Uma pesquisa publicada na revista científica Developmental Science aponta que os pais de baixa renda tendem a falar menos com seus filhos, e isso pode ter consequências na vida das crianças. Os pesquisadores da Universidade da Califórnia em Berkeley estavam “interessados no que acontece quando os pais pensam ou experimentam escassez financeira e descobrimos evidências de que tal tensão poderia suprimir a fala de seus filhos”, disse o autor sênior do estudo Mahesh Srinivasan, professor de psicologia na UC Berkeley em comunicado à imprensa.
Eles queriam entender como os pais de baixa renda se comportavam com seus filhos de três anos. Para isso, o estudo avaliou 84 genitores.
No primeiro momento, separaram os voluntários em um grupo de controle – que descreveu as atividades recentes – e um grupo experimental, que os cientistas pediram que descrevessem a falta de dinheiro. Em seguida, analisaram como era a interação com os filhos.
Os cientistas observaram que as pessoas que retratam a escassez financeira, conversaram menos com os filhos comparados aos pais que demonstraram outras preocupações, como não ter fruta suficiente, e até mesmo em comparação com os pais que não descreveram problemas financeiros.
No segundo momento, os pesquisadores utilizaram dados por meio de um dispositivo chamado LENA, — uma espécie de wearable para crianças, que acompanha suas falas. Durante o período do experimento, gravaram as conversas com os pais e fizeram a contagem de palavras que as crianças disseram e ouviram.
A principal autora do estudo, Monica Ellwood-Lowe, doutoranda de psicologia na UC Berkeley, explicou que a equipe pôde avaliar as gravações dos pais em diferentes fases do mês. No fim do mês, quando a grana fica mais curta e a preocupação com a grana é maior, conversam menos com as crianças.
Segundo ela, isso permitiu a possibilidade de apontar diferenças em padrões de fala quando os pais eram mais ou menos propensos a estarem passando por dificuldades financeiras, independentemente das próprias características pessoais.
Essa ‘lacuna de palavras’ entre pais e filhos foi descrita pela primeira vez na década de 1990 por pesquisadores que rastrearam as interações verbais com crianças de três anos, nas casas de 42 famílias, com o intuito de analisar o desenvolvimento da linguagem dos pequenos.
Srinivasan explicou que os resultados sugerem que o treinamento dos pais pode não ser suficiente para preencher a lacuna de desempenho acadêmico sem abordar a questão mais ampla da desigualdade de renda.
Ellwood-Lowe disse que a pesquisa não significa que as crianças cujos pais estão enfrentando problemas financeiros sejam condenadas a ter vocabulários menores, pelo contrário, a ideia é realmente destacar a importância de garantir que os pais tenham os recursos de que precisam.
O estudo, na verdade, descreve o quão difícil é para um pai explicar porque o céu é azul para seu filho, se ele estiver preocupado como colocar comida na mesa, ou como irá pagar o aluguel, escola e acertar contas. O cenário da pandemia, por exemplo, só agravou a situação. Além da lacuna de palavras entre pais e filhos, as preocupações financeiras, perda de renda e outros fatores podem gerar estresse e ansiedade.
Srinivasan, no entanto, destaca a importância de eliminar essa lacuna. De acordo com o pesquisador, os resultados sugerem que aliviar os pais de seus encargos financeiros, por meio de programas sociais que beneficiam famílias de baixa renda, por exemplo, também pode mudar a maneira como eles se relacionam com seus filhos.