As smart TVs têm um problema de apps que são descontinuados
No começo de 2014, com a expectativa da realização da Copa do Mundo no Brasil, a Samsung anunciava para suas smart TVs o “Painel Futebol”, um app para acompanhar vídeos, notícias e resultados de clubes do Brasil e do mundo. Na época, Silvio Stagni, então vice-presidente da área de consumer electronics da empresa, dizia: “Estamos muito orgulhosos em conseguir inserir ainda mais o torcedor-telespectador no jogo”.
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Menos de dois anos depois, porém, o jogo virou. Os donos de TVs Samsung receberam uma mensagem de que o Painel Futebol foi desativado no último dia 31 de março. Claro, teve gente que não ficou contente. “Fiquei decepcionado porque comprei uma TV de um modelo e pouco mais de seis meses vejo a mesma TV se transformando em um outro produto, que eu não sei até quando vai funcionar para a finalidade que eu adquiri”, diz Wellington José Barbosa, 43.
Detalhe de aviso que aparece em TVs da Samsung falando da indisponibilidade do recurso Futebol e do fim do suporte ao Skype.
No último mês de dezembro, o funcionário público de Goiânia pagou R$ 1.800 num modelo de tela curva de 40 polegadas da Samsung. Ele reclama que, além do Painel Futebol, outros apps deixaram de funcionar na TV sem substitutos ou similares.
O problema vai além da Samsung. É cada vez mais comum encontrar donos de smart TVs insatisfeitos com o suporte das fabricantes para os aplicativos. Como mostrou a Pnad 2014, 47,9% das TVs no Brasil são de tela fina, e, certamente, um bom contingente desses aparelhos possuem recursos inteligentes. Assim, esse tipo de enrosco deverá ser cada vez mais comum para o consumidor brasileiro.
As fabricantes apontam o dedo para os desenvolvedores. “É comum os desenvolvedores deixarem os modelos mais antigos para focar nos mais recentes”, diz a TP Vision, responsável pelas TVs da Philips. “Existem acordos de parceria com estes provedores de conteúdo, porém eles não garantem suporte às aplicações por tempo indeterminado”.
Isso é o que vai acontecer a partir de 2 de junho com o Skype em todos os modelos de TV. A Microsoft retirou suporte para o app de videochamadas alegando que pouca gente usava. Mas pouca gente não é a mesma coisa que ninguém. O Wellington também comprou uma webcam da Samsung para TVs (modelo VG-STC3000) por R$ 390 para utilizar o Skype. Vai virar lixo eletrônico.
Contatada sobre o assunto, a Microsoft indicou esta página sobre o fim do Skype para smart TVs. Basicamente, eles dizem que pode ser que o app continue a funcionar, caso a fabricante não remova o aplicativo.
Sem padronização
Mesmo assim, as próprias fabricantes de TV parecem perdidas quanto às plataformas e apps de suas TVs. Por exemplo, a Smart TV Alliance – associação que reúne fabricantes e desenvolvedores na busca por padrões de desenvolvimento – avançou bem pouco (para não dizer que fracassou). E as fabricantes mudam de plataforma constantemente.
Desde 2014, a LG está com o webOS; no ano passado, a Panasonic adotou o Firefox OS e a Samsung migrou para o Tizen. Ao escolher o Tizen, as TVs da coreana perderam suporte para o Spotify. Parece aquele período pré-polarização Android/iOS/Windows Phone, no qual todas as fabricantes de smartphones lutavam para ver o que emplacava. Enquanto isso, os usuários ficam perdidos e observando um rastro de apps e serviços mortos e sem suporte.
“Quando o YouTube parou de funcionar, fiquei muito decepcionado com a Philips, pois penso que eles deveriam dar um jeito, afinal eu comprei a TV com esse recurso. Outros apps também pararam de funcionar”, diz Leandro Pessoto, 34, professor universitário em Maringá (PR). “Não costumo trocar de TV com frequência. Fico com ela até o momento que surge alguma tecnologia que realmente compense a troca.”
Esse é o ponto central da questão. Embora apps e serviços sem suporte num smartphone sejam um saco, as pessoas trocam de celular com muito mais frequência do que trocam de TV.
Quem aí conhece alguém que compra uma televisão nova todo ano? Assim, a desculpa de fabricantes e desenvolvedores de que modelos mais antigos não podem receber suporte desagradou entidades ligadas à proteção de direitos do consumidor.
“A Samsung vendeu essa função [Painel Futebol] e não poderia retirá-la agora. Isso caracteriza descumprimento de oferta. A empresa não informou o tempo de vida do serviço, portanto, pressupõe-se que é enquanto dura a TV”, diz Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste. Ela diz que a entidade fará um questionamento formal à Samsung em relação ao caso.
Além disso, a Proteste afirma que consumidores que se sentirem lesados por apps que param de funcionar podem fazer um questionamento às empresas via Procon. Lembre-se: é sempre bom guardar nota fiscal e até anúncios publicitários do modelo comprado.
Para a reportagem, a Samsung emitiu uma nota, que diz:
“Como parte de nossa permanente estratégia de melhor atender as necessidades dos nossos consumidores, o Painel Futebol para as Samsung Smart TVs de 2014 e 2015 foi descontinuado na América Latina no dia 31 de Março de 2016.
Permanecemos empenhados em fornecer aos nossos clientes uma experiência de conteúdo única e exclusiva. Os consumidores que tiverem qualquer dúvida sobre o assunto, podem contatar-nos diretamente por meio do telefone 4004-0000.”
Enquanto fabricantes e desenvolvedores deixam seus clientes na mão, Leandro tem uma dica preciosa: “Não compre uma TV por conta dos apps, pois isso depende de muitas variáveis técnicas e de acordos comerciais. Adquiri um Chromecast. É mais em conta do que comprar outra TV e ainda tem muitos recursos. E também assim não fico na mão dos acordos de fabricantes.”
Foto do topo: TV da Samsung exibida durante a CES 2016. Crédito: Samsung Tomorrow/Flickr