Por que você precisa conhecer (e usar) o Medium
Se você tiver uma ideia e quiser compartilhá-la com o mundo, não faltam lugares para divulgá-la. Na Internet, é fácil liberar seus pensamentos para quem quiser ler. Hoje, digo. No passado, antes da criação do Blogger, as coisas eram um tanto mais restritas.
Mais de dez anos depois do início da democratização da informação online, os criadores do Blogger tentam melhorar o cenário que ajudaram a criar. O que o Medium tem de diferente?
Sob uma perspectiva mais abstrata, o Medium não traz nada exatamente novo. É uma plataforma de publicação de conteúdo, ponto. Como o WordPress, o Blogger e tantos outros, você tem um cadastro ali, escreve, publica e segue com a sua vida.
Se em sua atividade-fim o Medium é mais do mesmo, é na trajetória (da ideia à publicação) e nos detalhes que ele se diferencia. Muito. Ele rompe com algumas convenções e simplifica bastante a experiência. E essas inovações atraem gente muito boa para lá, o que acaba fortalecendo a imagem do Medium: é um local com textos bem interessantes.
Como é o Medium?
A gente já explicou, mas vale recapitular agora que ele está mais acessível e maduro.
O Medium é uma plataforma de publicação de conteúdo. Você não tem um blog, você tem um perfil que se compõe sozinho com um mero login via Twitter. Dali você pode recomendar textos de outros autores e, caso a sua conta já tenha essa permissão, escrever os seus.
O principal mecanismo organizacional do Medium são as Coleções (Collections). Uma Coleção é simplesmente um tema. Ela pode ser privada, onde só entram textos aprovados pelo seu criador; ou pública, onde qualquer um pode arquivar. Traçando uma analogia com blogs tradicionais, é como se fossem categorias.
Visualmente, o Medium é bastante agradável. A identidade visual é marcante e unificada: não existem temas, templates, sequer a opção de alterar cores e fontes. E nem precisa, porque é tudo de extremo bom gosto. Os artigos podem ter uma imagem no topo que preenche toda a extensão da página ou apenas a coluna do texto; e as coleções e perfis, uma imagem lateral.
Como era de se esperar, não há espaço para comentários tradicionais. Em vez disso, o Medium usa um esquema de comentários por parágrafo. Ao passar o cursor do mouse sobre eles, um balão aparece no canto direito. Clique ali e deixe um recado, ou leia os que já foram escritos. É uma abordagem diferente e, pelo menos até onde vimos, bem eficiente — aparentemente o foco em um determinado trecho do texto afunila a discussão e diminui o espaço para comentários vazios e trolling.
Como é o Medium para quem escreve?
Do lado de lá, ou seja, para quem escreve, o Medium é ainda melhor. A experiência de redação é muitíssimo feliz, por dois fatores: 1) ele é verdadeiramente WYSIWYG, ou seja, o “modo editor” é idêntico ao resultado que o leitor verá; e 2) as opções de formatação são limitadas.
Parece ruim, mas essa restrição tem uma série de vantagens. Primeiro, facilita o funcionamento do “modo edição”. Segundo, evita que o foco no texto se perca. Dá para acrescentar imagens no meio do texto, mas apenas centralizadas; alinhamentos à esquerda ou direita não são permitidos. Vídeos? Não. As ferramentas de formatação são apenas negrito, itálico, cabeçalhos (dois níveis), citação e link. Com um duplo Enter, você acrescenta um separador ao texto. E… bem, isso resume o que o escritor tem à disposição. Não há espaço para invencionices, para fugir do que você foi fazer ali: escrever.
O lance de comentários por parágrafo pode ser ativado antes da publicação de um texto, funcionando, nesse momento, como um poderoso e facílimo sistema de revisão. O Medium fornece um link temporário que pode ser enviado a outras pessoas que verão o texto ainda não publicado. Depois, quando ele ganhar o mundo, abaixo do perfil do autor aparece um simpático “Agradecimentos a:” com todos os revisores listados abaixo. Como muito do Medium, uma solução simples e elegante.
Depois da publicação, o feedback mais relevante são as estatísticas. Elas são poucas, mas certeiras: visualizações, quantos realmente leram o texto e número de recomendações. Ficam em uma área à parte, acessível através do menu, e alcançam os ultimos 30 dias.
Por que eu escreveria alguma coisa no Medium?
Essa foi a segunda pergunta que me fiz e repassei para Evan Williams, por email. Ele indicou este artigo, no qual Oscar Godson disserta sobre o motivo de ele ter escolhido o Medium para publicar. (Aliás, é bem comum que textos sobre o Medium ganhem destaque no Medium.)
Os principais argumentos de Godson é que o Medium é fácil de usar e a natureza do serviço de privilegiar o conteúdo em detrimento dos autores. Desde o início, esse parece ser o foco e o que diferencia, de fato, o Medium de outras plataformas.
(A primeira pergunta foi sobre a publicação de textos em outros idiomas que não o inglês. Evan respondeu: “Não é [um site] apenas em inglês. Nós encorajamos você a escrever em português ou qualquer outro idioma que desejar.”)
Não importa se você seja um Zé Ninguém, se seu material for bom, ele encontrará algum espaço ali. Um artigo publicado no Medium não tem conexões com outros artigos do site, não está em uma listagem cronológica inversa como um blog tradicional. Cada texto tem vida própria, como colocou Julie Zhuo:
“Cada post foi criado para ser compartilhado por si mesmo, valorizado por seu conteúdo em vez do seu autor, embaralhado e classificado em diferentes Coleções, como um jornal ou uma revista em vez da coluna semanal de alguém.”
Se você estiver à toa e a fim de ler algo interessante, digite medium.com no seu navegador. A curadoria feita pela comunidade, somada às escolhas dos editores do Medium, é matadora. Sempre, sempre haverá um texto bom na capa, ou recomendado pela (ótima) newsletter semanal, para ser lido.
Essa preferência por conteúdo mais trabalhado, menos efêmero, está renascendo após o extremo do microblogging, da febre do Twitter. É o que alguns chamam de long form writing, ou escrita de fôlego. Buscadores, anunciantes e, principalmente, leitores recompensam mais esses trabalhos mais elaborados. E a satisfação de dar à luz um texto melhor é, também para quem escreve, mais gratificante.
Para ficar alerta
Desde o início a equipe responsável pelo Medium deixou claro que não sabe exatamente no que aquilo daria, apenas que o foco era em escrita de qualidade. Em poucos meses, ele já mudou bastante — antes não havia comentários, o layout era diferente, a autoria ainda menos destacada. Como disse Eduardo Fernandes por email, ter a ciência de que o produto ainda não encontrou um foco e tornar esse processo de “auto descoberta” público é válido.
O Edu, que anda escrevendo algumas coisas muito boas por aqui, ainda deu alguns pitacos sobre pontos importantes e que, talvez, mereçam mais atenção de Evan, seu parceiro de peripécias Biz Stone e cia.
Ele critica a existência de estatísticas — das quais eu também, em certa medida, não sou muito fã. Mas entendo que, para quem escreve, aqueles números crescentes exercem certo fascínio e funcionam como combustível para continuar escrevendo. Foi o que, inclusive, Rosana Hermann comentou espontaneamente em um papo sobre o Medium: “O fato de poder acompanhar as estatísticas, índice de cliques e recomendação é muito interessante e estimulante, faz a gente querer melhorar.”
Outro ponto interessante do Edu é o tipo de conteúdo que domina o Medium, classificado por ele como “autoajuda geek”. Natural se considerarmos que o site ainda está repleto de early adopters, gente da indústria, mas uma característica indesejável se a ideia do Medium é ser um repositório de grandes artigos e ensaios contemporâneos. Como dito acima, também existem muitos “meta posts”, conteúdo do Medium sobre o Medium, o que não ajuda em nada a mudar essa faceta “blog de tecnologia” que ainda é bastante palpável por lá.
O futuro é incerto, e isso é bom
O Medium é fácil e bastante acessível. Qualquer um que entra ali entende como a coisa funciona e o que precisar fazer para publicar um texto. Se entre blogueiros, jornalistas, gente que lida com a palavra escrita o site já tem um apelo enorme, vejo ainda mais potencial para ele entre pessoas que têm boas histórias para contar mas se intimidam com o compromisso que um blog impõe, ou as barreiras técnicas que até o mais simples Blogger da vida apresenta.
Um advogado pode contar um caso curioso ali e nunca mais voltar. O seu texto não ficará pairando em um espaço abandonado, inativo, decadente, como aconteceria em um blog criado apenas para dar vazão àquele texto. Ele estará em uma Coleção, junto a outros já publicados e que serão futuramente. Pode parecer bobagem, mas a mera ideia de ter um blog com o seu nome acarreta uma responsabilidade e tanto. Tenho que escrever, tenho que melhorar esse layout aqui, tenho que conseguir mais leitores, tenho que… por mais despretensioso que seu blog seja, ele exige uma série de ações que pode (e na maioria das vezes consegue) sufocar a criatividade, acabar com o ânimo para escrever.
Rosana Hermann, do R7, já escreve no Medium tem algum tempo e adora o serviço. Perguntei a ela, que mantém o Querido Leitor há uns bons anos, o que torna o Medium tão atraente, e sua resposta ratificou algumas ideias descritas acima:
“A sensação de publicar no Medium é de ‘pertencer’ a uma comunidade, como se fosse uma grande revista, um mega portal. Diferente do blog, que é mais solitário, que é só seu. Quando escrevo no meu blog eu me sinto à vontade demais, blogo descalça. Pra postar no Medium, eu calço um sapatinho… :)”
O Medium é simples técnica e filosoficamente. Ele não pressiona o autor. O feedback dos leitores é, quase sempre, positivo. Ou isso, ou nada. Ele é uma experiência deliciosa, para quem lê e para quem escreve. E não, o Medium não vai acabar com o WordPress, nem tem tal pretensão. Ele talvez nem repita os sucessos que foram Blogger e Twitter, mas em termos de sofisticação é, de longe, o melhor trabalho de Evan e Biz. E só está começando.