[Review] iPad, gadget mágico ou brinquedo inútil
Durante estes 3 meses que estive com o iPad, ouvi dezenas de perguntas. As duas principais: “Devo comprá-lo?” e “quando você vai escrever sobre no Giz?”. É impossível dar uma única resposta para a primeira ou fazer um review com notas, pontos positivos e negativos e ficha técnica de um produto como o iPad. Por outro lado, não há como ignorá-lo, ainda mais agora que aumentam os seus rumores sobre o lançamento oficial no Brasil e há mais gente comprando ou considerando a sua compra.
Como resposta a isso, este é o maior e mais ambicioso review que já fizemos. Até porque não é uma simples análise de produto. É uma conversa sobre um dos inventos mais polarizadores de opinião desde a bomba atômica. E essa é apenas a primeira hipérbole que você vai ler nas próximas 4.810 palavras.
Minha intenção: antes de decidir se ele é, como no título, um gadget mágico que muda vidas ou um brinquedo inútil de gente que tem dinheiro de sobra, tente entender a tábua de Steve Jobs. Se sua pergunta não for respondida, poste nos comentários que faremos uma continuação.
O iPad criou espaço na sua mochila em viagens. reuniões ou coletivas? O que ele substituiu?
Difícil. À primeira vista ele só acrescentou peso (670 gramas) à minha mochila. Mas retirou todas as revistas e livros – sempre andava com alguns e tirou a razão de ser do meu DS e do PSP também, então, em termos de peso, não avançamos. Como escrevo muito, continuo precisando do meu fiel notebook para trabalhar. Ao menos para viagens, posso despachar o note e ficar só com o iPad. Em casa ele costuma ficar num dock na sala, perto do sofá ou da cama. Sofá, cama e cercanias da privada são os terrenos onde ele rende melhor, digamos.
Ah, mas meu amigo que tem o iPad, 3 iPhones e 8 iPods disse que dá para trabalhar com ele sim, que é o computador mais usado da casa e tal.
É uma mentira que soa bem. Nós sabemos que o iPad está machucando as vendas de notebooks, mas não acredito que seja para trabalho. Não me entenda mal, é possível trabalhar no iPad. É possível. Assim como é possível trabalhar em um smartphone, respondendo e-mails, dando ok para documentos e fazendo anotações. Mas acho uma bobagem usar um celular (qualquer que seja) ou um iPad para trabalhar seriamente. Não é a condição ideal, gasta-se mais tempo em tarefas simples como digitar com acentos (coisa que muita gente não se preocupa, ok) ou selecionar um pedaço grande de texto e colar em outro lugar. Mas isso pode ser pelo tipo de trabalho que realizo – escrevo muito.
No meu desktop ou notebook, o Photoshop está sempre aberto, Word, umas 15 janelas, Google Talk, um cliente de Twitter, o Zune. Eu preciso de tudo isso para trabalhar (música inclusive). Dá para resolver quase tudo com o navegador – é o que aposta o Chrome OS – mas eu gasto bem menos tempo em um desktop ou note parrudo. Mas trabalho seriamente com o computador, preciso de programas específicos que nas versões para o iOS (lembre que o iPad tem o sistema operacional de um smartphone) aparece em versões até boas, mas incompletas.
Isto posto, se você é um executivo que precisa de algo para mostrar coisas em reuniões, fazer anotações, checar e-mails e tudo, ele funciona bem. Na Europa vi muita gente em coletivas com alguma variação do conjunto ao lado: teclado e iPad: a dupla resolve as tarefas mais simples. Eu mesmo já usei um bocado do iPad para fazer anotações em coletivas, (dá para digitar bem rápido no teclado virtual uma vez que você pega o jeito e acha a posição no colo). Mas trabalhar sério, quase impossível.
Esse papo de trabalho me cansa. Eu quero usar o iPad para tudo menos trabalho. Aí que ele é melhor, não?
Ah, aí que ele brilha, que bom que você fez essa pergunta.
Eu não fiz essa pergunta, você teve que escrever para puxar o assunto.
Para você ver como é o problema das expectativas erradas (criadas em parte pelo próprio Jobs, diga-se). Eu olho o meu Zune HD, que tem uma tela minúscula, só 3 joguinhos, um navegador medíocre, que não funciona como pen-drive… E ele é, de longe, a melhor experiência para quem gosta muito de música (motivos aqui). O lance é que eu espero que o Zune HD faça isso bem, nada mais, e por isso estou muito satisfeito. Se quisesse substituir um iPod Touch por um Zune HD ficaria decepcionado, já que o negócio da Apple é um computador para todos os fins. Mas como pra mim música é muito importante, e estou bastante feliz com a minha escolha.
Com o iPad é mais ou menos a mesma coisa. Não espero trabalhar com ele, nem substituir meu notebook. E aí o uso para ler de tudo, jogar, mexer em fotos, criar música (coisa que tinha quase que abandonado). E nessas tarefas ele é, se não melhor, ao menos mais interessante, divertido e prático. Basta dar o slide to unlock que em menos de 10 segundos estou de volta na página que deixei o livro ou jogando alguma coisinha. Isso um note não faz.
Então, para você, ele é um brinquedo.
Sim, como meu PlayStation 3 é um brinquedo, como um sistema de som decente é brinquedo, como um Kindle é, ou como uma guitarra para um músico não-profissional. Não vejo nada de errado em pagar um bom dinheiro para entretenimento de qualidade ou comida para o cérebro. Chame isso de brinquedo, tudo bem pra mim.
Você falou em Kindle. O Reader da Amazon e esses outros são melhores para ler, não?
Não acho, pelas possibilidades do iPad – no Kindle ou outros e-reader você basicamente lê apenas livros: qualquer outra coisa é muito lenta, em definição ruim. Ainda há muito debate sobre a questão da tela do iPad cansar demais a visão ou não – eu não sofri com isso, mas conheço gente que sofre. No geral é uma coisa que vale pra qualquer tela: se você a assistir muito próximo da cara sem outra fonte de luz, é ruim. Mas com as regulagens de brilho na tela e fundo (branco, sépia e preto) acho que ele é muito bom para ler. O iPad (assim como o Kindle) é muito melhor, de maneira geral, para ler, acho, do que um livro de papel e sem dúvida vai matá-lo no médio prazo. Se você quiser ler de noite, é só deixá-lo apoiado, travar a orientação para vertical e dar leves toques para virar a página. Isso é mais confortável que um livro normal, especialmente se for um desses grandes e pesados.
Há outras comodidades, como ler sobre algum livro na internet, passar no site da Amazon e em segundos você já pode começar a ler. Além de pequenos detalhes, que podem ser ilustrados pela minha experiência. Eu li um livro bacana (o primeiro da série do Stieg Larsson) e, como minha namorada ia passar alguns dias viajando, comprei a versão de papel, também em inglês, pra ela. Quando ela voltou de viagem, preferiu ler a versão no iPad (que deixou de ser meu por alguns dias). Além de não precisar de iluminação extra à noite, ele ainda tem um dicionário embutido+wikipédia se precisar checar alguma coisa. A única desvantagem, pra mim, é que não dá para emprestar o que você lê.
Mas o Kindle é bem mais barato.
Sim, não estou desmerecendo o Kindle. Não acho que eles estejam competindo diretamente, na verdade. Mas o iPad brilha como leitor de qualquer coisa – e de várias lojas, como a do próprio Kindle, iBook, Nook e nacionais. Preste atenção nesse vídeo que eu fiz demonstrando as possibilidades de leitura:
Livros, revistas, Instapaper, muitos quadrinhos! Redescobri meu gosto por quadrinhos com ele. E melhor: com o iPad, vou economizar, no longo prazo. Há graphic novels sensacionais por 5 dólares, e a Wired, que eu sempre paguei R$ 29 aqui, sai por 4 dólares. Se você é um leitor voraz de mídias diversas, vai ser um bom negócio.
But I don’t speak English.
Yes you do!
Mas foi só o que eu aprendi. Tudo isso que você me mostrou não serve pra mim que não falo a língua dos porcos imperialistas.
De fato. Por isso que quando ele foi anunciado lá atrás eu disse que ele fazia bem menos sentido no Brasil. Mas há movimentos para que isso mude: a Veja lançou seu aplicativo, sites como G1 (com um app para acompanhar o campeonato brasileiro) e a Livraria Saraiva já lançaram seus apps para iPad, já que há, segundo estatísticas da própria Veja, pelo menos 20 mil dos tablets aqui. Ainda está longe, muito longe do ideal. Mas se você tiver paciência de catar pdfs e comprar ePubs na rede, vai usá-lo em PT-BR do mesmo jeito, mas com menos conteúdo e de maneira bem menos prática.
Ler é chato. Eu posso usar isso para aposentar meu Nintendo DS e PSP?
A resposta é complicada. Pra mim, aposentou totalmente. Mas, por partes: eu diria que quem nunca teve um PSP ou DS vai usar o iPad e nunca pensar em comprar um desses. Há jogos para iPad para todos os gostos. Há coisas boas de ação, como Predators, Canabalt, Samurai HD, Dungeon Hunter HD, puzzles sensacionais como Angry Birds HD, Cogs HD, Brain Challenge HD, jogos de reflexo como Super 7 HD,Veggie Samurai, e dispositivos de sugar seu tempo como os viciantes Flight Control, Plants vs Zombies HD e tantos outros.
Na pior das hipóteses, os jogos de corrida e de tiro podem impressionar as pessoas. Como o Predators, que aponta para as possibilidades gráficas do bicho:
É claro que gamers de videogame portátil hardcore não vão se sentir tão em casa. Um jogo como God of War: Chains of Olympus, que eu enlouqueci no PSP, não funcionaria aqui, porque em algumas situações é sim necessário controles físicos. Mas, honestamente, mesmo antes do iPad eu aponsentei o PSP: quando estou na rua, jogo coisas mais simples/paradas no celular, tipo variantes de Picross e Sudoku. Para ver sangue e botões apertados alucinadamente, fico nos videogames de verdade, em casa.
Mas eu tenho um iPod/iPhone, inclusive jogo muito nele. Precisa desse iPad aí?
Precisar, não precisa. Mas o fato é que os meus preferidos no iPad são jogos de cartas/tabuleiros e os de estratégia em turnos, como Civilization Revolution e Wesnoth, que parecem ter sido feitos para a tela grande. Ver mais coisas na tela e ter mais precisão nos controles é bem importante. E já há alguns joguinhos que usam o iPhone/iPod Touch como controle ou como complemento – isso é uma tendência.
Mas com o celular eu posso jogar no ônibus, metrô e tal. Você não perde muito do iPad por não poder usá-lo em lugares púbicos no Brasil, por conta da segurança?
Sim, perde. Até que ponto perde depende de uma série de fatores. Pode me chamar de louco, mas o iPad sai de casa ao menos uma vez por dia, debaixo do braço, quando vou almoçar em algum restaurante/boteco da esquina. Mas eu trabalho em casa e moro numa região bastante segura para os padrões brasileiros. Já o usei mais de uma vez em viagens longas de ônibus dentro da cidade. Já vi até gente com ele no metrô. Mas, de novo, vale o bom senso, a hora que você carrega, etc. Uma coisa que ajuda muito é o case dele. Pode parecer que você está lendo um livro e não chama atenção. Aliás, fora do case só em lugares bem seguros, como em casa ou no escritório. Verdade seja dita, raríssimas vezes eu o tiro da capinha oficial da Apple (preta, com uma maçã discreta).
Outro problema do Brasil é que ele esquenta demais e morre, não é?
Sim, essa é uma denúncia comum, real, apesar de nunca ter acontecido comigo – mas porque comprei o iPad no inverno paulistano e não o usona praia, por exemplo. O que aconteceu com alguns usuários dele nos EUA é que a temperatura ambiente era tão alta que ele exibiu essa mensagem aí e desligou, voltando ao normal em um lugar mais ameno. De todo modo, ele opera de maneira fria. Nunca senti ele esquentando como os smartphones.
Então se eu estiver desenhando com ele na praia pode dar problema?
Pode. E antes que você que está lendo ache essa uma cena insólita, diria que a possibilidade de pintar (não exatamente na praia) é uma das coisas menos faladas e mais sensacionais do iPad. Não só pintar, mas ter a chance de usá-lo como instrumento de expressão artística. Como tela para pintura, aliás, ele está bem servido de programas (meu preferido: SketchBook Pro, da Autodesk). Há gente fazendo coisas efetivamente lindas, como isso:
Como ex-guitarrista de banda (ruim. A banda era ótima), foi ótimo encontrar possibilidades de anotar ideias de música. Com o miniSynth Pro consigo gravar melodias com sons interessantes e o moxMatrix (uma espécie de fruity loops) me permite fazer uma base rítmica diversificada. Faltam bons programas que juntem tudo isso, infelizmente.
Mas eu não tenho talento, Pedro.
Aí que está a coisa mais sensacional. A “pintura” lá de cima foi feita com um programinha bacana chamado Artists Touch. Há vários deles, tanto de música (Bloom HD) quanto de pintura/foto que permite você fazer coisas que precisariam de bastante experiência nos programas “grandes” como Photoshop e Illutrstator para operar. Mesmo que você não produza coisas fabulosas, ao menos a sensação de criação artística é bem legal, e pode acordar algum talento adormecido seu. Além de impressionar as pessoas.
Impressionar! Dá pra pegar mulher com ele?
Minha namorada, minha outra metade, usa bastante o iPad também, já leu um bocado de coisas nele, inclusive. Ela gosta do gadget.
Não foi isso que eu perguntei.
Ok, a resposta é sim. Ao menos foi isso que disseram ao Steve Jobs em um e-mail (esse aí em cima). A verdade é que nesse tempo inteiro que estive com o iPad foi bastante comum pessoas aleatórias me perguntarem no restaurante ou no avião se aquilo era um iPad, se era legal e tal. Em nenhuma outra situação na minha vida (talvez em uma festa à fantasia em 2002), acho, tantas pessoas puxaram assunto, mulheres inclusive.
Se você tiver alguma habilidade social e não babar/tiver mau-hálito, as pessoas continuarão perguntando: é bom pra ler? O que dá para fazer mais? É caro? Onde compra? E as pessoas vão achar o negócio próximo de “mágico”, abrir um sorriso, se você engatar as respostas com uma demonstração de alguns programas bacanas. Aí é contigo. Contigo. Eu não preciso disso, ok?
Toda vez que eu leio “iPad” e “mágico” na mesma frase eu fico puto. E você escreveu isso aí em cima. Você é um fanboy, não é?
O iPad foi o primeiro produto da Apple que comprei na vida, tenho um Android e um computador com Windows 7 e adoro ambos. Não torço por qualquer empresa, então acho que dificilmente posso ser considerado “fanboy”.
Isto posto, há várias coisas mágicas no iPad para vários tipos de pessoas. Quando um bebê de menos de um ano ficou um dia na minha casa, baixei um aplicativo de som de animais, desses de apertar, ouvir o nome e o barulho. Ele achou o máximo. Consegui entreter uma criança mais grandinha com meia dúzia de jogos. Músicos invariavelmente acham alguma função nele, sejam DJs ou malucos por sintetizadores analógicos. Mesmo as fotos em 360° da Wired ou a maneira com que você pode manipular a foto são “mágicos”, já que não há nada parecido em outros dispositivos e parece sim uma coisa meio Minority Report.
Não é exagero. É realmente impressionante. Experimente um na sua mão com algum demonstrador experiente. Ou veja algum desses vídeos.
Você pode dizer que, do ponto de vista de programação, o que mostrei e falei são coisas relativamente simples, eu sei, mas o que importa é a velocidade e facilidade de tudo isso. E, veja, tudo que eu listei está disponível apenas no dispositivo da Apple, e fazem mais sentido seja porque sua tela é maior e mais sensível ou porque o mercado de aplicativos é bastante mais maduro. Então, sim, para muita gente, ele é mágico, e os concorrentes, ao menos no primeiro momento, não serão.
Então você diz que não é fanboy mas acha que o iPad não tem concorrentes?
Para com essa história da fanboy
Ok.
Ok.
Mas explica.
Boa parte das coisas “mágicas” do iPad que listei acima são provenientes dos seus aplicativos. Já há uns bons 20 mil apps no iTunes específicos para ele, fora todos os 250.000+ para iPhone. Os cínicos que nunca usaram um iPhone por mais de um dia insistem em dizer que ali só tem “simuladores de peidos”. Não. Há bobagens, é claro, mas há bem mais coisas sensacionais e específicas que no Android Market, proporcionalmente e em números absolutos, como os profissionais e de música que falei ali ou as centenas de joguinhos de qualidade. Então o primeiro motivo de o iPad não ter concorrentes é o ecossistema de apps. O motivo 1.1 é o iOS, bem mais adaptado à interface de toque. Já testamos o Windows 7 em um tablet e dá para cravar que ele não funciona direito ali. E até o Google já avisou que o Android 2.2 não foi pensado para um formato maior. Em outras palavras, não há software comparável por enquanto para essa função (ao contrário dos smartphones).
Sistema operacional é questão de gosto. E hardware?
Também é difícil de achar concorrência. Veja, por exemplo, um detalhe que pouca gente enfatiza: a qualidade da tela com IPS. Para mim, ângulo de visão é algo bem importante, já que mostro muitas fotos para as pessoas. Se você tem um notebook que não é top de linha, provavelmente quando mostra um vídeo para alguém tem que reposicioná-lo ou levantar/abaixar a tampa para a imagem não ficar muito clara ou escura. Isso não acontece no iPad, há bastante cor e brilho em qualquer ângulo.
Mas obviamente o destaque é o conjunto processador rápido e bateria gigante. Não se sabe exatamente qual o clock do processador proprietário da Apple, mas sabe-se que ele é inacreditavelmente rápido operando dentro do iOS. A concorrência está entre usar um snapdragon, processador de celulares, ou um Intel Atom, como alguns tablets operando com Windows 7. O A4 é substancialmente mais rápido, e com a aceleração de vídeo, roda bem coisas que são impensáveis em netbooks – alguns joguinhos, por exemplo.
Mas o melhor de tudo é ter uma bateria que dura 10 horas de uso. Essa era a promessa, e de fato se concretizou. Nesse tempo todo, o mínimo que ela durou foi mais ou menos umas 8 horas quando usei mais para jogos que consumiam muito. Mas se você ficar só em vídeos, vai a 10h. Livros e revistas, passa de 12h. Uma vez viajei de carro e esqueci o meu Zune HD, usei o iPad como iPod ligado ao som do carro, com a tela desligada. Em 3 horas ele perdeu 2% de bateria. Por causa do seu fôlego, você nunca precisa desligá-lo, é só você dar o “slide to unlock”. Ele fica mais de uma semana só em standby. Nenhum concorrente tem focado muito nesse quesito, que para mim é matador. E isso, de poder pegá-lo e usar instantaneamente a qualquer hora, sem se preocupar com a tomada, é o que o diferencia fortemente de um note/netbook.
Então é iPad ou nada?
De novo, depende do seu uso (DDSU, doravante). Apesar de todos os meus elogios aqui, diria que 50% do meu tempo com o iPad poderia ter sido gasto em um tablet genérico como o Galaxy Tab (apesar de preferir uma tela maior). Como li muito, o app do Kindle para Android ou um leitor de pdfs seguraria bem a onda, assim como o navegador do Android 2.2, que até Flash tem, como vantagem.
Mas a facilidade de saber que as revistas, livros especiais, HQs e jogos serão lançadas primeiro para o iPad e que sempre haverá um Plants vs Zombies ou Civilization me esperando lá quando quiser sair do Kindle me faz crer que, num horizonte de pelo menos 10 meses, não haverá concorrência. Mas, DDSU, se você ficar só navegando e lendo livros, poderá achar uma outra combinação de hardware e software (e preço) mais interessante. Mas para a imensa maioria, o iPad vai continuar sendo matador. Ainda mais pelo preço: ninguém anunciou um produto semelhante sequer no mesmo patamar. Desafiando a lógica, a Apple entrou antes no segmento e cobrando menos.
Chega de elogios. O que mais te incomoda?
De tudo, acho que a necessidade do iTunes para a mediação de um monte de coisas. A organização das fotos, por exemplo, é ridícula (não dá para criar álbuns no iPad) e para passar músicas, só com o programa, que é pesado e gigante. O Wi-Fi pode ter problemas em algumas redes públicas ou de IP estático. O autobrilho não funciona direito e o cliente de e-mail, apesar de bonito, podia ser bem mais funcional (onde está o ir ao topo?! Obrigado a quem respondeu. Ainda assim, é preciso de mais toques que o cliente de Gmail do Android para fazer boa parte das coisas). Acima de tudo, ele é um pouquinho mais pesado que o que eu gostaria com o case que sempre está nele e é meio necessário.
Isso é o que me incomoda de fato. Mas, para a lista ficar completa, não poderia faltar: a ausência de portas. Adaptador para ligar em um monitor? Ter de comprar um dongle para colocar o cartão SD da câmera? Isso é triste, DDSU. A ausência de um autocompletar em português ou facilidade em acentuar (seria pedir demais) me faz quase nunca usá-lo para digitar, mas como o e-mail, deve melhorar na atualização. A falta de flash não me incomoda tanto (Fiquei triste uma vez, quando queria acessar o Thesixtyone), mas isso é por causa do meu tipo de uso. Imagino que ele pode ser bem importante para outras pessoas.
A ausência de uma câmera frontal para o uso do FaceTime ou de uma traseira, para aumentar enormemente seu potencial artístico parecem aquelas coisas “ah, a Apple deixou isso de fora só pra vender melhor a segunda geração”, e pode ser verdade. A caixa de som dele, MONO, também é bem pior do que gostaria e só não me incomoda porque deixo ele no mudo o tempo inteiro. Quando quero trabalhar com música, coloco os headphones.
Li essa resposta aí em cima 3 vezes e vi que você esqueceu de criticar a falta de multitarefa.
Ela não faz falta. E, como falei sobre as outras coisas, vai estar disponível na atualização do OS, daqui a dois meses.
HEREGE! QUEIMEM-NO!
O que quero dizer é que pela natureza do meu uso do iPad, não faz falta. Não quero janelinhas de mensagem pipocando quando estou lendo um livro, revista ou fazendo uma música. Multitarefa é realmente útil para trabalhar. Quando só se consome conteúdo, o esquema de “salvar sessão” resolve. Quando você volta no iBook, Kindle ou aplicativo de HQs, ele está na mesma página que deixou, mesma coisa em vários jogos ou aplicativos para fazer música. E a inicialização de aplicativos é tão rápida que trocar entre um e outro é algo mais dinâmico que um Alt+Tab em um netbook, por exemplo.
Mas algumas coisas fazem realmente falta, como poder mudar de música dentro de outro aplicativo (só é possível ouvir) ou saber de quem é o e-mail que acabou de chegar. Teremos melhorias com a atualização para iOS 4.2, no fim do ano, mas não faço tanto questão da multitarefa completa em si, mas notificações completas, como no Android, seriam bem vindas. Vamos ver como o iPad vai implementá-las.
Você quase me convence a comprar.
Eu não quero convencer. Não sou pago pra isso. Aliás, aproveitando o ensejo, a Apple não gasta um centavo de publicidade no Brasil, quanto menos em “mídias sociais”, quanto menos no Gizmodo, já que ela sequer chama para coletivas depois do caso do vazamento do iPhone 4. A minha ideia aqui é que as pessoas entendam o bicho.
OK. Quanta mágoa! Mas do que adianta comprar um negócio que vai ficar obsoleto daqui a pouco?
Isso é um argumento bobo, e me espanta por ser usado tão frequentemente contra a Apple. E as pessoas que compraram um Milestone em dezembro e viram o Nexus One ser lançado no mês seguinte? E todos os donos de iPods Classic e iPhones 3GS que estão aí felizes? É claro que a Apple – e todas as empresas – vão querer que você ache que seu iPhone seja obsoleto na próxima geração, para que você continue comprando produtos novos. Mas a vantagem dela em relação as outras é que você sabe que está comprando hoje o que a empresa tem de melhor para oferecer – e será assim pelos próximos 12 meses. Se você comprar um celular da Samsung ou Motorola, Nokia ou qualquer outra empresa, não tem certeza se aquele é o melhor de todos nem dentro da própria empresa, e ele pode estar “obsoleto” (aspas bem grandes. Enquanto um celular fizer ligações, ele não é obsoleto) já na loja, quanto mais em um ano.
Feita essa digressão, acho que o iPad atual vai ter uso por bastante tempo. É claro que o próximo, que pela lógica chegará ao mercado americano em abril, terá câmeras como o iPod e uma tela com melhor definição, e provavelmente será mais leve. Isso faz pouca diferença para o meu uso: os livros, revistas e quadrinhos não precisarão de mais definição, e os jogos que uso não requerem tanto processador, então tudo bem.
Eu quero comprar o iPhone 4. Ele não deixa o iPad obsoleto?
Você curte esse lance de obsoleto, não é?
Sim. Soa bem.
Respondendo à sua pergunta, eu diria que não, mas, de novo, DDSU. Estou com um iPhone 4 há dois dias apenas, não me vejo trocando o que faço no iPad para fazer nele – no máximo uma surfada rápida na internet. Livros, revistas e pdfs longos, sem chance. Mesmo os jogos que tem para as duas plataformas prefiro no iPad: a tela é maior, permite um controle mais fino, sem erros. Acho que eles convivem bem, harmoniosamente. E já há algumas tentativas de integrar os dois, em programas (que utilizam a câmera do iPhone do iPad, por exemplo) a jogos que usam o iPhone como controle, como falei ali em cima, acho que eles se completam. Mas há gente como o Brian Lam, editor-chefe do Giz americano, que usa bem menos o iPad agora que comprou o iPhone 4. Não há uma resposta definitiva. Como quase tudo na vida, sabe, meu filho?
Ok, eu quero comprar um. Qual versão devo pedir pro meu amigo que vai à Disney? De 16 GB, 32 GB ou 64 GB?
DDSU. Diria que 64 GB é mais “seguro”, já que você nunca vai saber quanto de espaço um aplicativo animal vai consumir. Alguns bons são bem pesados: cada edição da Wired tem pelo menos 400 MB e há alguns jogos que passam fácil dos 100 MB. Se você quiser incluir muitas músicas e fotos, então vai usar esse espaço em poucos meses.
Mas eu comprei o de 64 GB e estou longe de chegar à metade da capacidade. Isso porque ainda prefiro o Zune HD para as músicas e deixo a maioria das fotos no Flickr ou Picasa, e uso programas que puxam as imagens da “nuvem”. De todo modo, sempre que você conecta o iPad no computador ele faz backup dos programas, você instala e desinstala quando quiser, uma vez que comprou. E 16 GB para o uso normal de livros, navegação, quadrinhos e jogos é bem suficiente.
Ok, tamanho tanto faz. Mas sem 3G ele é meio inútil, não é?
Na verdade, a partir do momento que você entende o iPad como um bicho bem diferente de um net/notebook, o 3G vira quase desnecessário. Mas, novamente, isso DDSU. Se você der conta de usá-lo como negócio pro trabalho, substituindo o computador, o 3G passa a ser algo muito bom. Se você o usa como eu, apenas para consumir conteúdo que pode ser pré-carregado (jogos, livros, quadrinhos, revistas), o Wi-Fi é bem suficiente. Para twittagens e respostas de e-mails, qualquer smartphone é bem mais eficiente, com notificações, multitarefa e digitação mais rápida.
Há a questão econômica também: para usar o iPad 3G você precisa ter um chip e pagar um plano extra de dados (ou o pré-pago da TIM, que é meio lento). Se você tiver um bom smartphone você pode usá-lo como hotspot Wi-Fi e suprir essa carência. E, no Brasil (aka MercadoLivre), a versão Wi-Fi sai bem mais em conta, mesmo que nos EUA a diferença seja pequena. Seja qual versão você escolher, não deve ficar muito decepcionado, se souber o que esperar.
Resumindo então o iPad é um iPod Touch gigante mesmo?
*Suspira.* É. Mas tem tudo isso que eu falei aí em cima.
Ok. Acho que entendi.
Ok.
Ah, e se alguém não for ler toda a conversa. Como você resumiria?
É mágico, não tem concorrentes, não foi feito para trabalhar, não espere que ele substituía o notebook, tenha em mente que saber inglês é fundamental para aproveitá-lo ao máximo, e ele não precisa 3G. E, mais importante: ele não é necessariamente sensacional ou inútil. Depende do que você espera – ou o quanto está aberto para o inesperado. Para mim, depois desses meses, tenho certeza que ele é o início de uma revolução na forma de se relacionar com o computador e consumir conteúdo. É bacana participar dessa primeira onda, especialmente quando ela estimula meu cérebro de maneira tão sensacional (livros! HQs! Revistas! Fazer música! Arte!). Mas, como falei quando ele foi anunciado, ele pode fazer pouco sentido no Brasil, já que é relativamente caro e vai ser o segundo ou terceiro computador. Eu falei que ele é mágico?
* Este review é dedicado à memória do meu amigo Doug Kawazu. Como ele foi um dos primeiros caras a comprar iPad no Brasil, trocamos e-mails para tentar combinar dele me ensinar alguns truques, mostrar os melhores programas. Estava marcado pra uma quinta-feira. Dias antes, voltando de uma viagem, ele morreu em um acidente de moto. Jovem, gente finíssima, webdesigner de talento, o Doug foi enterrado com um adesivo da maçã colado no caixão. Seu primeiro emprego foi como representante da Apple e começava a ganhar bastante dinheiro quando abriu uma empresa para desenvolver aplicativos para iPhone. Apesar do adesivo, ele estava longe de ser um fanboy. Mas acreditava nas ferramentas que a empresa de Steve Jobs desenvolveu para realizar seu potencial artístico. Eu queria muito que ele pudesse ler isso.