Por que salvar a natureza é a melhor maneira de evitar pandemias

Novo relatório mostra como as atividades humanas criaram riscos sem precedentes de pandemias e outras doenças zoonóticas.
Um jacaré morto é visto no Pantanal na Estrada Parque Transpantaneira no estado do Mato Grosso, Brasil, em 12 de setembro de 2020. O Pantanal está sofrendo seus piores incêndios em mais de 47 anos, destruindo vastas áreas de vegetação e causando mortes de animais devido ao fogo ou fumaça. Foto: MAURO PIMENTEL/AFP (Getty Images)

Os mesmos cientistas que alertaram o mundo no ano passado que 1 milhão de espécies correm risco de extinção agora fazem uma advertência sobre a “era da pandemia” — e nós deveríamos ouvir.

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Na quinta-feira (29), a Plataforma Intergovernamental sobre Serviços de Biodiversidade e Ecossistemas divulgou um novo relatório mostrando como as atividades humanas criaram riscos sem precedentes de pandemias e outras doenças zoonóticas. Mas podemos detê-las — e sai muito mais barato do que correr atrás do prejuízo depois.

O relatório é o resultado de um workshop com dezenas de cientistas e profissionais que trabalham com saúde pública e conservação. Embora o COVID-19 tenha sido a motivação, não é a única razão pela qual precisamos pensar sobre como salvar a natureza para nos salvar.

O novo coronavírus é um dentre um número crescente de doenças zoonóticas ou de origem animal que atingiram os humanos. O vírus matou cerca de 1,2 milhão de pessoas em todo o mundo, causou estragos econômicos e bagunçou a vida das pessoas. Mas ele não está sozinho.

De acordo com o novo relatório, 70% das doenças emergentes são zoonóticas por natureza e existem até 580 mil vírus não descobertos que são transmitidos por animais e podem infectar humanos.

Se a pandemia atual, junto com outros exemplos recentes de vírus Ebola e Zika, servem para indicar alguma coisa, não queremos desafiar o destino e facilitar o encontro desses vírus com hospedeiros humanos. No entanto, estamos a caminho de precisar preparar nosso sistema imunológico para uma batalha contra doenças mais perigosas.

Embora os animais sejam portadores de doenças que afetam os humanos, não são eles os culpados pelas transmissões. Em vez disso, são atividades humanas. O desmatamento, o comércio de animais selvagens e as mudanças climáticas estão entre os maiores fatores que impulsionam o aumento da ameaça de uma nova pandemia.

Todos esses fatores estão levando humanos e animais a uma maior proximidade e a uma competição por recursos cada vez menores. No caso das mudanças climáticas, o aumento das temperaturas também está permitindo que animais tropicais e doenças como a malária se espalhem em direção aos polos.

Como observa o relatório, o clima cada vez mais inóspito também pode forçar as pessoas a migrarem de lugares que ficam inundados, muito quentes para viver ou muito secos para cultivar, trazendo novas doenças com elas no processo.

As corporações, como sempre, claramente não estão trabalhando para impedir a propagação de doenças nem os danos sociais que a acompanham. A atual pandemia de coronavírus deve representar uma queda de US$ 16 trilhões na economia somente neste ano.

Embutidos nesse grande número estão incontáveis histórias de pessoas perdendo seus meios de subsistência, despejos e encerramento de serviços públicos, tempo perdido que poderia ter sido usado para aprender ou para se divertir com amigos, e milhões que perderam entes queridos.

Os danos também castigaram desproporcionalmente os mais pobres e comunidades de minorias étnicas, agravando a desigualdade. Os impactos do vírus são tão insustentáveis ​​quanto as condições que criaram a pandemia.

“Não é tão simples quanto precisarmos de mais dinheiro para desenvolver vacinas”, disse Peter Daszak, presidente da EcoHealth Alliance e autor do relatório, em uma coletiva de imprensa. “Este é um problema fundamental do sistema porque temos um crescimento econômico insustentável em todo o mundo.”

As descobertas do relatório apontam para a necessidade de aumentar os gastos globais na vigilância de novas doenças zoonóticas para US$ 40 bilhões a US$ 58 bilhões anualmente. É um pequeno preço a pagar em comparação com os danos do coronavírus, sem falar dos estimados US$ 1 trilhão em danos causados ​​por outras doenças zoonóticas a cada ano.

“Se você investir US$ 1 na prevenção, receberá US$ 100 em troca. Por que não estamos fazendo isso?”, disse Daszak.

Além disso, são necessárias políticas para reduzir e regular o comércio de animais selvagens, que envia milhões de animais para todo o mundo todos os anos (incluindo 10 a 20 milhões de animais selvagens importados apenas para os EUA). Mas também há recomendações mais amplas que mostram o quanto precisa mudar nas próximas décadas no que diz respeito ao nosso relacionamento com a natureza.

A restauração ecológica generalizada é necessária para que os animais tenham habitat e fiquem mais longe de nós, o planejamento do uso da terra deve levar em conta a saúde pública e precisamos restaurar nosso relacionamento com as comunidades indígenas para integrar o conhecimento tradicional na resposta médica, bem como proteger os ecossistemas para garantir que as doenças não surjam em primeiro lugar.

Do ponto de vista social, também precisa haver uma grande mudança no consumo. A floresta tropical está sendo derrubada para a produção de óleo de palma ou soja. As mudanças climáticas são impulsionadas em grande parte pelo consumo excessivo dos ricos, desde viagens de avião a novos telefones.

O relatório pede uma “mudança transformadora”, ecoando o estudo histórico que o grupo divulgou no ano passado. Se a escolha for entre um novo telefone e o destino de 1 milhão de espécies e da vida humana como a conhecemos, não é difícil saber qual a opção certa.

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