está caindo também. Ela custava US$ 1.056.000,00 por libra no primeiro hambúrguer feito em 2013, mas já caiu para US$ 9 mil por libra em 2017.
Empresas que produzem essas carnes falam muito pouco a respeito de seus progressos e de seus processos, no entanto. A última criação da Memphis Meats foi dada para algumas pessoas em um evento de imprensa, e eles permaneceram calados sobre alguns pontos específicos da ciência de carne de laboratório. Por exemplo, células-tronco atualmente necessitam de um produto animal, chamado soro fetal bovino. Isso é o que resta depois de tirar os glóbulos vermelhos do sangue de fetos de vacas. A Memphis Meats afirma que eles removeram o soro de seu processo, mas não dá detalhes sobre o elemento que substituiu isso ou sobre o que utilizam para manter as células unidas. Bannon respondeu ao meu comentário em seu blog e disse que achou que as empresas foram “surpreendentemente transparentes” em outras frentes, e Mark Post, do Mosa Meats, permitiu que pessoas fizessem um tour em seu laboratório.
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Além de ouvir alguns cientistas que me disseram que as células-tronco são caras, não existe uma boa maneira de saber com precisão qual é o preço delas, além de acreditar nas pessoas que fabricam o produto. Teremos de esperar até vermos algo palpável, em todos os aspectos.
Então, em quem você acredita? É fácil para a Impossible Meats, uma empresa de hambúrgueres veganos que já está vendendo seu produto em restaurantes, falar mal de seus novos competidores que conseguiram apenas uma fração do financiamento. Mas a carne cultivada em laboratório tem alguma chance? Post, o criador do primeiro hambúrguer de laboratório, afirmou que consegue fazer um lanche por cerca de US$ 11. No futuro, as startups de carnes de laboratório esperam que todo o processo se pareça como uma cervejaria gigante, onde a carne é levada em tonéis.
O fato é que está muito cedo para saber o quão escalável a carne de laboratório será – ou o quão melhor ela será para o meio ambiente, um dos seus principais benefícios. Algumas estimativas parecem mostrar que a carne cultivada é uma opção melhor para o ambiente do que a carne normal, mas um estudo recente publicado no periódico Environmental Science and Technology mostra que não temos nenhuma ideia sobre esse aspecto. O estudo concluiu que a carne de laboratório definitivamente iria exigir menos terra do que uma criação de gado, mas talvez requeira mais energia para produzir a mesma quantidade de alimento. E as incertezas dessas estimativas são muito altas.
As pessoas irão comer, um dia, carne de laboratório? Elas certamente irão comer o Impossible Burger, que para o meu gosto pessoal é apenas ligeiramente distinguível de um hambúrguer tradicional, desde que tenha todos os ingredientes como picles e molho. Ainda é um produto baseado em vegetais, em vez de carne real, ainda que feita em laboratório. E não seremos capazes de fazer uma avaliação exata sobre o gosto da carne cultivada até experimentarmos.
Imagem do topo: almôndega de carne de laboratório da Memphis Meats. (Créditos: Memphis Meats)