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Por que gostamos tanto de algumas músicas

No Giz Asks desta semana, falamos com neurocientistas e entusiastas da música sobre o porquê nossos cérebros não se cansam de determinados sons.

Algumas músicas grudam na nossa alma igual a um ectoplasma. Esteja você em uma balada ou no McDonald’s, de vez em quando você ouve determinado som que te leva de volta para um momento da vida que até tinha se esquecido. Uma boa música é algo divertido, mas efêmero – no entanto, as melhores músicas ficam conosco para sempre, às vezes tempo até demais.

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É claro que todo o tipo de arte – e gosto – é subjetivo. Mas existe algum som – ou tipo de som – que geralmente é mais agradável? Recentemente, o autor Tom Cox tweetou alguns pensamentos sobre a filosofia do que está por trás “da melhor música já feita”. Uma porção significativa da internet, no entanto, argumentou que ele estava falando um monte de besteiras, porque a melhor música de todos os tempos é o hit clássico do grupo Toto, de 1982, “Africa”.

 

Não há concretamente a melhor música de todos os tempos. A melhor música já feita é um conceito em adaptação constante, marcado pelo clima, esperança, desilusões e pela lua.

Não, é Africa de Toto.

No Giz Asks desta semana, falamos com neurocientistas e entusiastas da música sobre o motivo de nossos cérebros não se cansarem de determinados sons.

Daniel Glaser

Neurocientista e diretor da galeria de ciência na King’s College de Londres

Existe alguma maneira de determinar cientificamente o que faz uma “boa” música? Por quê?

A melhor maneira de testar a qualidade de uma música ainda é por meio de um humano. Nós podemos mensurar como as pessoas respondem aos sons de diversas maneiras, incluindo leituras cerebrais, medição de químicos no cérebro como a dopamina (que é associada com o sistema interno de recompensas, talvez você se dê uma injeção de ânimo ao escolher uma boa playlist). Na verdade, mensurar a agitação dos pés ou os músculos da face relacionados ao sorriso provavelmente são métodos tão bons quanto os “métodos científicos”.

Alguma substância química é liberada em nossos cérebros quando ouvimos sons que gostamos (por exemplo, dopamina)?

Ainda não temos bons modelos que nos permitam descrever o que faz uma música ser boa, conseguimos apenas criar um modelo artificialmente. Redes neurais de aprendizado profundo talvez consigam desenvolver um “classificador” artificial que aprenderia o que um indivíduo gosta e se um novo som teria mais chances de se tornar um hit ou um fracasso para esse indivíduo. Mas não tenho certeza se isso seria científico, porque, no final das contas, até mesmo as pessoas que construíram essa rede não sabem o que está por trás das decisões.

Gêneros musicais específicos influenciam os cérebros das pessoas de formas diferentes?

Sobre gêneros, o interessante é que a forma como você ouve música é determinada pela sua experiência inicial até os dois anos de idade, e alguns elementos musicais são determinados até os seis meses de idade. Depois dessa idade, seu cérebro é um pouco conservador para coisas como áreas, quartos de tons ou batidas fora de ritmo, então, se você quiser que seu filho curta um estilo particular, certifique-se de que ele tenha acesso a esse gênero o quanto antes.

Amy Belfi

Associada de Pós-Doutorado no Departamento de Psicologia da Universidade de Nova York, pesquisando a relação entre a música e o cérebro

Por que algumas pessoas têm reações visceralmente negativas a certas músicas?

Há algumas pesquisas interessantes que mostram que as pessoas se enquadram em um determinado espectro em termos de “hedonismo musical”. Um grupo pequeno tem o que você chamaria de antidilia musical. São pessoas que não gostam de música nenhuma. Não é que eles tenham uma reação visceralmente negativa, é só que eles realmente não a escutam, eles realmente não vão atrás de música e não respondem de forma visivelmente positiva.

A maioria das pessoas no mundo responde de forma positiva à música. Existem as pessoas na outra ponta do espectro que são super hedônicas, amam muito a música e ficam extasiados com ela. Parte disso tem a ver com uma diferença individual ou um traço de personalidade sobre o quanto as pessoas reagem à música. Então, em grande parte, é isso: pessoas que reagem à música em geral, e depois pessoas que reagem menos à música, não importa qual seja.

Existe alguma qualidade que torna uma música “boa”?

O desafio na psicologia, especificamente quando você está olhando para a música, é o fato de que existem as diferenças individuais. O gosto é muito variado quando se trata de música. Em diversos estudos sobre sensações musicais ou reações positivas à música, pesquisadores pediram para que os participantes trouxessem músicas que costumam ouvir. Então precisaríamos de uma comparação entre músicas altamente agradáveis contra músicas desagradáveis. A música altamente agradável é totalmente diferente de pessoa para pessoa.

A ciência tende a focar mais na reação ao som em vez das qualidades particulares dele, uma vez que é muito difícil ter uma faixa que todos ali possam gostar, a menos que você pegue um grupo de participantes que possuem um gosto muito homogêneo, o que também é meio desafiador. Se soubéssemos como se faz a música perfeita, alguém estaria ganhando milhões de dólares.

David Poeppel

Professor de psicologia e ciência neural na Universidade de Nova York

O quão rápida é uma música normal?

Existem números sobre a média de velocidade da música, goste você ou não dela. Digamos que você pegue um monte de músicas – clássica, rock, instrumentos únicos e em conjunto –, é possível calcular a taxa média. No geral, a taxa média em que as músicas são tocadas é de dois hertz – dois ciclos por segundo –, o que se traduz em 120 batidas por minuto. Entre diversos estilos e eras musicais, existe uma “taxa média” típica nas músicas, o que é meio surpreendente. É mais rápido do que a batida do coração e mais devagar do que a fala.

Por que certas músicas tendem a nos seguir por toda a vida, enquanto outras não?

Uma das coisas mais difíceis a partir do ponto de vista científico em descobrir como o gosto funciona está na consideração de uma grande variação de gostos entre as pessoas, até mesmo daquelas que estão na mesma faixa etária. As músicas da puberdade são particularmente bem lembradas por algumas razões – como lembranças da época em que aconteceu a primeira paixão, ou outra coisa. Mas, aí, talvez você pense em retrospecto: “nossa, que porra é essa, eu gostava de Blondie?”. Isso mostra que até mesmo nossa própria experiência estética muda drasticamente com o tempo.

A partir de um ponto de vista individual, o que te faz feliz, te estimula ou anima é alterado com o passar do tempo.

A melhor música de todos os tempos é “Africa”, do grupo Toto?

Na verdade, Toto é extremamente bom e sofisticado, de acordo com músicos. Toto era um grupo de músicos hardcore de estúdio, muito respeitados. Eles criaram essas músicas com muito cuidado e foram incrivelmente bem-sucedidos em seus quatro álbuns. Os músicos realmente amam Toto.

A ciência diz que “Africa” é a melhor música já feita. Isto é, um cientista diz.

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