Raios cósmicos podem ter formado dunas gigantes em Titã, uma das luas de Saturno
As dunas equatoriais da lua Titã, de Saturno, estão entre as superfícies mais peculiares do Sistema Solar, mas os cientistas não sabem exatamente como elas se formaram. Novas evidências experimentais sugerem que as dunas surgiram como resultados de raios cósmicos atingindo o gelo da superfície de Titã.
Titã é um dos lugares organizados no Sistema Solar. É uma lua saturniana que apresenta uma atmosfera densa, líquidos na superfície na forma de lagos e mares de hidrocarbonetos, enormes tempestades de poeira e vulcões de gelo que expelem jatos de água em vez de lava derretida. Titã também possui um deserto equatorial, chamado Shangri-la, que abriga uma rede de dunas monumentais, com a mais alta chegando a 100 metros de altura. Usando a sonda Cassini, da NASA, e a sonda Hyugens, da ESA, os pesquisadores conseguiram observar essas dunas, que se estendem por uma área que mede mais de 10 milhões de quilômetros quadrados.
Na Terra, as dunas de areia são compostas principalmente por silicatos, mas as dunas escuras de Titã são construídas a partir de materiais orgânicos, cuja origem e composição permanecem desconhecidas.
Pesquisas anteriores sugeriram que esses materiais orgânicos foram criados na atmosfera de Titã, como resultado de uma reação em cadeia envolvendo metano, nitrogênios e fótons solares. Nascidas no céu, essas partículas choveram na superfície do deserto, fornecendo os substratos para as dunas ao longo de escalas de tempo geológicas.
Superfície da lua Titã, de Saturno. Crédito: Universidade do Havaí
Uma nova pesquisa publicada nesta semana no periódico Science Advances apresenta uma nova explicação, sugerindo que as partículas formadas diretamente na superfície de Titã devido a reações químicas complexas desencadeadas pelo bombardeio constante dos raios cósmicos interestelares.
Graças à nossa confiável magnetosfera, a superfície da Terra está protegida contra este tipo de radiação, mas o mesmo não se pode dizer de Titã, que só pode contar com sua densa atmosfera para absorver a radiação recebida.
O físico-químico Ralf Kaiser, da Universidade do Havaí, e seus colegas conduziram um experimento para verificar se o acetileno congelado — um composto químico usado na soldagem — poderia ser convertido em moléculas orgânicas complexas, como as encontradas em Titã, especificamente benzeno e naftaleno. Esta pesquisa foi motivada por observações anteriores do gelo acetileno em regiões próximas às dunas de Titã.
Para simular os efeitos dos raios cósmicos, os pesquisadores explodiram suas amostras com elétrons de alta energia e aqueceram esse produto quimicamente convertido até o ponto de sublimação (quando os sólidos se transformam diretamente em gás) para análise química. O experimento produziu o efeito desejado, transformando o acetileno em lixo orgânico escuro ou, mais tecnicamente, hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (PAHs) contendo até três ou quatro anéis de carbono.
A nova pesquisa mostra que os PAHs, incluindo naftaleno e fenatreno e seus precursores benzeno, fenilacetileno e estireno, podem ser sintetizados irradiando acetileno congelado — um processo que pode estar acontecendo na superfície de Titã e subsequentemente agindo como “uma matéria-prima molecular crítica para o material orgânico das dunas”, escreveram os autores do estudo.
Obviamente, isso não prova que as dunas de Titã foram produzidas da mesma maneira, mas representa uma possibilidade intrigante — tanto para a Titã quanto para outros lugares do Sistema Solar, incluindo corpos celestes desprovidos de atmosfera. No mesmo comunicado à imprensa, Matthew Abplanalp, coautor do estudo, disse que “desvendar a origem e os caminhos químicos para formar essa material orgânicos das dunas é vital não apenas para entender a evolução química de Titã, mas também para entender como a química da lua era antes de a vida emergir na Terra há 3,5 milhões de anos”.
Ainda não sabemos ao certo de onde os materiais das dunas vieram ou de que são feitos, mas o drone aéreo da NASA Dragonfly pode descobrir mais pistas sobre esse mistério, pois a fase inicial da missão verá a sonda investigar uma série de dunas de areia. Infelizmente, teremos que esperar um pouco, pois o Dragonfly não estará no céu nebuloso de Titã até meados de década de 2030.