Em evento recente organizado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, em Hollywood, neurocientistas, psicólogos e cineastas se reuniram para analisar filmes de um ponto de vista diferente: o cérebro dos espectadores. Não é segredo que os filmes mexem com a gente – emocionam, tocam, mudam percepções. O que o evento, chamado Filmes no Seu Cérebro, coloca em debate são as implicações cognitivas e perceptivas das películas. A arte e a ciência caminham de mãos dadas, mesmo que às vezes não se deem conta disso.
Exemplo prático: a cena de ação no autódromo em Homem de Ferro 2. Tim Smith, da Universidade de Londres, observou o movimento dos olhos de 75 pessoas que assistiram àquela cena, criando um mapa de calor quadro a quadro. Ele concluiu que a maioria dos espectadores foca suas atenções nos mesmos pontos, resultado que o diretor, Jon Fravreau, queria alcançar quando filmou a referida cena.
O segredo, para Favreau, é tornar realidade os objetos de atenção dos espectadores. “Tudo em que você estiver olhando é real, e tudo o que não estiver [no seu campo de visão] é falso.” Na cena, o vilão Ivan Vanko aparece no meio de uma corrida usando uma armadura robótica e um chicote elétrico e, com a ajuda desse, parte ao meio o carro que Tony Stark pilotava. O carro e os rostos eram reais; a plateia e os barquinhos que simulavam Mônaco? Tudo computação gráfica.
Favreau explicou que física e expressões humanas são difíceis de simular, então para passar verossimilhança, sua equipe construiu uma réplica em tamanho e peso reais de um carro de Formula 1 para a tomada. Suas partes foram jogadas em rampas de ar para criar o espetáculo de destruição na tela. O que o diretor antecipou intuitivamente, a ciência respaldou. A cena parece real porque nós olhamos nos pontos certos, naqueles em que o diretor dedicou mais esforços.
Mas todo mundo teve a mesma sensação? Dependendo do filme, há uma dança sincronizada entre os cérebros da plateia. É o que sugere outra pesquisa, de Uri Hasson, psicólogo da Universidade de Princeton. Filmes bem estruturados e que usam muitos recursos cinematográficos (cortes, ângulos de câmera e composições para controlar a percepção da audiência) conseguem sincronizar até incríveis 70% da atividade cerebral da plateia. “O filme domina as respostas cerebrais dos espectadores,” diz Hasson. Bons exemplos? Três Homens em Conflito, de Sergio Leone, e Um Dia de Cão, de Sidney Lumet:
Ari Handel, produtor que costuma trabalhar com o diretor Darren Aronofsky e é PhD em Neurociência pela Universidade de Nova York, ratifica essa ideia. Ele diz que uma cena de Cisne Negro em que Nina, a personagem principal, imagina sentir penas negras nascendo nas suas costas, alcança 70% de sincronia no córtex dos espectadores analisados. Para ele, isso é um fator positivo: “Eles realmente parecem similares, mas seria surpreendente se não fossem.”
De posse desses resultados, quer dizer que no futuro os estúdios usarão ressonância magnética para saber que filmes fisgam a audiência ou não? Talvez. Mas não quer dizer que altos índices de sincronia cerebral serão sempre a meta a ser atingida. Para filmes que brincam com a ambiguidade e a falta de estrutura, elementos que potencializam a sincronização, o contrário é desejável. Hasson cita o cineasta russo Andrei Tarkovsky como contraexemplo: seus filmes fogem do convencional, não usam técnicas consagradas do cinema hollywoodiano. “Se vcê quer que as pessoas pensem uniformemente e em sincronia, pode usar essa ferramenta. Se quer que as pessoas pensem diferente, você também pode usar essa ferramenta.” O cinema é fantástico. [Wired (2)]